TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021
179 acórdão n.º 171/21 optar pela apreciação que seja mais simples. Ora, nada no texto da Constituição e nos poderes de cognição do Tribunal Constitucional permite fundar esse critério. O segundo argumento utilizado é o de que a apreciação da legalidade é «processualmente conclusiva», pelo que dispensaria a apreciação de constitucionalidade. Este argumento também não convence, pois, qual- quer apreciação é processualmente conclusiva se efetuada. A apreciação da legalidade é conclusiva, uma vez que foi levada a cabo – a apreciação da constitucionalidade também seria conclusiva (no sentido de o seu processo conduzir a uma conclusão) se tivesse sido feita. 2.4. A invocação de razões de conveniência para não conhecer da questão de constitucionalidade colo- cada não se encontra sustentada numa fundamentação sólida. Nem poderia estar. Tal raciocínio, para ser fundamentado, teria de assentar numa lógica de equivalência ou equiparação das declarações de inconsti- tucionalidade e de ilegalidade – que permitiria ao Tribunal escolher uma ou a outra livremente –, em que a verificação do vício da ilegalidade e a declaração da invalidade correspondente poderia consumir a inconsti- tucionalidade. Desde logo, essa equivalência ou equiparação não tem qualquer respaldo na jurisprudência do Tribunal Constitucional. Nesse sentido, o presente Acórdão representa, como foi referido, um afastamento injusti- ficado da jurisprudência pacífica e estável do Tribunal em matéria de concorrência de vícios de inconstitu- cionalidade e ilegalidade. De facto, retira-se da jurisprudência do Tribunal – sem margem para qualquer dúvida – a aceitação da regra de consunção, segundo a qual a declaração da invalidade com base no vício de inconstitucionalidade pode dispensar o conhecimento da ilegalidade. Daí que a regra que o Tribunal tem seguido é a da precedência do conhecimento da inconstitucionalidade face à ilegalidade, e não a equivalência de ambos os vícios ou, muito menos, o seu contrário, ou seja, a precedência do conhecimento da ilegalidade sobre a inconstitucionalidade, como se faz neste acórdão. No sentido de que a apreciação da conformidade constitucional de uma norma deverá preceder a veri- ficação da respetiva legalidade poderia citar muitos acórdãos do Tribunal. Centrando-me em decisões do Plenário do Tribunal Constitucional em matéria de Regiões Autónomas, posso referir, por exemplo e sem pretensão de exaustividade, o Acórdão n.º 42/85 (ponto 4.1.3.), o Acórdão n.º 268/88 (pontos 3. e 4.), o Acórdão n.º 170/90 (pontos 5. e 6.), o Acórdão n.º 254/90 (ponto 9.), o Acórdão n.º 412/12 (pontos 3. e 5. da fundamentação), o Acórdão n.º 767/13 (ponto 9.) e Acórdão n.º 157/18 (ponto 7). Noutros acórdãos, o Plenário do Tribunal apreciou tanto a inconstitucionalidade como a ilegalidade de uma mesma norma, como ocorreu no Acórdão n.º 32/09 e no Acórdão n.º 465/14 – e, fora do âmbito das Regiões Autónomas, no Acórdão n.º 25/12. Por vezes, o Tribunal Constitucional enunciou exceções a esta regra da precedência do conhecimento da constitucionalidade – que são identificadas como tais – como acontece no Acórdão n.º 268/88, ponto 4., onde se refere o caso em que «os vícios de inconstitucionalidade e de ilegalidade tiverem diversa dimensão temporal (p. ex., se a ilegalidade for originária e a inconstitucionalidade superveniente), situação que, por- ventura, configurará a única exceção àquela regra». Mais tarde, o Tribunal Constitucional também admitiu conhecer primeiro da questão da legalidade por violação de Estatuto num caso em que era invocada uma «inconstitucionalidade procedimental», por violação, pela lei em causa, da «reserva procedimental de lei esta- tutária regional», assegurada no artigo 231.º, n.º 7, da Constituição no Acórdão n.º 139/15, ponto 17. Ora, não só não estamos perante qualquer destas exceções no presente processo, como a inversão da ordem natural de conhecimento, de acordo com a jurisprudência do Tribunal Constitucional, nem sequer é apresentada como uma exceção – mas apenas como uma mera questão de conveniência. Nunca o Tribunal Constitucional afirmou – pelo menos até à prolação deste Acórdão – que, concor- rendo os dois vícios numa mesma situação material, o conhecimento da ilegalidade dispensava o da incons- titucionalidade. Veio dizê-lo agora, socorrendo-se de um critério de conveniência, o que não pode ser aceite.
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