TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021
349 acórdão n.º 101/21 disposto no artigo 51.º do CIRC, e por desconformidade constitucional, em concreto com o disposto no artigo 103.º, n.º 3 da CRP, onde é consagrado o designado princípio da não-retroatividade da lei fiscal. B) Recorre o Ministério Público contra o facto do Tribunal Arbitral ter recusado a aplicação da norma do artigo 135.º da Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março, que atribuiu natureza interpretativa à nova redação do n.º 6 do artigo 51.º do CIRC. C) Assim, a questão material controvertida no presente recurso prende-se exclusivamente em determinar se o cará- ter interpretativo atribuído ao atual artigo 51.º, n.º 6 do CIRC, por parte do artigo 135.º da Lei n.º 7.º-A/2016, de 30 de março, comportou efeitos meramente interpretativos – caso em que estaria em causa uma mera lei interpretativa – ou se, ao invés, estão em causa efeitos verdadeiramente inovadores, dado que versam sobre matéria de Direito já consolidada e inequívoca n doutrina e jurisprudência e sem qualquer conexão jurídica rele- vante ou possível face à nova solução consagrada – caso em que, por seu turno, estaria em causa uma verdadeira lei inovadora, como é entendimento da recorrida e do próprio Tribunal Arbitral, que nesse mesmo sentido se pronunciou. D) Sustenta o recorrente, embora não o afirme de forma direta no seu recurso que seria importante “apurar se no caso ocorreu, ou não, como propugna a fundamentação da decisão da AT, uma dupla tributação económica.” E) Ora, tal como a recorrida já havia mencionado, na respetiva petição inicial, os seguros unit-linked implicaram desde sempre e ao abrigo do Plano de Contas para as Empresas de Seguros (aprovado pela Norma Regula- mentar n.º 7/94, de 27 de abril – “PCES 94”) a constituição de provisões técnicas, por forma a acautelar os pagamentos futuros a efetuar aos respetivos subscritores, sendo que a obrigatoriedade de constituição e manutenção de provisões técnicas resulta clara do diploma que regula as condições de acesso e de exercício da atividade seguradora (atual Decreto-Lei n.º 8-A/2002, de 11 de janeiro). F) De tal modo, o facto de estas provisões corresponderem ao valor dos rendimentos gerados pela carteira de títulos detida pela recorrida (dividendos recebidos, entenda-se) advém da circunstância de a valorização des- ses títulos se refletir na valorização das unidades de conta em conformidade com a estruturação do produto oferecido pela mesma recorrida. G) De resto, se não estivessem em causa rendimentos da recorrida não poderiam os mesmos ser registados (corno foram) em contas próprias de proveitos, mas sim em contas de ativos segregadas e devidamente identificadas com os nomes dos diversos titulares das unidades de participação nos seguros unit-linked , funcionando, aí sim nesse cenário, a recorrida como uma mera intermediária, gestora de carteiras, o que, contudo, não cor- responde ao enquadramento legal e contabilístico aplicável. H) Neste sentido, é por demais evidente que os lucros distribuídos por uma entidade que detém ativos financei- ros à entidade titular da respetiva carteira dos títulos são incluídos na base tributável desta última, sendo assim plenamente aplicável a disciplina do artigo 51.º do CIRC. I) Ora, o dictum que preside à questão material controvertida é precisamente determinar se, como é entendi- mento da recorrida e do próprio Tribunal Arbitral, rendimentos associados a investimentos relativos a seguros em que o risco é suportado pelo tomador do seguro (seguros unit-linked ) poderão beneficiar, sem qualquer reserva, do regime de eliminação da dupla tributação económica previsto no artigo 51.º do CIRC, na redação em vigor à data dos factos ou se a tal obsta a existência de uma hipotética lei interpretativa, introduzida pelo artigo 135.º da Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março (“Lei Nova”) e respetiva projeção na interpretação do artigo 51.º, n.º 6, do CIRC a aplicar à data dos factos tributários. J) De acordo com a posição da recorrida, o mecanismo previsto no artigo 51.º do CIRC era inequivocamente aplicável aos rendimentos associados a investimentos relativos a seguros unit-linked , uma vez que as alterações entretanto introduzidas pelo artigo 135.º da Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março não têm caráter meramente interpretativo, mas sim uma dimensão totalmente inovadora, necessariamente incompatível com o princípio da não-retroatividade da lei fiscal, plasmado no artigo 103.º, n.º 3, da CRP. K) De facto, o que é salientado pela generalidade da doutrina fiscal aponta para a necessidade de distinguir entre as verdadeiras leis interpretativas – que, como tal, se integram na lei interpretada – das “falsas” leis interpre-
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