TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021

290 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL públicos e privados, contrapostos, tal ónus resulta antes de uma avaliação ainda ao alcance do legislador ordinário, para a qual não se pode dizer que falhe base de sustentação suficiente e razoável. Reconhece-se, é certo, que «pode não ser do interesse do requerente ou titular da AIM ver declarada a nulidade da patente, mas tão-só defender-se da condenação que é pedida contra si na ação de arbitragem necessária». Tal como se reconhece que a observância do ónus imposto, na medida em que conduzirá (ou poderá conduzir) à anulação com efeito erga omnes da patente, pode apresentar-se contrária aos interesses daquele, «na parte em que beneficia terceiros igualmente concorrentes do titular da patente». Simplesmente, salvaguardada que se mostre a possibilidade de obtenção de uma pronúncia sobre a invalidade da patente antes de ser proferida a decisão final no âmbito do litígio arbitral, não se vê como o sacrifício de qualquer interesse, por legítimo que seja, na implementação da estratégia processual e comercial que melhor sirva os interesses do requerente de AIM possa fundamentar, por si só, a conclusão de que a norma que constitui o objeto do presente recurso restringe os direitos de defesa e ao contraditório em medida injustificada. 16. É certo que, se se levar em conta que a imposição de um procedimento de arbitragem necessária visou assegurar uma maior celeridade na composição dos litígios relacionados com a introdução de medica- mentos genéricos no mercado, a racionalidade da opção seguida pelo legislador de 2011 pode tornar-se em certa medida contestável. Simplesmente, a merecer por isso algum tipo de censura à luz da Constituição, será apenas na medida em que puder afirmar-se que o ónus de discutir a validade da patente perante o TPI, a título prejudicial, restringe desproporcionadamente o direito de acesso a uma tutela jurisdicional efetiva, não já na sua dimensão de proibição da indefesa, mas na sua dimensão de direito a uma decisão em prazo razoável (cfr. o n.º 4 do artigo 20.º da Constituição). É seguro que a impossibilidade de invocar a invalidade da patente no âmbito da ação arbitral, como meio de defesa por exceção, impõe ao requerente de AIM o ónus de propor a ação pertinente diante do TPI antes da instauração do processo arbitral ou na pendência deste, o que comportará certamente uma signi- ficativa dilação na resolução do litígio principal, retardando consequentemente a própria introdução dos medicamentos genéricos no mercado. Porém, tendo em consideração que esse foi o meio processual que o legislador teve por mais adequado, em face da diversidade de interesses em jugo, para assegurar aos reque- rentes de AIM a possibilidade de invocação da invalidade de patentes em tribunal, não se vislumbra que a situação em apreço se distinga substancialmente de outros regimes processuais em que a decisão de questões prejudiciais é cometida a tribunais com competência exclusiva em razão da matéria. Recorde-se a este respeito que a atribuição de competência ratione materiae a determinados órgãos juris- dicionais resulta sempre, em princípio, de uma ponderação que ao legislador cabe assumir quanto à especia- lização dos diversos tribunais, ponderação essa que poderá ser tanto mais oportuna quanto mais complexas se apresentarem as matérias a regular ou mais relevante se mostrar a necessidade de salvaguarda de uma certa consistência jurisprudencial, em função dos interesses em presença. É por isso que opção pela atribuição de competência exclusiva a um tribunal para se pronunciar a título prévio sobre uma determinada questão ou matéria não pode ter-se, por si só, como automaticamente incompatível com o direito ao contraditório ou com a proibição da indefesa – precisamente porque, em regra e no limite, é a suspensão da instância principal pelo período correspondente à decisão das questões prejudiciais que permitirá articular e conciliar as dife- rentes preocupações e exigências que convergem na conformação do respetivo regime jurídico-processual. Por outro lado, importa salientar que a atribuição de competência exclusiva a órgãos jurisdicionais especializados beneficia e prejudica, por norma e em igual medida, todas as partes no processo. Mesmo quando implica a suspensão da instância para a resolução de questões prejudiciais, o que possa perder-se em celeridade tende a ganhar-se em consistência, segurança e justiça material, já que o direito à decisão da causa principal depende, nestes casos, da prévia resolução pelas instâncias competentes de todas as questões prejudiciais relevantes. Ora, tal como este Tribunal tem reiteradamente sublinhado, embora a celeridade processual seja um valor que a Constituição tutela, não é um valor absoluto, por muito relevante que seja para o tipo de

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