TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021

222 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL a todos os lugares da assembleia municipal – prerrogativa que fica reservada aos partidos políticos: ao não poder concorrer à eleição de mais do que uma assembleia de freguesia, fica precludida a possibilidade de um grupo de cidadãos apresentar candidaturas à totalidade dos mandatos na assembleia municipal. E, note-se, o número de membros cuja candidatura está vedada pode ser muito significativo, podendo constituir quase metade da composição da assembleia municipal. Com efeito, a Constituição apenas impõe que o número de membros diretamente eleitos para a assembleia municipal seja superior ao dos presidentes de junta de freguesia (artigo 251.º da Constituição). Ora, nos termos da lei atualmente vigente, o número de membros diretamente eleitos para a assembleia municipal será, em princípio, o triplo de membros da respe- tiva câmara municipal (artigo 42.º, n.º 2, da Lei n.º 169/99, de 18 de setembro, na redação que lhe foi dada, por último, pela Lei n.º 71/2018, de 31 de dezembro), sendo o número de membros da câmara municipal dependente do número de eleitores daquele município (artigo 57.º da mesma Lei). Significa isto que, em certos concelhos ( maxime , aqueles com um reduzido número de eleitores e em que exista um número considerável de freguesias), procede-se ao aumento do número de deputados à assembleia municipal de modo a que o número de membros diretamente eleitos seja sempre superior ao dos membros indiretamente eleitos (os presidentes de junta de freguesia – cfr. artigo 42.º, n. os 1 e 2, da Lei n.º 169/99, de 18 de setembro, na redação que lhe foi dada, por último, pela Lei n.º 71/2018, de 31 de dezembro). Veja-se o exemplo dado por António Cândido de Oliveira, “A difícil…”, ob. cit. , p. 106, ainda que por referência à realidade anterior à reorganização territorial de 2013: «Ela terá sempre o triplo do número de membros da respetiva câmara municipal escolhidos por eleição direta e método de Hondt e a sua composição completar- -se-á com os presidentes das juntas de freguesia do município em causa sempre que o seu número for inferior ao dos eleitos diretamente. Quando o número dos presidentes de junta for superior, aumenta-se o número de membros eleitos diretamente por forma a que estes sejam sempre em número igual ao daqueles mais um. O município de Barcelos, por exemplo, porque possui 89 freguesias, tem 90 membros eleitos diretamente, o que dá um total de 179 membros na assembleia municipal». Note-se que o sistema de representação proporcional estatuído no artigo 239.º, n.º 2, da Constituição agrava ainda mais esta desigualdade: v. g. um grupo de cidadãos eleitores que obtenha 51% dos votos ao nível do município (elegendo o Presidente da Câmara Municipal e a maioria dos vereadores), pode perder a maio- ria na assembleia municipal; no exemplo dado, tal percentagem de votos assegurará 46 deputados munici- pais, número que ascenderá a 47 contando com o presidente da junta da única freguesia a cuja assembleia o grupo de cidadãos pôde simultaneamente candidatar-se, num universo de 179 membros. Daqui decorre que as normas fiscalizadas não admitem aos grupos de cidadãos eleitores a candidatura a todos os lugares da assembleia municipal, por não lhes permitir concorrer aos lugares indiretamente eleitos. A solução legal não se limita a criar requisitos distintos para os grupos de cidadãos eleitores, tendo ainda por efeito impedir a candidatura de um grupo de cidadãos eleitores a todos os lugares da assembleia municipal, em dissemelhança do que sucede com os partidos políticos. 14. No sentido de que a Constituição não impõe a viabilidade de candidatura a todos os mandatos da assembleia municipal podem avançar-se dois argumentos. Por um lado, deve sublinhar-se que a Constituição apenas determina que as candidaturas podem ser apresentadas «por grupos de cidadãos eleitores, nos termos da lei» (artigo 239.º, n.º 4), conferindo ampla margem ao legislador na respetiva modelação. Nesse quadro poderia sustentar-se não resultar da Constitui- ção uma injunção de todos os mandatos da assembleia municipal poderem ser disputados por grupos de cidadãos eleitores. Por outro lado, pode sustentar-se que a integração dos presidentes de junta de freguesia na assembleia municipal – que é constitucionalmente estabelecida, no artigo 251.º da Lei Fundamental – se liga à represen- tação dos interesses da freguesia no órgão deliberativo do município, levando em conta eventuais divergên- cias entre os interesses locais da freguesia e os interesses locais do município, sendo certo que o município e a freguesia são autarquias distintas, sem qualquer poder de direção, superintendência ou tutela entre si (Gomes

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