TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 109.º Volume \ 2020

611 acórdão n.º 741/20 militarizada exercer a advocacia, por maioria de razão o é aos membros da GNR que é uma forca militar (con- quanto não integrada na Forças Armadas). 59. Se foi isto que o acórdão recorrido quis dizer, só podemos reconhecer que tem toda a razão de uma pers- petiva formal. 60. Contudo, parece-nos que estamos perante um exemplo clássico de petição de princípio, pois o fundo da questão foi completamente olvidado (para não falar da metodologia da interpretação de leis restritivas). 61. E qual é o fundo da questão? 62. O fundo da questão é a ratio legis da norma, a sua teleologia, o que se pretende ali tutelar, que é justamente a independência e isenção exigidos ao exercício da profissão de advogado, princípios que merecem ser salvaguar- dados, naturalmente. 63. E na indagação da resposta a esta questão, numa primeira aproximação ao assunto, é fácil consideramos que uma força militar como (GNR) tem um regime de hierarquia mais intenso do que o de uma força militarizada (ex., a polícia marítima). 64. Ora, em termos normais assim seria, pois em termos normais, em termos lógicos, uma força militar (ainda que não integrada nas Forças Armadas) prima facie deveria, por princípio, ter um regime de hierarquia mais intenso do que o de uma força militarizada. 65. Mas o que é facto – contra a lógica – é que não tem, o atual (por opção legislativa/política) regime de hierarquia da GNR é de matriz civilístico, sendo muito semelhante aos demais regimes disciplinares da função pública, quer o geral quer os especiais, muito semelhante (no aspeto da intensidade hierárquica) ao regime disci- plinar da polícia marítima, que é a força militarizada mater . 66. O que sucede é que quando a norma em crise foi criada (introdução do adjetivo militarizadas), com a aprovação do EOA de 1984, mantendo-se nas revisões posteriores do EOA até ao atual, efetivamente, o regime de hierarquia nas forcas militarizadas era o mesmo que nas Forças Armadas, vigorando numas e noutras o RDM, ou então, no caso da PSP (força militarizada à época), que já tinha um Estatuto Disciplinar próprio, mas ainda assim mantinha subjacente uma forte hierarquia, existindo neste Estatuto a possibilidade de se aplicar pena de prisão disciplinar. 67. Aliás, à época (até final do século XX) quer a força fosse militar ou militarizada estava sujeita ao RDM, ou quando não, a um Estatuto Disciplinar muito intenso, caso da PSP até 1990. 68. Daí, em 1984, com a aprovação do EOA, fazer sentido a parificação entre Forças Armadas e forças milita- rizadas, pois afinal o que estava em causa era a questão substantiva da forte hierarquia. 69. Sucede que, os anos passaram e a norma do EOA não foi alterada, mas a realidade subjacente foi, e esta questão é de vital relevância, pois a substancia, nas questões materiais, maxime quando de trata de restringir direitos fundamentais, deve prevalecer sobre a forma. 70. A alteração da realidade subjacente. 71. Em relação à PSP que era uma força militarizada e sujeita a forte hierarquia, deixou a lei de a qualificar como militarizada, sendo posteriormente aprovado um novo Estatuto Disciplinar de matriz civilístico. Desta feita, a OA permite aos seus membros o exercício da advocacia em regime de subordinação e exclusividade, sem que, repare-se, tivesse havido qualquer alteração, sobre esta questão, nos posteriores EOA. E bem. 72. Em relação às demais forças militarizadas, antes do final do século XX, estas deixaram de estar sujeitas à intensidade hierárquica do RDM, o que se deu com a aprovação do Estatuto Disciplinar da Polícia Marítima, de onde foi «extraída» a forte hierarquia, outrossim com a declaração, com força obrigatória geral, por esse Tribunal Constitucional, da inconstitucionalidade da aplicação de penas de prisão disciplinar a agentes militarizados (Ac. 308/90). 73. Até à entrada em vigor do atual RDGNR (1999), não nos chocaria a recondução da GNR ao conceito de forças militarizadas para efeitos do EOA, mas tão só, com já acima referimos, por ali faltar outro conceito, pois como já acima dissemos o conceito de forças de segurança só foi cabalmente introduzido com a 4.ª revisão constitucional em 1997. a. Esta afirmação que acabamos de fazer é apenas teórica e inócua, pois à época a questão que se discute nos presentes autos não se colocaria, pois até ao EOA de 2005. a todos era permitido o exercício da

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