TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021
274 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Mas foi-se muito além da diminuição da extensão e do alcance do conteúdo essencial do direito de propriedade industrial emergente de uma patente e de um certificado complementar de proteção – muito mesmo – no juízo de inconstitucionalidade proferido no Acórdão n.º 251/17. Admitiu-se a extinção, irreversível, da exclusividade intrínseca a esse direito. Esta consequência traduz-se no próprio aniquilamento do direito de patente na dimensão que lhe é mais característica, ou seja, na oponibilidade erga omnes do exclusivo que atribui ao seu titular – o seu ius prohibendi . E essa ablação tem efeitos irreversíveis. Na verdade, se a invalidade da patente declarada incidentalmente na ação de infração vier depois a ser afas- tada por decisão final transitada em julgado proferida em ação nos termos do atual artigo 34.º do CPI, o titular da patente nunca poderá ser, por via alguma, compensado por ter sido privado do seu direito fundamental de propriedade industrial, vendo-se assim extorquido, no que toca ao infrator que obteve vencimento da exceção de invalidade, do direito de exclusivo emergente dessa patente e que é o conteúdo essencial do seu direito. Ou seja, mesmo que, em virtude da improcedência, posterior, de uma ação de invalidade proposta nos termos do artigo 34.º do CPC, a invalidade da patente não seja decretada ou reconhecida, pelo meio processual próprio, os efeitos do reconhecimento pela via da exceção da invalidade permanecerão em vigor, impedindo, irremediavel- mente, o exercício do exclusivo por parte do seu titular. É que os efeitos inter partes da decisão que julgou procedente a exceção de invalidade não serão afetados por uma posterior sentença que julgue improcedente a ação de invalidade, a qual não pode converter em condenatória uma sentença que absolveu o infrator da patente com base na declaração prematura e inter partes da invalidade da mesma patente que veio a revelar-se insubsistente. Significa isto que a interpretação do Acórdão n.º 251/17 veio admitir uma solução que legitima a violação do conteúdo essencial de um direito enquadrável na categoria dos direitos, liberdades e garantias, por força do artigo 42.º da CRP ou, pelo menos, de um direito com natureza a eles análoga, por força do artigo 62.º da Constituição, sendo pois materialmente inconstitucional por colidir com o artigo 18.º, n. os 2 e 3 da CRP. (…) Mas numa outra vertente, ainda e por fim, se pode aferir da inconstitucionalidade de uma interpretação dos artigos 35.º, n.º 1 do CPC, tal como sugerida pelo TC naquele aresto. (…) A interpretação oferecida pelo Acórdão n.º 251/17 vem colocar os titulares de direitos de propriedade indus- trial sobre invenções farmacêuticas numa situação diferente daquela em que se situam os titulares de direitos de propriedade industrial relativos a produtos de outros domínios da técnica e da atividade económica. (…) Em suma, uma interpretação dos artigos 35.º, n.º 1 (atual 34.º) do CPI e 2.º da Lei n.º 62/2011 segundo a qual é admissível a declaração de nulidade de uma patente por um tribunal arbitral com efeitos inter partes importa a diminuição da extensão e do alcance do conteúdo essencial do direito fundamental de propriedade industrial das titulares de patentes de forma desproporcional, sendo materialmente inconstitucional por violação dos artigos 42.º, 62.º e 18.º, n.os 2 e 3 da CRP, e representando uma solução, em violação do artigo 13.º da Lei Fundamental. (…) III. Da concreta análise da proporcionalidade stricto sensu a ser levada pelo tribunal (…) 47. Feita a análise do impacto que a declaração de invalidade com efeitos inter partes terá no conteúdo essencial do direito de patente, caberá a este Alto Tribunal aferir, no caso concreto, se o sacrifício imposto ao direito de defesa é evidentemente desproporcionado face ao fim visado, i. e. , a proteção do direito de patente enquanto direito fun- damental protegido nos termos dos arts. 42.º e 62.º da CRP. Por outras palavras, cabe ao presente Tribunal operacionalizar se a medida em que se limitou o direito de defesa do demandado teve uma compensação equivalente no que se ganhou em face ao conteúdo do direito de patente.
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