TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 109.º Volume \ 2020

629 acórdão n.º 770/20 discutida em sede de reapreciação da prova, no âmbito da impugnação da matéria de facto, aí se discutindo se se trata de prova proibida, ou não. E que em matéria de nulidades de sentença, a lei processual não prevê nenhuma que decorra da omissão de uma diligência que respeite à produção da prova. Prevê, no entanto, que a omissão, em fase de julgamento, de uma diligência reputada como essencial para a descoberta da verdade, traduza uma nulidade do procedimento, prevista no art. 120.º, n.º 2, al. d) , 2.a parte, a qual depende de arguição pelos interessados, no prazo referido no n.º 3 al. a) , do mesmo artigo. Tratando-se de nulidade do ato a que o interessado assista, até ao final desse ato, caso contrário, no prazo geral de dez dias, referido no art. 105.º, n.º 1, tendo a mesma de ser arguida perante o tribunal de primeira instância, o qual deverá sobre ela tomar posição em primeiro lugar, na medida em que, só as nulidades de sentença podem ser invocadas no recurso desta, perante o tribunal superior. Das demais, o tribunal superior só conhecerá em recurso da decisão que sobre elas for proferida na primeira instância. Consequentemente, a nulidade referida, a existir, estaria neste momento sanada, porque não invocada no alu- dido prazo, perante o tribunal recorrido. Ainda assim, mesmo só podendo ser discutida a pertinente questão – se se trata ou não de prova proibida – em sede de reapreciação da prova, no âmbito da impugnação da matéria de facto, adianta-se já o seu conhecimento em separado, na medida em que é manifesto que não assiste razão ao recorrente. Em suma, como explicado supra , sustenta o recorrente que, atentos os princípios da imediação e do contradi- tório, o tribunal a quo não podia ter valorado, para efeito de formação da sua convicção, as declarações que foram prestadas pelos identificados arguidos no primeiro interrogatório judicial [...], porque estas não foram lidas nem reproduzidas em audiência, em violação do art. 355.º. Atentemos. Resulta do aludido normativo (n.º 1) que não valem em julgamento, nomeadamente para formação da convic- ção do tribunal, quaisquer provas que não tiverem sido produzidas ou examinadas em audiência, com a ressalva, do preceituado no n.º 2 do mesmo dispositivo legal. Ou seja, a regra do n.º 1 do art. 355.º cede, nos termos do n.º 2 do mesmo preceito, “quando estão em causa as provas contidas em atos processuais cuja leitura, visualização ou audição em audiência sejam permitidas, nos termos dos artigos seguintes”, entre elas se encontrando, precisamente, as declarações do arguido, tomadas ao abrigo do art. 141.º, n.º 4, desde que o arguido tenha sido informado, como determina a al. b) , por força do disposto no art. 357.º, n.º 1 al. b) . O que está estabelecido neste último normativo, tal como no anterior (art. 356.º), é uma simples permissão de leitura, deles não transparecendo qualquer obrigatoriedade de leitura quando o meio de prova e o respetivo conteúdo já são do conhecimento do arguido, leitura; que só se justificará quando este e os demais intervenientes processuais dele não tiverem conhecimento. Se as declarações em causa constam dos autos desde o início do inquérito, foram prestadas pelo arguido em prejuízo do qual foram valoradas, sabendo ele que essa valoração era permitida pela lei porque disso foi expressa- mente informado, ou por coarguido desde que aquele tenha a possibilidade efetiva de as contraditar (“e daí que a norma específica contida no artigo 345.º do diploma neutralize quaisquer efeitos incriminatórios das declarações prestadas por coarguido, se este se recusar a esclarecê-las ou a responder a perguntas que lhe sejam formuladas sobre os factos que lhe foram imputados” como se lê no acórdão recorrido, sendo certo que o presente caso não assume tal envolvência) constando tais declarações como meio de prova entre os demais indicados pela acusação (como sucedeu in casu – cfr. fls. 2358 do despacho de pronúncia), nenhuma ofensa existirá às garantias de defesa ou ao princípio do contraditório, se forem efetivamente valoradas sem que tenham sido lidas em audiência. Aliás, é o que precisamente acontece com as declarações para memória futura, relativamente às quais o Supremo Tribunal de Justiça fixou jurisprudência – cfr. Acórdão n.º 8/17 ( Diário da República n.º 224/2017. série I. de 2017-11-211. no seguinte sentido: “As declarações para memória futura, prestadas nos termos do artigo 271.º do Código de Processo Penal, não têm de ser obrigatoriamente lidas em audiência de julgamento para que possam ser tomadas em conta e constituir prova validamente utilizável para a formação da convicção do tribunal, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 355.º e 356.º, n.º 2, alínea a) , do mesmo Código.”

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