TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021
234 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL eleitores, não entendemos que a quantidade possa empobrecer a qualidade de escolha dos eleitores como seus representantes nos diversos órgãos autárquicos, mas antes a aumentar a intervenção popular local, em detrimento de interesses pessoais/concretos e de um coletivo restrito, à custa do voto popular local. Nesta conformidade não deverá assacar-se ao corpo normativo fiscalizado uma violação desproporcio- nada e até desnecessária do direito dos grupos de cidadãos eleitores se candidatarem aos órgãos da respetiva autarquia. – Assunção Raimundo. DECLARAÇÃO DE VOTO Votei vencido por entender que a norma extraída do n.º 4 do artigo 239.º em conjugação com o n.º 1 do artigo 48.º da Constituição (CRP) não vincula o legislador a estabelecer que um «grupo de cidadãos eleitores» (GCE) tenha o direito de apresentar candidaturas a todas as eleições que se realizam no quadro do mesmo procedimento eleitoral autárquico. Daquela norma resulta que as candidaturas às eleições dos titulares dos órgãos do poder local apenas podem ser apresentadas por (i) partidos políticos, (ii) coligações de partidos políticos, (iii) e grupos de cidadãos eleitores. Portanto, admite-se candidaturas extrapartidárias, mas as únicas organizações titulares do poder de apresentação de candidaturas autárquicas são os partidos políticos, excluindo-se candidaturas de outras associações ( v. g. organizações de moradores, associações cívicas, ambientais, etc.). A norma constitucional remete para a lei – «nos termos da lei» – a regulação do poder de apresentação de candidaturas. Não obstante a ampla margem de decisão que assim é conferida ao legislador no estabele- cimento das condições de que depende a candidatura apresentada pelos GCE, a Constituição não é omissa quanto ao critério que deve ser adotado na formação dos grupos de cidadãos eleitores. Com efeito, os «elei- tores» a que se refere o n.º 4 do artigo 239.º, que podem formar um grupo proponente de candidatura às eleições dos órgãos das autarquias locais, são os «cidadãos recenseados na área da respetiva autarquia» (n.º 2 do artigo 239.º da CRP). Ou seja, o critério do recenseamento que a Constituição adota para a determinação do colégio eleitoral, que define o que são «eleitores» (artigo 4.º da LEOAL), não pode deixar de ser utilizado na constituição do GCE. Assim, o GCE apenas pode ser composto pelos habitantes/residentes inscritos no recenseamento eleitoral da área da autarquia local a cujos órgãos apresentam a candidatura. De modo que o critério do recenseamento vincula o legislador a estabelecer que os cidadãos proponentes que formam o agrupamento estejam todos recenseados na área da autarquia a cujo órgão respeita a candidatura (n.º 6 do artigo 19.º da LEOAL). A opção constitucional de considerar que o «grupo de cidadãos eleitores» é formado pelos cidadãos inscritos no recenseamento da área da autarquia a cujos órgãos apresentam candidatura tem justificação nos interesses a que tende a eleição dos respetivos titulares. Consagra-se no n.º 2 do artigo 235.º da CRP que as autarquias «visam a prossecução de interesses próprios das populações respetivas», isto é, interesses próprios e específicos de uma comunidade local, que se diferenciam dos interesses comum da coletividade nacional e dos interesses próprios das demais comunidades locais. Como o princípio democrático exige que os órgãos das autarquias locais emanem das próprias comunidades locais, a candidatura cidadã não pode deixar de refletir os interesses comuns dos residentes nessas comunidades. Por isso, a exigência de que os cidadãos eleitores residam no território da autarquia a que apresentam candidatura constitui corolário da democracia representativa, na medida em que se trata de eleição de órgãos representativos, através de sufrágio universal e direto, em que apenas participam os cidadãos da coletividade que por eles é representada, bem como permite maior participação política dos cidadãos na vida da comunidade em que se integram (artigo 48.º da CRP), ou seja, participação na prossecução dos interesses próprios e específicos, que muitas vezes se traduzem em relações de vizinhança. Por força do caráter vinculativo do local de inscrição no recenseamento eleitoral, nenhum cidadão elei- tor pode propor candidaturas em municípios e freguesias diferentes. Em princípio, um GCE é autónomo
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