TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021

348 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL E. Ademais, o tratamento contabilístico dado aos contratos unit-linked reflete melhor, agora, a sua natureza de investimento ou produto financeiro, ao contrário do que acontece com os tradicionais contratos de seguro. F. Deste modo, os ativos subjacentes e os rendimentos associados não podem considerar-se como “rendimentos de participações sociais em que tenham sido aplicadas as reservas técnicas das sociedades de seguros”, nos termos previstos no n.º 2 do art. 51.º do CIRC. G. Razão pela qual, atendendo à disposição pertinente da lei fiscal (art. 51.º/2 do CIRC), bem como à regula- mentação contabilística aplicável não se pode afirmar que a expressão legal – reservas técnicas – tem âmbito mais vasto que o conceito que a AT se sustenta. H. A entender-se assim conduziria a que a AT discricionariamente construísse, para efeitos de aplicação do n.º 2 do art. 51.º do CIRC, um conceito próprio de “reservas técnicas”, diferente do constante da regulamentação contabilística aplicável, sem para isso ter qualquer fundamento legal. I. Ademais, no que respeita à concessão aos contratos unit-linked de um tratamento dado aos contratos de investimentos comercializados por sociedades de investimento, é inegável que não subsiste qualquer motivo que justifique algum tipo de diferenciação no plano fiscal, tanto mais que o n.º 2 do art. 51.º do CIRC não dispensa o preenchimento da exigência de que os rendimentos provenientes de participações sociais estejam incluídos na base tributável, pelo que também deve ser satisfeita pelas sociedades de investimento. J. Posto isto, fácil se torna perceber que o entendimento preconizado pela AT, aqui recorrente, e que serviu de sustentação às correções levadas a cabo no procedimento inspetivo, decorre naturalmente da interpretação da norma, lida no seu conjunto e em articulação com outras relativas à mesma matéria. K. O que, por si só, justifica a posterior consideração de que aquele era o entendimento pretendido pelo legisla- dor, tendo acabado por lhe conferir natureza interpretativa. L. Assim, a norma introduzida pela Lei do Orçamento de Estado para 2016, veio apenas clarificar o alcance da norma em causa, perante divergências interpretativas existentes, como, de resto, foi entendido pelo Supremo Tribunal Administrativo relativamente a outras normas ínsitas na mesma Lei, sobre as quais se colocava a mesma questão. M. A norma interpretativa visa, pois, pôr fim à controvérsia que se instalou sobre o sentido que se devia dar a determinada lei, fixando ela própria o sentido que esta deve ter, a qual será vinculante. N. Em suma, trata-se, assim, de uma interpretação autêntica que se destina a conferir uma maior certeza e igual- dade na aplicação da lei. O. Pois, no caso em apreço, se bem analisarmos o predito diploma legal, este mais não faz do que aclarar o sen- tido pré-existente, num raciocínio interpretativo, de integração sistemática e de coerência com o espírito da matéria em apreço, donde, a norma ora posta em causa, e sobretudo o efeito que lhe foi atribuído, se traduz numa mera evidência clarificadora do sentido possível da lei. P. De facto, como decorre do itinerário cognoscitivo da ora recorrente no procedimento inspetivo, explicitado nos autos arbitrais, é notório que o raciocínio evidenciado é pré existente à aprovação da norma interpretati- va, o que refuta integralmente os argumentos quanto à alegada natureza retroativa da norma em causa. Q. Em suma, a lei do Orçamento de Estado para 2016, em concreto os seus arts 133.º e 135.º, veio apenas clari- ficar aquele que sempre foi o espírito da norma a propósito do âmbito de aplicação do artigo 51.º do CIRC, em conformidade com o entendimento seguido pela AT, revelando-se assim como solução não-inovatória, a que o julgador ou o intérprete podem chegar sem ultrapassar os limites normalmente impostos à interpreta- ção e aplicação da lei. R. Em consonância, de resto, com a doutrina e a jurisprudência». 3. A recorrida A., S.A., apesentou contra-alegações, que concluiu da seguinte forma: « A) O presente Recurso vem interposto da Douta Decisão proferida pelo Tribunal Arbitral que decidiu julgar procedente o pedido de constituição de tribunal arbitral apresentado pela ora recorrida e anular o ato de liquidação de IRC do exercício de 2013 ora sindicado, por vício de ilegalidade, neste caso por violação do

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