TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 109.º Volume \ 2020

621 acórdão n.º 741/20 subordinado ou independente, em exclusividade ou em cumulação. Em suma, encontra-se constitucionalmente protegido o direito a escolher livremente, sem impedimentos, nem discriminações, qualquer profissão. De todo o modo, à semelhança dos restantes direitos fundamentais, o direito à liberdade de escolha e exercício de profissão não é um direito absoluto, sendo que no próprio enunciado normativo relativo à sua consagração encontra-se habilitação constitucional expressa à imposição de restrições legais (parte final do n.º 1 do artigo 47.º). Assim sendo, a exigência de fundamento constitucional à restrição de um direito fundamental (primeira parte do n.º 2 do artigo 18.º), é, no presente caso, verificável com meridiana clareza e sem necessidade de se entrar na discussão sobre a admissibilidade de restrições a direitos fundamentais não expressamente autorizadas pela Cons- tituição: consta do n.º 1 do artigo 47.º habilitação expressa à determinação, por via legal, de restrições ao direito fundamental à liberdade de escolha de profissão. Não é, por isso, discutível se a Constituição admite a adoção de medidas legais restritivas deste direito fun- damental, desde que fundadas na capacidade do titular do direito fundamental ou sejam impostas pelo interesse colectivo (segunda parte do n.º 1 do artigo 47.º)”.  Neste sentido, a parte final do artigo 47.º, n.º 1, da CRP tem, naturalmente, que ser interpretada no sentido de impor que as restrições que expressamente autoriza encontrem justificação objetiva à luz de interesses constitucionalmente consagrados. Ou seja, a par do teste da proporcionalidade, inerente ao artigo 18.º da CRP, importa aferir se, e como, as eventuais restrições que incidam sobre as condições, atributos e encargos relativos a uma escolha profissional se ajustam aos comandos substanciais da Constituição. 11. Ora, dito isto, e em face do objeto do presente recurso, resta perguntar: é compatível com a Cons- tituição da República Portuguesa que as restrições ao direito de inscrição para o exercício da advocacia – designadamente, e no caso concreto, a restrição que abrange todos aqueles que estejam em situação de incompatibilidade ou inibição de tal exercício – incluam, no seu âmbito subjetivo, os advogados estagiários? Vejamos. Nos termos das alegações do recorrente, o atual Estatuto da Ordem dos Advogados não contém uma disposição expressa relativa às incompatibilidades dos advogados estagiários, sendo essas incompatibilidades resultantes apenas de “uma interpretação acrítica e literal” do artigo 188.º, n.º 1, alínea d) , do EOA. Como é fácil perceber, este argumento é estranho à questão de inconstitucionalidade; na verdade, ele apresenta um dado, pressuposto dos poderes de cognição deste Tribunal Constitucional – a forma como a norma questio- nada foi interpretada pelo tribunal a quo. De qualquer forma, sempre se dirá que, do artigo 193.º do EOA, com a epígrafe “Aplicabilidade do Estatuto”, se pode, apesar de tudo, retirar um princípio de equiparação ou de indiferenciação quanto aos requisitos deontológicos mínimos de isenção e independência indispensáveis ao exercício das respetivas ati- vidades. Ao prever-se que os advogados estagiários ficam, desde a sua inscrição, obrigados ao cumprimento do Estatuto e demais regulamentos, faz sentido, por identidade de razão, que a respetiva inscrição na Ordem dos Advogados deva estar sujeita às mesmas restrições. Em segundo lugar, sustenta o recorrente que o atual regime de incompatibilidades, sendo “comum a Advogados e Advogados Estagiários”, “perde qualquer razão de ser após 2005, pois os estagiários apenas podem praticar “atos próprios” sob orientação do patrono, no fundo, nos termos em que este o permitir; após 2005, o estágio de acesso à profissão de Advogado, em rigor, é um mero curso preparatório, repita-se, de acesso à profissão (curiosamente chama-se Curso de Estágio), e não já o exercício de uma “parcela” da profissão, como acontecia antes de 2005”. Por essa razão, entende, e dada a falta de autonomia funcional do advogado estagiário, decaem os argumentos de interesse público que justificam a restrição do acesso à pro- fissão de advogado, ainda que possam verificar-se quanto ao seu exercício efetivo e autónomo. Na verdade, afirma, o estágio “nem sequer pode ser considerado ainda como exercício de uma profissão, mas tão só como um dos requisitos de acesso à profissão de advogado”.

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