TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021

384 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL transitório contida no n.º 3 do artigo 13.º da Lei n.º 42/2017, de 14 de junho, não foi aplicada a uma situação em que o direito do senhorio já se encontrasse plenamente consolidado na sua esfera jurídica; no caso dos autos, quer a comunicação de oposição à renovação, quer o previsível termo do contrato de arrendamento em causa, são posteriores à publicação e entrada em vigor do regime estabelecido na Lei n.º 42/2017, de 14 de junho; a tal conclusão não obsta o facto de o critério normativo impugnado admitir como digna de proteção a situação em que o reconhecimento formal como estabelecimento de interesse histórico e cultural ou social local vem a ocorrer em momento posterior ao do previsto termo do arrendamento; não consubstanciando a norma sindicada uma ingerência «retroativa» num direito consolidado do recorrente, não se mostra a mesma expressamente proibida pelo artigo 18.º, n.º 3, da Constituição, não se vislumbrando a ocorrência de violação do direito de propriedade plas- mado no artigo 62.º, n.º 1, da Constituição, por via de uma restrição ilegítima e não consentida pelo seu artigo 18.º, n. os 2 e 3. XI – Quanto à alegada violação pelo critério normativo aplicado ao caso dos autos dos princípios da segu- rança jurídica e da proteção da confiança na previsibilidade do direito, cumpre primeiramente aferir se a afetação de expectativas, em sentido desfavorável, constitui uma mutação da ordem jurídica com que, razoavelmente, os destinatários das normas dela constantes não possam contar, procurando o primeiro dos três «testes» do controlo judicial da tutela da confiança dos particulares aferir se a atuação do Estado, sobretudo do Estado-legislador, encetou comportamentos capazes de gerar nos privados «expectativas» de continuidade. XII – É certo que a expetativa do senhorio de ver cessado o arrendamento na data do seu termo, por via do exercício da faculdade de se opor à respetiva renovação, deriva da reforma legislativa do regime do arrendamento urbano operada pelas significativas alterações que a Lei n.º 31/2012, de 14 de agos- to, veio trazer nesta matéria; não é menos certo que, com exceção das alterações introduzidas pela Lei n.º 79/2014, de 19 de dezembro, as várias alterações ao NRAU e ao Código Civil em matéria de arrendamento urbano, só ocorreram em momento posterior ao da publicação da Lei n.º 42/2017, de 14 de junho; todavia, as condições «legislativas» que puderam propiciar uma situação de con- fiança do senhorio na possibilidade de ver cessar o arrendamento no seu termo, por via do exercício da faculdade de oposição à renovação do contrato de arrendamento celebrado – as quais não foram substancialmente modificadas até à entrada em vigor da Lei n.º 42/2017, de 14 de junho – , não podem deixar de ser aferidas no quadro mais vasto da proteção do comércio tradicional e histórico; o mesmo encontrou expressão primeiramente ao nível municipal, por via da criação dos programas de reconhecimento e proteção dos estabelecimentos e entidades com valor histórico, cultural ou social de âmbito local (designadamente, «Lojas com História» e «Porto de Tradição») e na neces- sidade, então sentida, de essa tutela compreender medidas destinadas a proteger os arrendatários no âmbito da relação de arrendamento urbano, sobretudo obstando-se ou diferindo-se a previsível ou imediata cessação dos contratos de arrendamento vigentes por via da aplicação do regime de transição para o NRAU – como ficou ilustrado com a moção aprovada pela Câmara Municipal de Lisboa interpelando a Assembleia da República a emitir a normação necessária no domínio do arrendamento urbano. XIII – A imediata aplicação do regime transitório contido no artigo 13.º da Lei n.º 42/2017, de 14 de junho, em especial o contido na impugnada norma correspondente ao seu n.º 3, às relações de arrendamento vigentes à data da entrada em vigor do novo regime não representa uma novidade em relação às alte- rações introduzidas pelo legislador no domínio das relações duradouras do arrendamento, de modo

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