TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 109.º Volume \ 2020
570 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL brir este a essa jurisdição o “[…] confronto de normas de direito comunitário com a lei fundamental do país” (José Manuel M. Cardoso da Costa, A Jurisdição Constitucional em Portugal , 3.ª edição, Coimbra, 2007, pp. 33/34, nota 34). Cessa, pois, neste segundo plano, quantitativamente escasso (estamos a referenciar a ideia de quantidade ao universo do DUE), desde logo quanto ao nível de proteção dos direitos fundamentais (cujo conteúdo e garantia já se encontram amplamente cobertos pelo [Direito da UE], gozando em tal quadro de um nível de proteção funcionalmente equivalente ao propiciado pela jurisdição nacional, concretamente pelo Tribunal Constitucional), esse elemento caraterístico, invariavelmente afirmado pela jurisprudência do TJUE [desde o acórdão Foto-Frost , de 22/10/1987 (proc. 314/85)] traduzido na circunstância da primazia do DUE implicar a exclusividade do controlo da validade deste pelo TJUE [“[a]tribuindo o artigo 173.º [o sentido da referência vale, atualmente, para o artigo 263.º do TFUE] a competência exclusiva ao Tribunal para anular um ato de uma instituição comunitária, a coerência do sistema exige que o poder de declarar a invalidade do mesmo ato, se ela for suscitada perante um órgão jurisdicional nacional, seja igualmente reservada ao Tribu- nal” (parágrafo 17 do acórdão Foto-Frost )]. No quadro de uma compreensão articulada do artigo 8.º, n.º 4, com o n.º 6 do artigo 7.º da CRP, estarão em causa elementos característicos da identidade constitucional da República – com efeito, logo no seu artigo 2.º, a Constituição identifica a República Portuguesa como Estado de direito democrático – que condicio- nam a própria possibilidade de “[…] convencionar o exercício em comum, em cooperação ou pelas institui- ções da União dos poderes necessários à construção e aprofundamento da União Europeia”.» 12. No presente processo, no entanto, a recorrente sustenta que a forma como esse preceito europeu foi interpretado é incorreta. De acordo com esta argumentação, o modelo de tributação adotado assenta em princípios de natu- reza ambiental decorrentes, nomeadamente, do artigo 191.º do TFUE. O objetivo do regime é onerar os contribuintes em função dos custos provocados no ambiente, com base no princípio do poluidor-pagador, levando-os a optar por veículos com menores emissões de dióxido de carbono. Não pretendia, portanto, o legislador restringir a entrada de automóveis usados em Portugal, mas assegurar o respeito pelo ambiente. Defende, assim, que os artigos 110.º e 191.º do TFUE sejam interpretados conjuntamente sob pena de desarmonia entre os objetivos prosseguidos por ambas as normas da UE. Ora, no ordenamento jurídico da União Europeia, criado pelos Estados-Membros através dos Tratados da integração europeia, sempre que uma questão de interpretação do Direito da UE «seja suscitada em processo pendente perante um órgão jurisdicional nacional cujas decisões não sejam suscetíveis de recurso judicial pre- visto no direito interno, esse órgão é obrigado a submeter uma questão» prejudicial aoTribunal de Justiça da UE (TJUE), nos termos do artigo 267.º, 1.º e 3.º parágrafos, do TFUE. Aqui se inclui a decisão sobre a interpreta- ção dos Tratados. Trata-se de uma decorrência da cooperação leal que deve existir entre os tribunais nacionais e os tribunais da União, no âmbito das respetivas jurisdições artigo 4.º, n.º 3, do Tratado da UE (TUE)] e uma manifestação do diálogo e respeito mútuos que devem existir entre estes órgãos jurisdicionais. Não podem subsistir dúvidas sobre o facto de o Tribunal Constitucional se enquadrar na definição de «órgão jurisdicional nacional cujas decisões não [são] suscetíveis de recurso judicial previsto no direito interno». Também é claro que o presente processo implica a determinação da correta interpretação de um dos Tratados da UE, especificamente o TFUE, pelo que o seu objeto está abrangido pelo artigo 267.º, 1.º pará- grafo, alínea a) , do TFUE. Assim sendo, é chegado o momento de o Tribunal Constitucional colocar uma questão prejudicial ao Tribunal de Justiça (órgão competente ao abrigo do artigo 256.º, n.º 3, a contrario , do TFUE) relativa à interpretação do artigo 110.º do TFUE, no contexto do presente processo. D. Colocação de questão prejudicial ao Tribunal de Justiça 13. Tendo decidido colocar uma questão prejudicial ao Tribunal de Justiça, deve o Tribunal Constitu- cional, dentro do espírito de cooperação leal e de diálogo inter-jurisdicional, fornecer a este órgão judicial
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