TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 109.º Volume \ 2020
630 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Por conseguinte, uma das exceções ao princípio de que para a formação da convicção do Tribunal somente valem as provas produzidas na audiência de julgamento é justamente o caso em que as declarações do arguido tenham sido efetuadas perante autoridade judiciária com assistência de defensor e o arguido tenha sido informado nos termos e para os efeitos do disposto na alínea b) do n.º 4 do art. 141.º, tal como decorre do art. 357.º, n.º 1, al. a) , preceito este que permite (não impõe) a reprodução ou leitura das declarações prestadas pelo arguido perante autoridade judiciária nos apontados termos. Tal permissão traduz-se por isso numa faculdade, atribuída aos sujeitos processuais, de o poderem fazer ou requerer, não se impondo uma obrigatoriedade de leitura. E mal se compreendem as apontadas violações dos princípios da imediação e do contraditório, pois que quanto ao primeiro, ainda que as declarações prestadas pelo arguido perante autoridade judiciária fossem lidas na audiên- cia de julgamento, o juiz do julgamento apenas poderá ouvir o que está gravado no registo áudio ou audiovisual e nunca ter contacto direto com a pessoa no momento em que as prestou (contacto com a prova na altura da pro- dução da mesma), e relativamente ao segundo, sendo o arguido assistido por defensor aquando da prestação das declarações, é-lhe portanto dada a efetiva possibilidade de formular todas e quaisquer perguntas relativamente aos factos que são imputados ao arguido. Donde, tal como acertadamente refere o Ministério Público na primeira instância “não se vislumbra qualquer reforço dos princípios da imediação e do contraditório com a leitura em audiência de julgamento das declarações prestadas pelo arguido perante autoridade judiciária. De facto, os intervenientes processuais têm conhecimento da existência de tais declarações, nomeadamente o arguido e o seu defensor, até porque aquando da sua recolha ficam documentadas no processo com gravação áudio ou audiovisual, suporte este disponível a todo o tempo para qualquer interveniente. Trata-se, ademais, de um meio de prova indicado na acusação e/ou no despacho de pro- núncia, meio de prova este cristalizado, sendo a sua leitura/audição insuscetível de o alterar, podendo sempre ser discutido, contestado e ponderado pelos intervenientes processuais na audiência de julgamento, perante o juiz do julgamento, que irá sempre ter um contacto com esta prova, não diretamente no momento em que foi produzida, mas através da audição/visualização de tais declarações, nem que seja no recato do seu gabinete, para tomar conhe- cimento efetivo do teor destas declarações.”. Em conformidade, as referidas declarações, ainda que não produzidas em audiência, não constituem prova proibida por força da interpretação conjugada dos preceitos acima enunciados, pelo que estando as mesmas exara- das em auto no processo e não constituindo qualquer surpresa para os arguidos na fase de julgamento, será por isso sempre despicienda a invocação de que essa valoração pelo tribunal da primeira instância, veio lesar o seu direito de defesa – veja-se neste sentido, entre outros, o Ac. da Relação de Lisboa de 11/20/2019 relatado pela Sra. Desem- bargadora Ana Paula Grandvaux no Proc. 658/17.1PZLSB.L1-3 disponível i n www.dgsi.pt . » 4. Deste acórdão foi interposto recurso para o Tribunal Constitucional através de requerimento com o seguinte teor : «1. O presente recurso é interposto ao abrigo dos artigos 70.º, n.º 1, al. b) e n.º 2, 71.º, n.º 1, 72.º, n.º 1, al. b) e n.º 2, 75.º, n.º 1 e 75.º-A, n. os 1 e 2, todos da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional. 2. O Recorrente suscitou no recurso que interpôs do Acórdão datado de 11 de março de 2020 do Tribunal Judicial da Comarca de Porto Este, Juízo Central Criminal de Penafiel – Juiz 1, a inconstitucionalidade da inter- pretação produzida das disposições conjugadas dos artigos 355.º, 356.º n.º 9 e 357.º do Código de Processo Penal. (CPP). [...] 4. Como se vê, no referido recurso, alegou o ora Recorrente a inconstitucionalidade da interpretação no sentido de que a valoração de declarações anteriores de arguidos (e coarguidos) em sede de julgamento, sem que a sua leitura seja admitida, por decisão que conste em ata, nos termos do art. 357.º n.º 3 e 356.º n.º 9 do CPP,
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