TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021

177 acórdão n.º 171/21 DECLARAÇÃO DE VOTO 1. Começo por saudar a evolução jurisprudencial que este Acórdão representa no que diz respeito ao acesso dos representantes das regiões autónomas à jurisdição constitucional. O presente Acórdão constitui um marco importante na reversão da jurisprudência restritiva do Tribunal Constitucional relativamente à legitimidade dos atores regionais a que me venho opondo, desde a primeira hora. Esta jurisprudência não admitia, por ilegitimidade, que os deputados das Assembleias Legislativas das Regiões Autónomas pedissem a fiscalização da constitucionalidade em casos, como o presente, quando estava em causa a conformidade constitucional das normas reguladoras do funcionamento dos órgãos de autogo- verno regional. Como escrevi na minha declaração de voto aposta ao Acórdão n.º 645/13: «(…) como referido no voto de vencido do Senhor Conselheiro Paulo Mota Pinto no Acórdão n.º 198/00 “pode questionar se se a violação da repartição interna de competências, constitucional e estatutariamente prevista, de órgãos da região é ainda de considerar como ‘violação dos direitos das regiões autónomas’ para efeitos do artigo 281.º, n.º 2, alínea g) , da Constituição, compreendendo nessa violação a ofensa à separação interna de poderes e às competências do seu órgão mais representativo. Mesmo, porém, sem adotar tal entendimento – que contraria a jurisprudência deste Tribunal e o presente aresto –, o que me parece claro é que, neste caso, sempre estava em causa, não propriamente uma violação de direitos da região autónoma, mas ainda a defesa desta – a defesa da repartição interna de competências e das normas do estatuto da região que a preveem é ainda, certamente, defesa da região autónoma”. No caso presente, é pedido ao Tribunal Constitucional a apreciação, não propriamente da violação da repar- tição interna de competências, mas de uma questão mais abrangente de possível violação do próprio sistema de governo regional constitucionalmente previsto (a separação de poderes entre órgãos de governo da região), pois o que é questionado é a efetiva responsabilização do Governo Regional face à Assembleia. Ora, uma tal questão res- peita à autonomia política da região, na medida em que esta pressupõe o direito da região autónoma à organização política interna democrática prevista na Constituição. Diante deste quadro, para efeitos do artigo 281.º, n.º 2, alínea g) , da Constituição, não deveria a reclamação de um tal direito ser considerada defesa de um direito da região autónoma? Que caberia à República assegurar?» É com satisfação que, perto do final do meu mandato, verifico que o Tribunal Constitucional, quando confrontado com esta questão de novo, responde afirmativamente, afastando-se da sua jurisprudência anterior. Revejo-me, portanto, no ponto 10 do presente Acórdão. O enquadramento normativo resulta da con- jugação da Constituição com os Estatutos Político-Administrativos das regiões. O cumprimento das regras e dos princípios constitucionais relativos ao sistema de governo regional e à atuação dos seus órgãos deve poder ser fiscalizável por iniciativa dos atores regionais, que têm nele um especial interesse. Para além de todas as razões expressas no acórdão, não deve ser esquecido que os Representantes da República também estão incluídos na alínea g) do n.º 2 do artigo 281.º da Constituição. Nesse caso não faz sentido restringir a sua legitimidade à defesa dos direitos das regiões, que fica fora das suas atribuições e que é prosseguida pelos órgãos de governo próprio. A inclusão dos Representantes da República no elenco da alínea g) do n.º 2 do artigo 281.º só pode significar que os órgãos aí referidos também têm legitimidade para questionar a validade dos atos normativos dos órgãos regionais à luz de parâmetros constitucionais relativos à sua organização e funcionamento, nomeadamente os princípios do Estado democrático de direito e da separação de poderes. 2. Infelizmente, depois de reconhecer a legitimidade dos requerentes para apresentar o pedido de fisca- lização da constitucionalidade das normas em causa, o Acórdão, incompreensivelmente, no seu ponto 12, conclui pela inconveniência do conhecimento da inconstitucionalidade por considerar suficiente a verifica- ção da ilegalidade das mesmas.

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