TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 109.º Volume \ 2020

565 acórdão n.º 711/20 Das «decisões dos tribunais» cabe recurso para o Tribunal Constitucional nos casos previstos no artigo 280.º da Constituição e no artigo 70.º da LTC. O órgão jurisdicional a quo no presente processo é um tribunal arbitral constituído no âmbito do CAAD, ao abrigo do RJAT. Ora, a jurisdição arbitral não é indiferente ao ordenamento jurídico português. A Constituição prevê expressamente, no seu artigo 209.º, n.º 2, a existência de tribunais arbitrais (a par dos tribunais marítimos e dos julgados de paz). Os tribunais arbitrais são, portanto, reconhecidos constitucio- nalmente como uma categoria de tribunais que, nesses termos, co-existe na ordem jurídica da República Portuguesa lado a lado com os tribunais estaduais. Nessa medida, são de aplicar aos tribunais arbitrais as vias de recurso de decisões judiciais para o Tribunal Constitucional previstas na Constituição e na LTC, incluindo a estabelecida na alínea i) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC. É certo que a letra do artigo 25.º, n.º 1, do RJAT refere que a «decisão arbitral sobre o mérito da pretensão deduzida que ponha termo ao processo arbitral é suscetível de recurso para o Tribunal Constitucio- nal na parte em que recuse a aplicação de qualquer norma com fundamento na sua inconstitucionalidade ou que aplique norma cuja inconstitucionalidade tenha sido suscitada». No entanto, a ausência de uma referência expressa à via de recurso prevista na alínea i) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC não pode ser interpretada como restringindo o acesso ao Tribunal Constitucional, nesse contexto. Efetivamente, estando os recursos para o Tribunal Constitucional estabelecidos na Constituição e na LTC, que é uma lei orgânica, com valor reforçado artigo 164.º, alínea c) , e artigo 166.º, n.º 2, da Constituição, nunca poderia o RJAT – que é um decreto-lei autorizado – pretender eliminar uma ou mais dessas vias, sob pena da sua inconstitucionalidade. Assim, o artigo 25.º, n.º 1, RJAT deve ser interpretado, à luz da Constituição, como reafirmando que das decisões arbitrais, como de quaisquer outras decisões judiciais em Portugal, cabe recurso para o Tribunal Constitucional nos ter- mos e condições previstos no artigo 280.º da Constituição e nos artigos 70.º e seguintes da LTC. Aí se inclui, necessariamente, a possibilidade de recurso prevista na alínea i) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC. A recorrida refere um despacho do Tribunal Constitucional que não teria admitido um recurso inter- posto ao abrigo desta alínea do n.º 1 do artigo 70.º da LTC. No âmbito do Proc. n.º 1153/19, tendo sido interposto recurso de constitucionalidade para o Tribunal Constitucional, foi formulado convite à recorrida para «indicar a alínea ao abrigo da qual o recurso é interposto (com referência ao n.º 1 do artigo 70.º da LTC) e, bem assim, a enunciar de modo claro e preciso o sentido normativo e o preceito em que se aloja, cuja conformidade constitucional pretende ver apreciada». É nesse contexto que, face à invocação pela recorrida da alínea i) , o Tribunal, por despacho, refere que essa alínea «não constitui modalidade de recurso de incons- titucionalidade, excedendo-se, nessa parte, a pretensão inscrita na parte final do requerimento de recurso e o convite formulado», e julga o recurso deserto por a recorrente não ter respondido ao convite. Não existiu aqui, portanto, nenhum juízo valorativo de afastamento da invocação da alínea i) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC no contexto de recursos interpostos da jurisdição arbitral fiscal, mas uma referência específica à situação do caso concreto. 7. Neste contexto, a AT recorreu de decisão arbitral tributária, proferida no âmbito do CAAD, invo- cando a alínea i) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC. De acordo com este preceito, cabe recurso para o Tribunal Constitucional de decisões de tribunais que «recusem a aplicação de norma constante de ato legislativo, com fundamento na sua contrariedade com uma convenção internacional, ou a apliquem em desconformidade com o anteriormente decidido sobre a que questão pelo Tribunal Constitucional». Trata-se de uma via de recurso, perante o Tribunal Constitucional, aditada à ordem jurídica portuguesa em 1989, através da altera- ção feita à LTC pela Lei n.º 85/89, de 7 de setembro. Sobre esta questão, no Acórdão n.º 638/17, 2.ª Secção, ponto 7, o Tribunal Constitucional refere que «a alínea i) do artigo 70.º da LCT, (…) visa delimitar a competência do Tribunal Constitucional para apreciar o vício decorrente de eventual colisão entre norma constante de ato legislativo e o direito internacional con- vencional. Trata-se de um recurso interposto de decisões jurisdicionais que recusam a aplicação de atos legis- lativos contrários a convenções internacionais ou que os apliquem em contradição com anterior orientação

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=