TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 109.º Volume \ 2020

599 acórdão n.º 740/20 direitos, liberdades e garantias, em razão do reconhecimento de um direito subjetivo fundamental ao recurso nas condições mencionadas em tal jurisprudência. Por último, duas observações críticas relativamente ao percurso argumentativo que culminou na afirma- ção do “desvio” à jurisprudência dos Acórdãos n. os 40/08, 44/08 e 197/09. Primeira: Atenta a questão de constitucionalidade formulada na sequência da delimitação do objeto material do recurso – é constitucionalmente admissível que a decisão da relação que determina a quebra do sigilo bancário não seja recorrível, segundo qualquer uma das vias de recurso ordinário previstas no Código de Processo Civil? (cfr. o n.º 8, in fine ) –, não se compreende que a respetiva análise comece por se centrar na relevância jusfunda- mental do «segredo profissional de uma pessoa coletiva» (vide os n. os 11, início, n.º 12, início, e, sobretudo, os n. os 13 e 14). A norma aplicada pelo tribunal recorrido e sindicada pelo recorrente – correspondente ao critério normativo que o Tribunal Constitucional pode e deve cotejar com a Constituição (cfr. o artigo 79.º-C da Lei do Tribunal Constitucional) respeita exclusivamente à recorribilidade da decisão de quebra do sigilo bancário, independentemente de quem seja o titular das informações protegidas por tal segredo. Do ponto de vista metó- dico, a análise da aludida questão de constitucionalidade impunha a resposta às seguintes questões – e somente a elas: i) o sigilo bancário – nomeadamente, as informações por este protegidas – é tutelado pelo direito à reserva da intimidade da vida privada? (emmeu entender, sim, de acordo com os critérios da jurisprudência dos Acórdãos n. os 442/07, 145/14 e 517/15); ii) a decisão de quebra do sigilo constitui uma ingerência no direito à reserva da intimidade da vida privada? (em meu entender, sim, porque permite o acesso de terceiros a informa- ções privadas contra a vontade da pessoa a que tais informações respeitam). Segunda: Por maioria de razão, não se justificam as considerações e ponderações relativas ao caso concreto em análise, que chegam ao ponto de contradizer o entendimento das instâncias e do recorrente (fundado no artigo 78.º, n.º 1, do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, e segundo o qual o sigilo bancário tem por objeto «informações sobre factos ou elementos respeitantes à vida da instituição ou às relações desta com os seus clientes» – sejam eles pessoas coletivas ou singulares) que foi determinante para a conformação do objeto material do recurso de constitucionalidade. Com efeito, afirma-se no presente Acór- dão que, no caso sub iudicio , está em causa uma situação em que o sigilo bancário é invocado para «proteger a instituição bancária em si mesma», pelo que nem «sequer [se trata de] uma situação de verdadeira proteção do segredo bancário enquanto categoria de um conjunto mais vasto de situações de sigilo profissional, mas sim de invocação do segredo bancário na sua vertente de segredo mercantil» e, assim sendo, «terá de ser este o concreto pendor considerado em sede de ponderação jurídico-constitucional – o do segredo bancário entendido como proteção da informação relativa à atividade do Banco» (cfr. o n.º 14 e, sobretudo, o n.º 15). Embora não tenha sido esta a ratio decidendi do Acórdão, conforme resulta claramente dos seus n. os 16 e 17, não menos claramente é certo que não compete ao Tribunal Constitucional, nesta sede de fiscalização concreta, uma avaliação própria de uma instância com poderes de amparo ou de decisão sobre verdadeiras queixas constitucionais – e, se fosse caso de proceder a uma avaliação nesses termos, então haveria que fazer uma apreciação do caso muito mais profunda e completa (esclarecendo, por exemplo, se os documentos e informações exigidos ao banco, ora recorrente, excluíam de todo em todo, a revelação de informações res- peitantes também a outros dos seus clientes para além dos ora recorridos). Porém, não é isso que importa para a decisão do recurso de constitucionalidade, nos termos do artigo 280.º da Constituição. Em especial, no presente recurso, não estava em causa nem a legitimidade nem a possibilidade de se fazer a ponderação prevista no artigo 135.º, n.º 3, do Código de Processo Penal (e, por conseguinte, a legitimidade e a possi- bilidade de “sacrificar” o direito à reserva da intimidade da vida privada protegido pelo sigilo bancário); e, muito menos, apreciar o acerto da ponderação e da consequente decisão tomada, in casu , pelo Tribunal da

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