TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 109.º Volume \ 2020

707 acórdão n.º 755/20 Contrariamente, das faturas constantes de 4.2. e 4.3., parece perceber-se o que foi pago. Note-se que os outdoors se encontram previstos na Listagem n.º 38/2013, publicada no Diário da República , 2.ª série, n.º 125, de 2 de julho, e que a fatura indica o número, as dimensões, os materiais utilizados e o preço unitá- rio de cada estrutura e serviço, mostrando-se esta informação suficiente para aferir da razoabilidade do preço. Não há dúvida de que relativamente à factualidade referida em 4.1.,4.4. e 4.5. se verifica uma violação do dever imposto pelos artigos 15.º e 19.º, n.º 2 da LFP, sendo esta relevante no plano contraordenacional, no âmbito de tipo legal previsto nos n. os 1 e 2 do artigo 31.º da mesma lei, na medida em que lhe corresponde uma situação de insuficiente ou deficiente comprovação das despesas imputadas à Campanha. Para além do preenchimento do tipo objetivo de ilícito previsto no n.º 1 do artigo 31.º da LFP, a res- ponsabilidade contraordenacional que vem imputada pressupõe uma atuação dolosa, podendo esta ocorrer em qualquer uma das três modalidades em que o dolo é legalmente admitido: dolo direto, necessário ou eventual. A este respeito, provou-se que o arguido, ao atuar da forma descrita, representou como possível que a falta de detalhe das despesas tituladas pelas faturas referidas em 4.1., 4.4. e 4.5. impossibilitasse a aferição daquilo que efetivamente foi pago, conformando-se com essa possibilidade e apresentando as contas nessas condições. Estão, assim, verificados, na modalidade correspondente ao dolo eventual, o conhecimento e a vontade exigidos pelo tipo subjetivo do ilícito. 9.3. A segunda questão invocada pelo arguido respeita a uma alegada violação do princípio da legali- dade, na vertente tipicidade: o n.º 1 do artigo 31.º da LFP, ao utilizar um conceito indeterminado – devida- mente – violaria o n.º 1 e o n.º 3 do artigo 29.º e o n.º 1 do artigo 30.º da Constituição. A redação do referido artigo é a seguinte: Artigo 31.º (Não discriminação de receitas e de despesas) 1 – Os mandatários financeiros, os candidatos às eleições presidenciais, os primeiros candidatos de cada lista e os primeiros proponentes de grupos de cidadãos eleitores que não discriminem ou não comprovem devidamente as receitas e despesas da campanha eleitoral são punidos com coima mínima no valor do IAS e máxima no valor de 80 vezes o valor do IAS. O Tribunal Constitucional tem abundante jurisprudência sobre a extensão dos princípios da legalidade e da tipicidade ao domínio contraordenacional. O Tribunal tem repetidamente acentuado que «a Consti- tuição não requer para o ilícito de mera ordenação social o mesmo grau de exigência que requer para os crimes. Nem o artigo 29.º da Constituição se aplica imediatamente ao ilícito de mera ordenação social nem o artigo 165.º confere a este ilícito o mesmo grau de controlo parlamentar que atribui aos crimes» (Acórdão n.º 41/04). Como se resume no recente Acórdão n.º 231/20: “Deve, portanto, concluir-se que as exigências do enquadramento constitucional relativamente à técnica legis- lativa a ser adotada no Direito Contraordenacional não correspondem necessariamente ao paradigma mais exigente da tipicidade no Direito Criminal. É certo que a vinculação da atividade da Administração ao princípio da legalidade pressupõe a tipicidade dos seus comportamentos. Todavia, a exigência da determinabilidade na definição dos deveres impostos aos adminis- trados que podem ser sancionados administrativamente não impede o recurso a conceitos indeterminados. (…)

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