TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 109.º Volume \ 2020

598 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL uma dimensão marcadamente objetiva» – decorrente da ponderação de outros interesses constitucionais, para além do direito fundamental atingido pela quebra do sigilo, igualmente carecidos de proteção, como sejam «os valores da celeridade e segurança na administração da justiça» e se salienta o dever (de cidadania) de cooperar no apuramento dos factos considerados relevantes para a prossecução de fins públicos no âmbito da jurisdição (do processo) ou, mesmo, da atividade parlamentar desenvolvida no quadro das comissões de inquérito (cfr. o n.º 12). De resto, os dois argumentos fundamentais invocados para justificar o mencionado “desvio” – estar em causa uma decisão do tribunal competente tomada no âmbito de um processo legalmente conformado e a imparcialidade do mesmo tribunal face à resolução do litígio (vide, respetivamente, os n. os 16 e 17 do Acór- dão) – provam demais, na medida em que são igualmente válidos para a generalidade das decisões judiciais. No caso da norma em apreciação no presente processo, são também referidas a colegialidade e a circunstância de tratar de um tribunal superior (vide, de novo, o n.º 17), que, todavia, e por si só, não anulam o facto de a primeira e única decisão sobre o sacrifício de um direito, liberdade e garantia não poder ser contestada pelo respetivo titular perante um outro tribunal, de modo a assegurar um duplo grau de jurisdição. A este propósito, importa desfazer qualquer equívoco a que as formulações do Acórdão eventualmente possam dar azo (vide em especial, os n. os 11, 12 e 17): a confrontação entre os bens jurídicos a realizar pela decisão do tribunal prevista no artigo 135.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, não é antecedida de qual- quer apreciação judicial prévia relativamente ao mesmo objeto; por isso, também inexiste qualquer decisão “provisória” a anteceder tal decisão (que seria assim “definitiva”) – a decisão prevista naquele preceito é, quanto ao sacrifício de um dos bens em confronto, e como referido, a primeira e única. Isso mesmo resulta da descrição do funcionamento do incidente de quebra do segredo profissional feita no n.º 11 do Acórdão, onde, aliás, se reconhece expressamente estar também em causa uma dimensão «do direito fundamental de reserva da vida privada». Por outro lado, também não se compreende a ênfase colocada pela maioria que fez vencimento na cir- cunstância de, no presente caso, o regime legal operar no âmbito do processo civil (e não, no do processo penal), por exemplo, nos n. os 12 (vide o início, segundo parágrafo, e a parte final) e 17 (vide a parte final). Do ponto de vista da aludida jurisprudência constitucional referente ao direito subjetivo (fundamental) ao recurso, esse é um aspeto irrelevante, uma vez que tal jurisprudência afirma, precisamente, a consagração constitucional de tal direito – e, contrariamente ao que por vezes o Acórdão dá a entender, maxime no final do citado n.º 12, é sempre o mesmo direito fundamental ao recurso que está em causa – também fora do âmbito processual penal: «[É] é sustentável que, sendo constitucionalmente assegurado o acesso aos tribunais contra quaisquer atos lesivos dos direitos dos cidadãos ( maxime dos direitos, liberdades e garantias), sejam esses atos provenientes de particulares ou de órgãos do Estado, forçoso é que se garanta o direito à impugnação judicial de atos dos tribunais (sejam eles decisões judiciais ou atuações materiais) que constituam a causa primeira e direta da afetação de tais direitos. Considera-se, pois, que quando uma atuação de um tribunal, por si mesma, afeta, de forma direta, um direito fundamental de um cidadão, mesmo fora da área penal, a este deve ser reconhecido o direito à apreciação judicial dessa situação» (Acórdão n.º 40/08). (De qualquer modo, e diferentemente do que parece ser sugerido no n.º 15, as exigências de descoberta da verdade material, com os meios probatórios próprios reconhecidos no respetivo âmbito, são as mesmas no processo civil e no processo penal…) Dir-se-á mesmo que a colocação dos dois problemas de constitucionalidade identificados, respetiva- mente, nos n. os 12 e 13 do Acórdão, enferma de uma certa inversão: parte-se da análise da verificação da efetividade da tutela jurisdicional para avaliar, em concreto, a necessidade de um recurso; e não, como se imporia a partir da citada jurisprudência constitucional, da análise do plus atribuído à força normativa dos

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