TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021

231 acórdão n.º 247/21 O direito a apresentar candidaturas por grupos de cidadãos eleitores, tem em vista o envolvimento dos cidadãos nos órgãos das autarquias locais que dizem respeito a esses cidadãos, implicando-os na governação das autarquias em cuja área estão recenseados. A promoção da participação política liga-se à promoção da autodeterminação das populações para tutela dos seus interesses próprios – a que se refere o artigo 235.º, n.º 2, da Constituição – permitindo as normas fiscalizadas, que um grupo de cidadãos eleitores possa can- didatar-se a todos os órgãos das autarquias, em cuja área os proponentes estão recenseados (assembleia de freguesia, câmara municipal e assembleia municipal). A circunstância de estar impedida a candidatura aos órgãos das demais freguesias do mesmo concelho não contende com o direito de participação dos cidadãos: a admitir-se o contrário, seria igualmente uma restrição ao direito de participação dos cidadãos na vida política a impossibilidade de o mesmo grupo de cidadãos eleitores se candidatar a órgãos autárquicos de vários concelhos do país. Como se retira do n.º 4 do artigo 16.º da Lei Eleitoral dos Órgãos das Autarquias Locais (LEOAL), o direito de participação política exercido na candidatura de grupos de cidadãos eleitores convive – e não exclui – com o direito de participação política através de candidaturas partidárias, pois nos termos da referida norma, as candidaturas partidárias, podem incluir candidatos independentes sem qualquer filiação parti- dária, não esquecendo que, a fundamentação da participação política, ao nível da eleição democrática dos órgãos do poder local, dirige-se ao cumprimento da missão constitucionalmente atribuída às autarquias: a «prossecução de interesses próprios das populações respetivas» – n.º 2 do artigo 235.º da Constituição. Neste quadro, mesmo que se qualificasse como restrição legislativa a limitação do direito de apresentar candidaturas aos órgãos autárquicos da área respeitante ao recenseamento dos proponentes, sempre se teria a medida por adequada ao objetivo: a tutela de interesses próprios da população respetiva – aqueles que são, nas palavras de Gomes Canotilho e Vital Moreira «comuns aos residentes, e que se diferenciam dos interes- ses da coletividade nacional e dos interesses próprios das restantes comunidades locais» –, não se podendo, assim, assacar ao corpo normativo fiscalizado uma violação desproporcionada do direito dos cidadãos a participar na vida política. 2 – Entendemos também que o legislador cumpriu a injunção constitucional de, no quadro da organi- zação política do Estado, consagrar a plena viabilidade de candidatura dos grupos de cidadãos eleitores aos vários órgãos das autarquias locais. Nos termos do n.º 4 do artigo 239.º da Constituição, «As candidaturas para as eleições dos órgãos das autarquias locais podem ser apresentadas por partidos políticos, isoladamente ou em coligação, ou por gru- pos de cidadãos eleitores, nos termos da lei». Verdade que o direito de apresentação de candidaturas a órgãos autárquicos através de grupos de cida- dãos eleitores não consubstancia apenas um direito político dos cidadãos, ele comporta também uma refra- ção objetiva, no quadro da organização política do Estado, na medida em que implica o reconhecimento de que os grupos de cidadãos eleitores constituem sujeitos constitucionais ou, pelo menos, agentes políticos, sendo-lhes atribuído poder de iniciativa numa atividade político-constitucionalmente relevante – a candida- tura a órgãos autárquicos. Todavia, a sua concretização (como sucede na maioria dos direitos políticos previstos na Constituição) é remetida para a lei. A Constituição confere margem decisória à lei na definição das condições de que depende a candidatura dos grupos de cidadãos eleitores, impondo-lhe somente que a conformação legislativa assegure a estes grupos a faculdade de concorrerem às eleições para os órgãos das autarquias locais. Dispõe o n.º 4 do artigo 19.º da LEOAL, com a alteração introduzida pela Lei Orgânica 1-A/2020, de 21 de agosto: «4 – Os grupos de cidadãos eleitores que apresentem diferentes proponentes consideram-se distintos para todos os efeitos da presente lei, mesmo que apresentem candidaturas a diferentes autarquias do mesmo concelho».

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