TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 109.º Volume \ 2020
616 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 24. Efetivamente, com uma visão realística da vida, poder escolher LIVREMENTE entre vir a exercer a advo- cacia ou simplesmente continuar a carreira no funcionalismo público. 25.Se vai exercer ou não a profissão é, de facto, outra questão: feito o estágio, se, v. g. , for membro das Forças Armadas, das duas uma: a. Ou se demite da função pública e passa a exercer a advocacia, ou então opta por conti- nuar a carreira militar e esquece a advocacia (mas repare-se: pode escolher livremente!): b. Se for apenas um técnico superior, ou outro trabalhador público, das duas uma, ou tem a possibilidade de exercer a advocacia ao abrigo do regime do artigo 82.º, n.º 3, EOA, ou se demite da função pública e passar a exercer a advocacia (mas repare-se novamente: pode escolher livremente!) 26.Admitimos que há casos cinzentos, como por exemplo o de saber se um magistrado poder realizar o estágio tout court (estágio normal) [artigo 82., n.º 1 alínea e) , EOA], mas, 27.São casos absolutamente marginais e irreais, pois um magistrado, que não queira continuar a ser magis- trado, não necessita de realizar o estágio tout court (estágio normal), pois o EOA admite a sua inscrição quase direta, sendo dispensados da prova de agregação (artigo 199.º, EOA). 28. Não deixa de ser curioso que um membro das Forças Armadas/militarizadas, possa ser magistrado judicial ou magistrado do Ministério Público em regime de estágio (juiz estagiário ou procurador-adjunto estagiário), estando sujeito simultaneamente ao RDM e ao Estatuto Disciplinar aplicável aos Auditores de Justiça, mas já não possa ser advogado estagiário !??? 29. Perguntamos, será que o EOA (pós 2005) veda a mera realização do curso de estágio, como mero requisito de acesso à profissão de advogado, às situações que se encontram previstas nas várias alíneas do artigo 82.º, n.º 1, do EOA? (quanto aos magistrados a restrição é aparente/irreal, como vimos, nem sequer sendo verosímil que um magistrado se propusesse afazer um estágio tout court tendo a possibilidade de se inscrever na OA de forma quase direta). 30. Não nos parece, a restrição é apenas aparente. Vejamos, 31. Considerando que todos “têm o direito de escolher livremente a profissão..., salvas as restrições legais impostas pelo interesse coletivo” (artigo 47.º, n.º 1, CRP). 32. Considerando que a todos “é garantida a liberdade de aprender” (artigo 43.º, n.º 1, da CRP). 33. Considerando que a todos “são reconhecidos os direitos... ao desenvolvimento da personalidade” (artigo 26.º/1, CRP). 34. Considerando que as “leis restritivas de direitos, liberdades e garantias... não podem... diminuir a extensão e o alcance do conteúdo essencial dos preceitos constitucionais” (artigo 18.º, n.º 3, da CRP). 35. Considerando que não se vislumbra qual possa ser o interesse coletivo (artigo 47.º/1, CRP) que justifique a restrição legal impeditiva da realização de um mero “Curso de Estágio” como mero requisito de acesso a uma pro- fissão (“curso de estágio” que não representa, atualmente, o exercício de qualquer «parte» da profissão de advogado, tendo uma natureza formativa e certificativa). 36. Já, e no âmbito do EOA anterior a 2005, aludindo à problemática da menor exigência de restrição quanto ao direito de admissão à profissão (coisa diferente da liberdade de exercício da profissão), Paulo Castro Rangel, O Princípio da Taxatividade das Incompatibilidades, Revista da Ordem dos Advogados , Ano 54, Lisboa, dezembro de 1994, Tomo III, p. 784. 37. Conclui-se que, de acordo com o atual EOA, a ninguém pode ser vedado o acesso a um mero curso de estágio (de natureza formativa e certificativa) de acesso à profissão de Advogado, pois qualquer outra interpretação do artigo 188.º do EOA, que leve à ablação do direito fundamental de realização daquele estágio, é materialmente inconstitucional por violação, pelo menos, o artigo 47.º/1, da CRP, bem como o artigo 18.º, n.º 2, da CRP, rectius o princípio da proporcionalidade (e logo na vertente da adequação – uma vez que não nada há para acautelar, pois as incompatibilidades, in casu , não têm objeto, nada salvaguardando –, se passarem ao teste da adequação, certa- mente chumbariam o teste da necessidade, ou, in extremis , chumbariam ao teste da proporcionalidade stricto sensu ), outrossim do artigo 26.º, n.º 1, da CRP, na vertente do direito ao desenvolvimento da personalidade.
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