TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 109.º Volume \ 2020

506 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL No caso dos autos, a exemplo do que se verifica na jurisprudência anteriormente citada, não está em causa qualquer problema atinente à justificação da exigência processual em causa ou à excessiva onerosidade da mesma. O problema prende-se exclusivamente com as consequências ligadas ao incumprimento do ónus, isto é, prende-se com saber se, no caso de impugnação da matéria de facto por parte do arguido, em que falte a indicação, nas conclusões da motivação do recurso, das menções contidas nas alíneas a) , b) e c) d n.º 3 do artigo 412.º do CPP, pela forma prevista no n.º 4 de tal preceito, o não conhecimento da impugnação quanto àquela matéria e a improcedência do recurso nessa parte, sem que ao recorrente seja dada a oportu- nidade de suprir tal deficiência, mormente ao abrigo do n.º 3 do artigo 417.º do CPP (na redação da Lei n.º 20/2013, de 21 de fevereiro), constitui, ou não, uma consequência desproporcionada. Ora, conforme se viu, em situações semelhantes, a resposta do Tribunal Constitucional a este problema tem sido afirmativa. Com efeito, o entendimento tem sido no sentido de se justificar a formulação de convite ao arguido, antes de se considerar irremediavelmente precludido o direito a ver apreciado o recurso na parte respeitante à impugnação da matéria de facto, por ser essa a solução que garante uma justa e equilibrada ponderação entre o interesse da celeridade, inerente ao processo penal, e a salvaguarda das garantias de defesa e do direito ao recurso, consagrados no artigo 32.º, n.º 1, da Constituição. Em face do exposto, o critério seguido pelos acórdãos recorridos – em especial, no acórdão de 25 de junho de 2019 –, pelas consequências excessivas do efeito drástico associado ao incumprimento do ónus previsto nos n. os 3 e 4 do artigo 412.º do CPP, traduzido no não conhecimento do recurso no que respeita à impugnação da matéria de facto, consubstancia uma violação do princípio da proporcionalidade, na medida em que implica um condicionamento excessivo das garantias de defesa do arguido, no que tange em parti- cular ao direito ao recurso das decisões penais condenatórias. Acresce que, no caso sub iudicio , não se verifica o específico circunstancialismo que motivou os juízos de não inconstitucionalidade constantes dos Acórdãos n. os 259/02 e 140/04 e, mais recentemente, do Acórdão n.º 660/14, em que se decidiu «não julgar inconstitucional a norma do artigo 412.º, n. os 3 e 4, do [CPP], interpretada no sentido de que a falta, na motivação e nas conclusões de recurso em que se impugne matéria de facto, da especificação nele exigida tem como efeito o não conhecimento desta matéria e a improcedência do recurso, sem que ao recorrente seja dada oportunidade de suprir tais deficiências» (itálico acrescentado) Assim, sendo transponíveis para o caso dos autos os fundamentos dos juízos positivos de inconstitucionali- dade constantes dos referidos Acórdãos n. os 529/03, 405/04, 357/06 e, em particular, o do Acórdão n.º 322/04, importa formular aqui, a pari ratione , idêntico juízo. Deste modo, conclui-se pela inconstitucionalidade da interpretação normativa sindicada, porquanto a mesma implica uma desproporcionada restrição do direito à defesa do arguido, na dimensão do direito ao recurso, consagrado pelo artigo 32.º, n.º 1, da Constituição, com a consequente procedência do recurso interposto ao abrigo da alínea g) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC. III – Decisão Pelo exposto, decide-se: a) Não tomar conhecimento do recurso interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional; b) Julgar inconstitucional, por violação do artigo 32.º, n.º 1, da Constituição da República Portu- guesa, a norma constante dos n. os 3 e 4 do artigo 412.º do Código de Processo Penal segundo a qual a falta de indicação, nas conclusões da motivação do recurso em que o arguido impugne a decisão sobre a matéria de facto, das menções contidas nas alíneas a) , b) e c) daquele n.º 3, pela forma pre- vista no referido n.º 4, tem como efeito o não conhecimento da impugnação daquela matéria e a improcedência do recurso nessa parte, sem que ao recorrente seja dada a oportunidade de suprir tal deficiência; e, consequentemente,

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