TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021
264 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL vinculativo, e, por outro lado, que os poderes em que se encontram investidos os membros de um tribunal arbitral especificamente constituído ao abrigo da Lei n.º 62/2011 advêm, diretamente, da própria lei, assim se reforçando o facto de se tratar de um tribunal que, pelo menos num plano formal, se encontra provido de todas as competências que a lei atribui, genericamente, a um tribunal. m. Pretendendo o legislador instituir um sistema célere de decisão, em matéria com impacto no bem essencial da saúde, este não se compadece, com delongas resultantes de uma solução alternativa de suspensão da instância arbitral para decisão das questões de invalidade da patente pelo TPI em ação a intentar pela parte demandada. Tal solução seria absolutamente incoerente com o sistema instituído pela Lei n.º 62/2011 e com a vontade do legislador. n. A interpretação conjunta literal, atual e sistemática das disposições dos artigos 35.º do CPI, 111.º, n.º 1, al. c) da Lei n.º 62/2013 e 2.º da Lei n.º 62/2011 depõem, inequivocamente, no sentido da admissibilidade de invocação, a título de exceção, da invalidade das patentes de medicamentos nas ações arbitrais previstas na Lei n.º 62/2011 e da competência do tribunal arbitral para o seu conhecimento com efeitos inter partes . o. No entanto, o acórdão recorrido conclui que as referidas disposições devem ser interpretadas no sentido de que o demandado nas ações arbitrais instituídas pela Lei n.º 62/2011 não pode defender-se por exceção invocando a invalidade da patente na qual o demandante funda o seu direito porquanto o tribunal arbitral não tem competência para conhecer de tal questão. p. Ora, tal entendimento é, no entender da ora recorrente, claramente inconstitucional por violação do prin- cipio constitucional da proibição da indefesa e absolutamente contrário ao já decidido sobre a mesma questão por este Venerando Tribunal Constitucional no Acórdão n.º 251/17, de 24 de maio de 2017. q. Está em causa o direito de acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva consagrado no artigo 20.º da CRP enquanto «norma-princípio estruturante do Estado de Direito Democrático (artigo 2.º)» a qual constitui, porventura, a maior das garantias de defesa dos demais direitos fundamentais dos cidadãos, compreen- dendo o direito de ação ou de acesso aos tribunais, o direito ao processo perante os tribunais, o direito à decisão da causa pelos tribunais e o direito à execução das decisões dos tribunais – cfr. J.J. Gomes Cano- tilho/Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, Volume I, 4.ª edição revista, Coimbra Editora, Coimbra, 2007, anotação ao artigo 20.º, p.p. 409 e 414). r. Por seu turno, deve este direito de acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva, sobretudo na vertente do direito de ação, ser efetivado mediante um processo equitativo, também efetivado através do principio da “proibição de indefesa”. Este princípio, decorrente do reconhecimento do direito geral ao contraditório inerente ao direito a um processo justo implicado no direito fundamental de acesso à justiça afirma uma proibição da limitação intolerável do direito de defesa perante o tribunal. s. No que concerne à dimensão do principio da proibição da indefesa no âmbito das ações arbitrais instituídas pela Lei n.º 62/2011 e, concretamente, sobre a questão da competência do tribunal arbitral para conhecer da invalidade da patente, pronunciou-se também já expressamente este Tribunal Constitucional no Acór- dão n.º 251/17, de 24 de maio de 2017. t. Naquele acórdão esteTribunal Constitucional considerou que a interpretação do artigo 2.º da Lei n.º 62/2011, de 12 de dezembro e artigos 35.º, n.º 1, e 101.º, n.º 2, do CPI no sentido propugnado no acórdão do STJ ora recorrido teria “como consequência uma lesão efetiva e significativa do direito de defesa” dos demandados em processo arbitral, prejudicando de modo desproporcionado esse direito de defesa. u. Atendendo à dimensão normativa dos direitos envolvidos, não vemos razão para uma alteração deste enten- dimento, pois a solução encontrada na lógica do sistema de direitos fundamentais vigente é a que melhor concilia os direitos constitucionalmente protegidos de ambas as partes. v. Na verdade, ainda que se admita que o direito decorrente da patente é um direito enquadrável na catego- ria dos direitos liberdades e garantias, por força do artigo 42.º da CRP ou, pelo menos, um direito com natureza a eles análoga, por força do artigo 62.º da Constituição, o certo é que o conteúdo essencial de tal direito do titular da patente não é desproporcionalmente restringido pelo facto de se admitir a declaração de nulidade de uma patente por um tribunal arbitral com efeitos inter partes .
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