TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021
370 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL da Relação que, inovatoriamente face à absolvição ocorrida em 1.ª instância, condene o arguido em pena de prisão, suspensa na sua execução» Na sequência do despacho do relator originário que determinou o prosseguimento do recurso para alegações, referido supra , importa começar por delimitar o objeto do recurso, para melhor ajustamento à dimensão normativa efetivamente aplicada na decisão recorrido, atendendo aos contornos do recurso não admitido pelo tribunal a quo. Na verdade, na formulação avançada pelo recorrente, o segmento «inovatoriamente face à absolvição ocor- rida em 1.ª instância» tanto compreende os casos em que a 1.ª instância profere decisão absolutória relativa- mente a todos os ilícitos compreendidos no objeto do processo, como os casos em que, perante uma pluralidade de imputações, o julgamento proferido comporta uma parte absolutória e outra condenatória. Foi o que suce- deu no presente processo, pois o arguido, aqui recorrente, foi absolvido de três crimes, entre os quais um crime de violência doméstica, e condenado por outros dois, sendo-lhe impostas penas parcelares e unitárias. Por seu turno, sendo certo que, perspetivando apenas a apreciação parcelar do imputado crime de violência doméstica, o tribunal da relação revogou a absolvição proferida nessa parte pela 1.ª instância, substituindo-a por decisão condenatória, com a fixação da pena parcelar de dois anos e três meses de prisão, sucede que essa sanção, por força do novo concurso de penas, foi absorvida na pena unitária determinada pelo tribunal da relação, perdendo autonomia. Daí que o segmento «condene o arguido em pena de prisão, suspensa na sua execução» também deva ser precisado, denotando que se está perante pena unitária. Temos, então, que o objeto material do recurso corresponde à norma do artigo 400.º, n.º 1, alínea e) , do Código de Processo Penal, no sentido em que é irrecorrível o acórdão proferido em recurso pela relação que, revertendo decisão absolutória (parcial) proferida pela 1.ª instância, condene o arguido em pena (unitária) de suspensão de execução da prisão. Transcreve-se o referido dispositivo, para fins de clareza processual: “Artigo 400.º Decisões que não admitem recurso 1 – Não é admissível recurso: […] e) De acórdãos proferidos, em recurso, pelas relações que apliquem pena não privativa de liberdade ou pena de prisão não superior a 5 anos.” Do mérito do recurso 8. Podemos condensar o extenso argumentário em que o arguido suporta a sua pretensão nos seguintes quatro vetores: (i) a garantia constitucional do direito ao recurso tem autonomia, não se esgotando na exis- tência de um duplo grau de jurisdição, apenas sendo a irrecorribilidade de algumas decisões se o conteúdo essencial das garantias de defesa do arguido não for atingido e desde que tal limitação se justifique por outros valores relevantes (conclusões 1 a 16); (ii) a reversão, em sede de recurso, de uma absolvição em condenação, convoca um elevado nível de exigências garantísticas da posição processual do arguido, não se bastando com o direito de contra-alegar (conclusões 16 a 21); (iii) quer o processo decisório conducente à condenação, como a decisão que define o cúmulo jurídico, não foram objeto de decisão em 1.ª instância, constituindo uma parte da decisão integralmente nova (conclusões 22 a 41); (iv) é, por isso, aplicável ao caso em presença a doutrina do Acórdão do Plenário n.º 429/16 (conclusões 42 a 47); (v) não seria compreensível que um arguido condenado em prisão preventiva inferior a cinco anos, inovatoriamente pela Relação, pudesse recor- rer para o Supremo Tribunal de Justiça, e um outro arguido, condenado, pelo mesmo crime, em pena de prisão suspensa, mas cuja suspensão fosse entretanto revogada por não ter conseguido cumprir as condições da suspensão, não pudesse recorrer para aquele Supremo Tribunal (conclusões 48 e 49).
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=