TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 109.º Volume \ 2020

492 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Sem prejuízo de se reiterar a conhecida jurisprudência em matéria de “decisões surpresa”, seja quanto ao dever de litigância diligente e de prudência técnica das partes (que implica o ónus de analisarem as diversas possibilidades interpretativas suscetíveis de virem a ser aplicadas na decisão: vide por exemplo, os Acórdãos n. os 261/02, 115/05, 14/06 e 148/08, todos acessíveis, assim como os demais adiante citados, a partir da ligação http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/ ), seja quanto às condições de inexigibilidade do cum- primento do ónus de suscitação prévia (verificação, em concreto, de que a parte não poderia razoavelmente antecipar o problema de inconstitucionalidade em causa, designadamente por ser confrontada com uma aplicação de norma ou interpretação normativa que se apresenta objetivamente como imprevisível e ines- perada: como referido no Acórdão n.º 182/10, casos em que «a mobilização da norma haja sido “insólita” e “imprevisível”, sendo então desrazoável e inadequado exigir ao interessado um prévio juízo de prognose rela- tivo à sua aplicação, suscitando desde logo a questão de inconstitucionalidade (Acórdãos n. os 61/92, 569/95, 79/02 e 120/02)»), a verdade é que não é isso que sucede no caso dos autos. A verdade é que, contrariamente ao que alega, o recorrente não suscitou a inconstitucionalidade junto do tribunal a quo no primeiro momento processual em que dispôs da oportunidade de confrontar aquela instância com tal questão, ou seja, no requerimento em que arguiu a nulidade do acórdão de 25 de junho de 2019. Não o tendo feito, e tendo suscitado a referida questão apenas no requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional, inexiste fundamento para que se considere o recorrente dispensado do ónus de suscitação prévia da inconstitucionalidade, faltando-lhe, por isso, a legitimidade para a interpo- sição do presente recurso quanto a esta questão (cfr. o artigo 72.º, n.º 2, da LTC). E a mesma omissão também determina a ilegitimidade do recorrente para interpor o recurso de consti- tucionalidade do acórdão de 11 de dezembro de 2019 com base no disposto no artigo 70.º, n.º 1, alínea b, da LTC. 7.2. Com efeito, embora o recorrente refira que, no requerimento em que arguiu a nulidade do acórdão de 25 de junho de 2019 do Tribunal da Relação de Lisboa, suscitou a inconstitucionalidade das normas ora sindicadas (cfr. as conclusões BB, CC e HH das suas alegações), a verdade é que não o fez em termos proces- sualmente adequados, desde logo, porque nem sequer identificou as normas em causa. Nessa peça processual, e conforme o próprio recorrente transcreve na conclusão HH das suas alegações, a única referência a uma questão de constitucionalidade é a que consta do artigo 17.º da mencionada reclamação: «Assim não se entendendo, fica inequivocamente obliterado o núcleo essencial do direito ao recurso enquanto garantia de defesa em processo criminal, consagrado no art.º 32.º n.º 1 da Constituição porquanto, imotivada- mente, se nega ao Recorrente a plena apreciação dos fundamentos que o mesmo legitimamente carreou para a instância de recurso.» Pretende o recorrente que deste enunciado resulta que as normas por si consideradas inconstitucio- nais «são aquelas que, imotivadamente, lhe negam a plena apreciação dos fundamentos que legitimamente carreou para a Instância de Recurso» e que tais normas «apenas podem ser as normas constantes do n.º 3 e do n.º 4 do art.º 412.º do Código de Processo Penal, que o Tribunal da Relação de Lisboa no seu acórdão proferido em 25 de junho interpreta no sentido de que, mesmo que o Recorrente indique todas as menções constantes de tais artigos na sua motivação de Recurso, pode, ainda assim, o Tribunal não reapreciar, nem tão pouco ter em conta a prova testemunhal gravada em audiência de julgamento, que no entender do Recorrente deveria ser reapreciada» (cfr. ibidem , as conclusões II e JJ). Até porque, remata, «da leitura da Reclamação do Recorrente não é possível retirar outra conclusão» (cfr. ibidem , conclusão KK). Não lhe assiste razão. Conforme este Tribunal tem entendido, «[s]uscitar a inconstitucionalidade de uma norma jurídica é fazê-lo de modo tal que o tribunal perante o qual a questão é colocada saiba que tem uma questão de cons- titucionalidade determinada para decidir. Isto reclama, obviamente, que – como já se disse – tal se faça

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