TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 109.º Volume \ 2020

69 acórdão n.º 476/20 “Atentos os fundamentos que se encontram na base dos processos de execução, nos quais o objetivo é o res- sarcimento coercivo do exequente através da excussão do património do executado, é natural que o legislador fosse mais cauteloso na observância das formalidades inerentes à citação, pois só assim se explica o teor especial da norma do art. 851.º do CPC. É inequívoca e recorrente a afirmação do papel central que o ato da citação desempenha no contexto da marcha do processo porquanto é o ato pelo qual se dá conhecimento ao réu de que foi proposta contra ele determinada ação e se chama ao processo para se defender (artigo 228.º, n.º 1, do CPC) sendo este ato que funciona como garante da salvaguarda do contraditório e, por essa via, do superior interesse de uma tutela jurisdicional efetiva. O CPC modela o ato da citação sendo a principal das suas modalidades a citação pessoal sendo a mais corrente forma de citação pessoal a citação por via postal.” 16.º Contudo, e apesar destas premissas se revelarem muito lúcidas e pertinentes, a digna magistrada judicial acabou por concluir, de forma algo surpreendente: “Ora, compulsada a factualidade supra exarada extrai-se do teor da mesma que inexiste qualquer reparo a efetuar à citação do Sr. AE e que, efetivamente, é de concluir pela regular citação da executada. Em face de tudo quanto ficou exposto, julga-se improcedente, por não provado, o presente incidente anómalo e, em consequência, considera-se regularmente efetuada a citação da executada.” Tem, o signatário, alguma dificuldade em perceber o percurso argumentativo que desemboca numa tal conclu- são, em face das premissas anteriormente assinaladas. 17.º Compreensivelmente, a executada veio interpor recurso deste despacho para o Tribunal da Relação de Lisboa (cfr. supra n.º 7 das presentes alegações), alegando que a única gerente da executada, desde a constituição da sociedade e até 2014, havia sido sempre a sócia C., que nunca havia aceite as letras exequendas, que não estavam, sequer, por ela assinadas. Desconhecendo totalmente a execução em curso, a executada viu, apesar disso, todos os seus imóveis ser penhorados à ordem destes autos. Acresce que, das moradas utilizadas para a sua citação, apenas uma, a da Rua …, n.º …, …., em Lisboa, cons- tava no registo comercial, como sede da sociedade até 2014. No entanto, mesmo nesta morada houve lugar à devolução da citação e o agente de execução foi pessoalmente informado, por uma habitante do referido prédio, que a executada já ali não estava instalada, havia cerca de 5 anos, «… tendo a fração autónoma correspondente ao … sido vendida, por duas vezes, a outras pessoas, nesse lapso de tempo». Por outro lado, o agente de execução poderia ter citada a executada na pessoa da sua legal representante, cuja morada, em São João da Pesqueira, constava da informação registral a que ele acedeu. Optando por não o fazer, e renovando as citações para endereço (Rua …, n.º …, …., em Lisboa) que anteci- padamente sabia que não permitiria que as citações chegassem ao conhecimento da sua destinatária, o agente de execução frustrou a utilidade de tais citações. 18.º Andou bem, pois, no entender do signatário, o Tribunal da Relação de Lisboa, no seu Acórdão de 24 de abril de 2019, ao concluir, apreciando o recurso interposto pela executada (cfr. supra n.º 8.º das presentes alegações) (destaques do signatário):

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