TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021
191 acórdão n.º 172/21 No que respeita ao critério de densidade de controlo, retira-se da jurisprudência do Tribunal Constitucional já referida, que, no domínio contraordenacional, é de reconhecer um maior poder de conformação do legislador, o que vale por dizer que deve o Tribunal limitar-se a um controlo de evidência. Ora, a norma sub judicio , ao comprimir, é certo, o princípio da proibição de transmissão da responsabilidade, fá-lo em observância de deveres estaduais de proteção ou de prestação de normas, impendentes sobre o legislador ordinário, destinados a proteger bens jusfundamentais face a potenciais agressões provindas de terceiros, que se extraem do artigo 59.º, n.º 1, alínea c), da Constituição. Com efeito, através da responsabilização dos respetivos administradores, dirigentes ou diretores pelo paga- mento de coima aplicada à pessoa coletiva responsável pela contraordenação laboral, o legislador terá pretendido tornar mais eficaz a efetivação do sistema sancionatório num domínio em que a Constituição lhe comete expres- samente deveres de proteção, ainda que sacrificando o princípio da proibição de transmissão da responsabilidade. Qualquer juízo sobre a razoabilidade da ponderação, efetuada pelo legislador ordinário, passa por pesar a inten- sidade do sacrifício imposto pela norma sub judicio ao princípio da proibição de transmissão da responsabilidade e a vantagem que através dela se obtém para efeitos da proteção dos deveres estaduais que se extraem do artigo 59.º, n.º 1, alínea c) . No que respeita ao primeiro aspeto, verifica-se que a norma sub judicio não sacrifica totalmente o princípio da proi- bição de transmissão da responsabilidade. Com efeito, os sujeitos ficam apenas responsáveis pelo pagamento da coima, não lhes sendo transmitida a autoria do ilícito contraordenacional em si mesma considerada (vide supra , ponto 6). A isso acresce que a transmissão da responsabilidade não opera entre indivíduos, mas sim entre uma pessoa coletiva, entidade responsável pela contraordenação laboral, e titulares de órgãos executivos dessa mesma pessoa coletiva. Dada a conexão objetivamente existente entre o sujeito passivo responsável pela contraordenação e os sujeitos que, nos termos da norma sub judicio , ficam responsáveis pelo pagamento da coima, não se afigura que a compressão do princípio da proibição de transmissão da responsabilidade se aproxime sequer do seu núcleo. Por sua vez, no que se refere à vantagem que através dela se obtém para efeitos da proteção dos deveres estaduais que se extraem do artigo 59.º, n.º 1, alínea c) , é admissível o entendimento segundo o qual o envolvimento, através da assunção coerciva da responsabilidade pelo pagamento da coima, dos administradores, gerentes ou diretores da pessoa coletiva responsável pela contraordenação-laboral, garante, diretamente, uma maior eficácia na cobrança efetiva da coima, e, através disso, indiretamente, uma mais elevada probabilidade de que a infração não chegará sequer a ser cometida, assim se protegendo melhor bens jusfundamentais. Assim, porque não é possível, segundo um critério de evidência, asseverar que é desnecessário para efeitos de cumprimento dos referidos deveres de proteção o mecanismo de corresponsabilização pelo pagamento estabelecido no n.º 3 do artigo 551.º do Código do Trabalho (2009), o Tribunal Constitucional não pode senão deferir perante o juízo formulado pelo legislador sobre a adequação e necessidade do regime legal». Por seu turno, o Acórdão n.º 691/16 não julgou inconstitucional a norma decorrente do n.º 1 do artigo 551.º do Código do Trabalho, que estabelece que «o empregador é o responsável pelas contraordenações laborais, ainda que praticadas pelos seus trabalhadores no exercício das respetivas funções, sem prejuízo da responsabilidade cometida por lei a outros sujeitos». O Tribunal Constitucional considerou que, por impen- der sobre a entidade patronal o dever legal de garantir as condições de segurança no trabalho, a mesma era contraordenacionalmente responsável, não apenas nas hipóteses em que, por ação sua, tivesse diretamente originado o resultado antijurídico, mas ainda no contexto de uma contribuição omissiva, causal ou cocau- salmente promotora do resultado típico presumido, quando a infração fosse cometida por trabalhadores que se encontrassem ao seu serviço. Nesse sentido, considerou-se que a solução contida no n.º 1 do artigo 551.º do Código do Trabalho de admitir a responsabilidade autónoma do empregador, sempre que um dever legal seja violado pelos seus trabalhadores, no exercício das suas funções e por causa delas, não poderia ser conside- rada violadora do princípio penal da culpa. A responsabilidade geral referente às condições de segurança no trabalho legalmente atribuída ao empregador foi considerada suficiente para que a transmissibilidade dessa autoria não violasse princípios constitucionais.
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