TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 109.º Volume \ 2020
89 acórdão n.º 476/20 Decreto-Lei n.º 183/2000, apesar de restringir o direito de defesa consagrado no artigo 20.º da Constituição, não comprometia o seu conteúdo essencial, posto que «o sistema instituído [oferecia] suficientes garantias de assegurar, pelo menos, que o ato de comunicação fo[ra] colocado na área de cognoscibilidade do seu destina- tário, em termos de ele poder eficazmente exercitar os seus direitos de defesa» (Acórdão n.º 182/06, itálico aditado). E confirmou-a uma vez mais nos Acórdãos n. os 108/19, 773/19 e 280/20, por entender que a notifica- ção do requerido através do envio de carta simples para a morada indicada pelo requerente do procedimento de injunção, quando coincidente com o local obtido junto das bases de dados oficiais de todos os serviços consultados e com aquele para o qual fora previamente remetida carta registada com aviso de receção, não ofende o conteúdo essencial do direito de defesa, nem viola o princípio da proporcionalidade, na medida em que, embora «dispens[e] a certeza do efetivo conhecimento subjetivo da notificação», assegura a «colocação desta última na área de cognoscibilidade do notificando», sem conferir, contudo, «à presunção de conheci- mento (ou cognoscibilidade) do ato de notificação feito nesses termos caráter absoluto ou inilidível» Foi a impossibilidade de se atingir fundadamente esse grau exigível de convicção ou o facto de a lei não permitir a ilisão da presunção de residência no local do depósito das cartas de citação, ignorando a demonstração pelo réu do contrário, que levou, em contraponto, a que a convicção do legislador acerca da idoneidade da via postal simples tivesse sido infirmada nos Acórdãos n. os 287/03, 104/06 e 632/06, também acima referidos. No Acórdão n.º 287/03, essa infirmação resultou do facto de a norma então sindicada não exigir sequer um controlo prévio da exatidão da informação prestada pelo credor sobre o domicílio do devedor, através da consulta nas bases de dados públicas – isto é, de prescindir da consideração do domicílio oficial do deman- dado. Já nos Acórdãos n. os 104/06 e 632/06, o Tribunal considerou que a realização dessa averiguação prévia, apesar de assegurada nas normas em causa, constituía uma a condição necessária mas não suficiente da con- formidade constitucional da presunção absoluta de conhecimento da citação efetuada por via postal simples para as diferentes moradas apuradas nas bases de dados, modalidade de citação que, nesse contexto, se con- siderou ser uma «ficção» legal constitucionalmente inaceitável. Conforme igualmente notado no Acórdão n.º 108/19, essa foi também a ponderação acolhida, ainda que de modo implícito, no Acórdão n.º 222/17, cuja orientação veio a ser reafirmada no Acórdão n.º 99/19, este tirado em Plenário. 22. Relativamente às normas que foram objeto dos aludidos julgamentos, a solução aqui sindicada em presença apresenta diversas particularidades. A primeira e mais importante de todas é o facto de a consagração, a título subsidiário, da citação por via postal simples se encontrar exclusivamente prevista para pessoas coletivas inscritas no ficheiro central do Registo Nacional de Pessoas Coletivas, em particular – e no que aqui especialmente releva – para as socieda- des comerciais. A previsão de um regime específico para a citação das pessoas coletivas, distinto e menos exigente do que aquele que em regra vale para a citação de pessoas singulares, não é, em si mesma, constitucionalmente problemática. Isso mesmo reconheceu o Tribunal no Acórdão n.º 174/00, ao considerar justificado, designa- damente em face da «particular natureza das pessoas coletivas», o especial regime de citação previsto no artigo 238.º-A do CPC de 1961, introduzido pelo Decreto-Lei n.º 242/85, de 9 de julho, que tornou possível a citação por correio das pessoas coletivas e sociedades, afastando, assim, quanto a estas, o regime da citação pessoal ou quase pessoal então aplicável às pessoas singulares. Ora, não há razão para que o mesmo não possa valer também para a fixação de um regime próprio as sociedades comerciais, enquanto pessoas coletivas inscritas no ficheiro central do Registo Nacional de Pessoas Coletivas, que contemple, a título subsidiário, a citação por via postal simples com certificação de depósito, por oposição ao regime de citação aplicável às pessoas singulares, que apenas admite a via postal registada. Ao contrário das pessoas singulares, as sociedades comerciais operam no e para o mercado.
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