TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021

354 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL O artigo 135.º Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março, sob a epígrafe «Norma interpretativa», estabeleceu que «[a] redação dada pela presente lei ao n.º 6 do artigo 51.º, ao n.º 15 do artigo 83.º, ao n.º 1 do artigo 84.º, aos n. os 20 e 21 do artigo 88.º e ao n.º 8 do artigo 117.º do Código do IRC tem natureza interpretativa». 6. A decisão recorrida recusou a aplicação do referido artigo 135.º Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março, na parte em que atribui natureza interpretativa à redação dada pela mesma Lei ao n.º 6 do artigo 51.º do Código do IRC, com fundamento na sua inconstitucionalidade, por violação do princípio da não retroatividade da lei fiscal consagrado no artigo 103.º, n.º 3, da Constituição. Nessa decisão, alude-se, além do mais, à jurisprudência deste Tribunal (e desta Secção) sobre leis interpretativas em matéria fiscal constante do Acórdão n.º 267/17 (disponível, assim como os demais adiante citados, a partir da ligação http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/) . A mesma jurisprudência foi posteriormente reiterada nos Acórdãos n. os 644/17 e 92/18, igualmente desta 2.ª Secção. Mais recentemente, no Acórdão n.º 751/20, do Plenário, o Tribunal Constitucional, a propósito da generalização do juízo positivo de inconstitucionalidade objeto dos dois últimos arestos, voltou a reafirmar a sua jurisprudência neste domínio, fundamentando-a nos seguintes termos: «10. A especificidade da lei interpretativa prende-se com a intenção e a força vinculante do próprio ato nor- mativo: por contraposição à lei inovadora, aquela visa ou declara pretender fixar apenas o sentido correto de um ato normativo anterior. A mesma não pretende criar direito novo, antes tem como objetivo esclarecer o sentido “correto” do direito preexistente. «O órgão competente que cria uma lei (p. ex. a Assembleia da República) tem também a competência para a interpretar, modificar, suspender ou revogar» (cfr. Baptista Machado,  Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, Coimbra, 1983, p. 176). Está em causa, afinal, uma manifestação da mesma competência legislativa que é fonte em sentido orgânico do ato interpretando (cfr.  idem ,  ibidem ). E, por ser de valor igual a este último, a lei interpretativa determina-lhe o sentido para todos os efeitos, independentemente da correção hermenêutica de tal interpretação. Por isso, a interpretação da lei fixada pelo próprio legislador – a chamada “interpretação autêntica” – «vale com a força inerente à nova manifestação de vontade» do respetivo autor (cfr. Autor cit.,  ibidem , p. 177). Daí a aludida consequência de a lei interpretativa se integrar na lei interpretada (cfr. o artigo 13.º, n.º 1, do Código Civil). Por isso mesmo, como se referiu no Acórdão n.º 267/17, pode, de acordo com certa conceção, falar-se de uma retroatividade meramente formal inerente a toda a lei – tida por “verdadeiramente” ou “genuinamente” – interpretativa: há retroatividade, porque tal lei se aplica a factos e situações anteriores, e a mesma retroatividade é “formal”, visto que a lei, «vindo consagrar e fixar uma das interpretações possíveis da [lei anterior – cujo sentido e alcance não se podiam ter como certos –] com que os interessados podiam e deviam contar, não é suscetível de violar expectativas seguras e legitimamente fundadas» (cfr. Baptista Machado,  Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, Coimbra, 1983, p. 246). Com efeito, «a retroação [das leis interpretativas] justifica-se, além do mais, por não envolver uma violação de quaisquer expectativas seguras e legítimas dos interessados. Estes podiam contar com a solução da [lei nova] interpretativa, visto ela corresponder a um dos vários sentidos atribuídos já pela doutrina e pela jurisprudência à [lei antiga]»: assim, é «de sua natureza interpretativa a lei que, sobre um ponto em que a regra de direito é incerta ou controvertida, vem consagrar uma solução que a jurisprudência, por si só, poderia ter adotado» (cfr. Baptista Machado,  Sobre a Aplicação no Tempo do novo Código Civil, Almedina, Coimbra, 1968, pp. 286-287).  Diferentemente, se a lei nova se pretende aplicar a factos e situações jurídicas anteriormente disciplinados por um direito certo, então este último é modificado, violando-se expectativas quanto à sua continuidade, e tal lei, na medida em que inove relativamente ao direito anterior – qualificando-se já não como lei interpretativa, mas sim como lei inovadora –, será substancial ou materialmente retroativa (cfr. Baptista Machado,  Introdução ao Direito…, cit. , p. 247).

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