TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 109.º Volume \ 2020

88 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL “Simplesmente, há situações em que o demandado não pode ser localizado, não obstante diligências leva- das a cabo pelo tribunal, nomeadamente a requerimento do demandante (desconhecimento do domicílio; ausência do domicílio sem deixar indicação do paradeiro, por exemplo). Ora, nos processos cíveis – normal- mente quando estão essencialmente em causa pretensões de natureza patrimonial e as partes são, para a lei, perfeitamente iguais – o legislador tem de prever mecanismos para evitar que o processo fique parado indefini- damente, à espera de que o demandado seja localizado e chamado ao processo. […] Relativamente ao processo civil em especial, Trocker, autor italiano citado várias vezes no despacho recor- rido, chama a atenção para que o fenómeno da comunicação de atos processuais às partes ou a terceiros está sempre dependente de uma concordância prática entre princípios tendencialmente opostos, entre o chamado princípio da “objetividade do direito” e o princípio subjetivo do conhecimento pelo destinatário. Cada ordena- mento jurídico pode, ou privilegiar a necessidade subjetiva do conhecimento desses atos pelo destinatário, com correlativo sacrifício da exigência de certeza objetiva do direito, ou optar antes pela tutela da mera cognoscibi- lidade desses atos de comunicação através de uma publicitação suficiente (por exemplo, citação ou notificação editais com eventual ampliação dos prazos para reação dos destinatários), sacrificando o efetivo conhecimento subjetivo. Normalmente, cada ordem jurídica acaba por consagrar soluções balanceadas ou de compromisso entre as lógicas extremas destes dois princípios ( ob. cit. , pp. 468 e seguintes)”». Trata-se, em suma, de assegurar que a «citação seja um ato sério e eficiente, isto é, que ao réu seja dado conhecimento da existência do pleito e colocado em condições de se defender»; mas que seja também «um ato, quanto possível, rápido, isto é, que sejam postos à disposição do tribunal meios suficientes para obstar a que o réu procure fugir à ação da justiça, furtando-se sucessivamente à diligência da citação» (Alberto dos Reis, Comentário ao Código de Processo Civil , Volume 2.º, p. 617). E que a harmonização de ambos os interesses contrapostos – «o interesse da seriedade do ato» e «o interesse da rapidez» ( idem ) – seja alcançada através da «adoção de soluções que importem, para cada um deles, a compressão que se mostre necessária à salvaguarda do outro, sem afetação do respetivo conteúdo essencial» (Acórdão n.º 773/19). Uma vez que a Constituição não impõe qualquer forma ou formalidade específica para a comunicação dos atos processuais às partes, é apenas quando a solução encontrada para promover esse ponto de equilíbrio não o assegure em termos efetivos e tangíveis, ou implique uma compressão desproporcionada dos princípios do contraditório e da proibição da indefesa, que as opções do legislador em matéria de citação se tornarão constitucionalmente censuráveis. 21. Vimos já que, nas sucessivas revisões do anterior Código de Processo Civil e legislação conexa, o legislador se mostrou por diversas vezes convicto de que, quer enquanto modalidade subsidiária no âmbito do regime geral da citação, quer enquanto modalidade principal no âmbito das ações para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos reduzidos a escrito e do procedimento de injunção, a citação por via postal simples constitui uma forma de comunicação suscetível de assegurar a eficácia do chamamento do demandado ao processo sem retirar ao ato a seriedade que o mesmo por essa razão pressupõe. O Tribunal – vimo-lo também – nem sempre confirmou esta convicção. Confirmou-a, por julgar respeitado o padrão fundamental de equilíbrio ou a relação de justa medida imposta no artigo 18.º, n. os 2 e 3, da Constituição, nos referidos Acórdãos n. os 91/04, 243/05 e 582/06, que não julgaram inconstitucional a norma do artigo 238.º do CPC, na redação introduzida pelo Decreto-Lei n.º 183/2000, apesar de a regra de citação por correio simples expedido para o domicílio oficial do deman- dado ali consagrada a título subsidiário não assegurar com certeza que o réu tomou efetivo conhecimento do ato de citação. Voltou a confirmá-la no Acórdão n.º 182/06, por entender que, enquanto modalidade-regra nas ações para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos reduzidos a escrito independentemente do valor, a citação por via postal simples prevista no artigo 236.º-A do CPC, na redação introduzida pelo

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