TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021

181 acórdão n.º 171/21 colegial para que este se encontre constituído e delibere validamente, desta forma se assegurando a represen- tatividade e a legitimidade da decisão. Se essa preocupação é importante no geral, é ainda mais importante quando falamos de órgãos com legitimidade democrática direta, como é o caso de qualquer das assembleias constitucionalmente previstas. Só assim se consegue assegurar que os eleitores se possam considerar represen- tados pelas assembleias aquando da sua deliberação e que estas deliberações sejam legítimas. Não se trata de uma questão burocrática de somenos importância. Uma deliberação adotada sem a presença da maioria dos membros do órgão colegial é uma mera aparência de deliberação, porque não representa uma decisão verda- deiramente adotada pelo órgão. A democracia depende do respeito estrito dos procedimentos e a sua derro- gação ou erosão, mesmo por motivos à primeira vista aceitáveis, leva a uma perda de qualidade democrática. O Acórdão parece assentar na lógica segundo a qual, uma vez verificado o quórum de funcionamento estabelecido no Estatuto, estaria necessariamente verificado igualmente o quórum deliberativo estabelecido na Constituição – da presença da maioria dos membros do órgão colegial em causa, nos dois casos. Como o quórum de funcionamento estabelecido no artigo 52.º do EPARAM configuraria um requisito mínimo, nessa medida, abrangeria o quórum deliberativo. Estabelecendo o Estatuto um quórum de funcionamento superior ao quórum de deliberação exigido no Regimento aceita-se que, pelo menos em princípio, haverá coincidência entre o número de deputados presentes no momento da verificação do quórum de funciona- mento e a soma dos votos nas deliberações. Mas isso pode não ocorrer na prática. Bem pode acontecer que no início da sessão estejam presentes deputados em número suficiente para respeitar o quórum de funciona- mento da assembleia, mas durante a sessão algum deputado se ausente pontualmente da sala, coincidindo esta ausência com alguma deliberação. Independentemente desta questão, aceitando-se a tese do Acórdão, se a norma estatutária for interpre- tada como determinando indiretamente um quórum de deliberação, forçoso será concluir que ela replica a Constituição (no seu artigo 116.º, n.º 2) e, nesse caso, confirma-se que o problema que a norma sindicada evidencia é de constitucionalidade e não de ilegalidade por violação do Estatuto. Assim, não se compreende por que razão o Tribunal recusou a apreciação da questão de constitucionalidade neste caso. Não são apre- sentados na fundamentação do Acórdão motivos convincentes que o justifiquem. Diferentemente do Acórdão, creio que a apreciação da questão da conformidade ou desconformidade constitucional da norma do artigo 104.º, n.º 2 (isoladamente ou em conjugação com a norma do artigo 63.º) do Regimento da ALRAM, revelava utilidade e manifesto interesse. A ilegalidade por violação do Estatuto não dispensa a apreciação da conformidade da norma com a Constituição. Ao não conhecer desta parte do pedido – a conformidade com a Constituição da norma que determina que as deliberações sem eficácia externa são válidas desde que preenchido o quórum de um terço dos deputa- dos, constante da conjugação do n.º 2 do artigo 104.º com o n.º 1 do artigo 63.º Regimento da ALRAM – o Tribunal prolonga uma situação de incerteza sobre a constitucionalidade desta norma. 3. Distancio-me também do ponto 11 do Acórdão, desde logo da parte em que para fundamentar o não conhecimento do pedido de declaração da inconstitucionalidade e da ilegalidade da norma constante no n.º 3 do artigo 104.º do Regimento da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira, na redação dada pela Resolução da ALRAM n.º 16-A/2020/M, de 30 de abril, entretanto derrogada pela Resolução da ALRAM n.º 24/2020/M, de 14 de julho, por falta de interesse, vai ao ponto de apreciar a validade dos atos adotados ao abrigo de norma repristinada. Discordo da metodologia seguida. Para concluir pela inutilidade da apreciação, o acórdão aprecia, um a um, os atos adotados ao abrigo da norma repristinada. É com essa base que o Tribunal Constitucional afirma que «nenhuma das deliberações tomadas seria afetada pela declaração de inconstitucionalidade ou ilegalidade da norma objeto de controlo». Não consigo partilhar dessa certeza processual. Esta análise baseia- -se no Diário da ALRAM e não em dados constantes do processo junto do Tribunal Constitucional. Para além disso, parece-me acima de tudo que não será competência do Tribunal Constitucional proceder a este nível de escrutínio dos atos da função política de um órgão colegial que poderiam ser afetados por uma sua

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