TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021

337 acórdão n.º 100/21 a plenitude, mas, noutros, acarretaria uma proteção menos intensa. O standard de funcionamento do Estado, em todas as suas instâncias, deve ser de um nível de proteção elevado, de forma a efetivar as garantias que o sistema constitucional determina”. 10. Ou seja, nos termos desta nova orientação jurisprudencial, a lógica do direito constitucional ao recurso consagrado no artigo 32.º, n.º 1, da CRP – autonomizado da garantia de duplo grau de jurisdição – não depende do tipo de pena aplicada. Por conseguinte, impõe-se que todas as decisões condenatórias ex novo – que incluem, naturalmente, a determinação da pena e/ou da respetiva medida concreta, no todo ou em parte – sejam passíveis de reapreciação por um tribunal superior àquele que se pronunciou sobre as dimensões essenciais e inovatórias da decisão condenatória. Não releva, portanto, nesta sede, o facto de se tratar de pena privativa de liberdade (efetiva ou suspensa) ou de pena não privativa de liberdade (de multa, admoestação ou outra). A existência de uma condenação nova que sobrevenha, nestes termos, de uma rea- preciação judicial convoca o direito fundamental ao recurso, já que o arguido não poderia, de forma alguma, ter-se defendido em momento anterior à sua cominação. Neste aspeto, afirma-se no Acórdão n.º 31/20: "(...) apenas um recurso contra a condenação proporciona a (re)apreciação – por um tribunal superior – da ope- ração subsuntiva efetuada pelo tribunal a quo, de forma a que o arguido possa mobilizar a tutela jurisdicional para questionar os termos em que se decidiu a sua condenação penal. A compressão do direito fundamental ao recurso, definida pela dimensão normativa do artigo 400.º do CPP aqui em análise, consubstancia, nessas hipóteses, uma verdadeira supressão do direito, ilustrativa, aliás, de como o duplo grau de jurisdição, de facto, não assegura per se as garantias dos direitos de defesa previstos no artigo 32.º, n.º. 1, CRP”. Em síntese, "(...) mantida intacta a unicidade da causa penal, apenas os elementos que conduzam ao juízo de culpabilidade (reformador da decisão absolutória prévia) e consequente fixação da sanção, em harmonia com os artigos 368.º e 369.º do CPP, ao serem questionados pelo arguido recém-condenado, deverão ser objeto de reapreciação. Essa (primeira) reapreciação, que garante o respeito pelas garantias jurídico-constitucionalmente tuteladas de defesa do arguido, é assegurada, na prática, pelo direito  ao recurso ” (destacado no original). 11. No caso dos autos, como antes relatado, temos que o arguido foi absolvido em primeira instância e, a posteriori , o Tribunal Relação do Porto, intervindo em sede de recurso, condenou-o em pena de prisão (suspensa na sua execução), sob condição do pagamento de indemnização civil, no valor de € 451, na qual foi igualmente condenado. Ao recorrer desta condenação ex novo , o recorrente esbarrou na inadmissibilidade legal da sua pretensão, em virtude do estatuído na alínea e) do n.º 1 do artigo 400.º do Código de Processo Penal. Ora, do ponto de vista abstrato-normativo, estamos, como acima se afirmou, perante situação seme- lhante à que deu origem ao Acórdão n.º 31/20, ou seja, a revogação de uma decisão absolutória, que é substi- tuída por uma condenação inovatória (em concreto na espécie e na medida concreta da pena), relativamente à qual o recorrente não pode defender-se. Entende-se, por isso, ser de reiterar o juízo alcançado naquele aresto, afirmando, uma vez mais, o argumento que constitui o seu principal pilar argumentativo: o de que o direito fundamental ao recurso é, em circunstâncias como as descritas, condição indispensável para um exercício efetivo das garantias de defesa em processo penal constitucionalmente consagradas. Assim, adianta-se, desde já, que se entende ser, também aqui, de reconhecer que ao recorrente/arguido, que foi condenado, pela primeira vez pelo TRP, e não pôde ver reexaminada tal condenação, inédita, foi suprimido o direito ao recurso, consagrado no artigo 32.º, n.º 1, da CRP, com sacrifício dos direitos, liberda- des e garantias de que é titular, em especial o catálogo de meios de defesa. Essa restrição total, com prejuízo

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