TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 109.º Volume \ 2020

467 acórdão n.º 659/20 Ora, será que ao determinar o prosseguimento da sua normal atividade, a empresa arguida terá acautelado esta preocupação? Sobretudo quando foi ela própria, por sua iniciativa, que comunicou os factos à ACT, nos termos do artigo 9.º, n.º 1, do Decreto-Lei 324/95, nessa medida aceitando, implicitamente, o carácter grave do acidente verificado? 29.º Acresce, que a digna magistrada judicial parece ter esquecido, enquanto magistrada da jurisdição laboral, os objetivos prosseguidos, pelas Diretivas n. os 92/91/CEE, de 3 de novembro e 92/104/CEE, de 3 de dezembro, bem como pelo Decreto-Lei 324/95, ou seja, assegurar as prescrições mínimas para a proteção da segurança e da saúde dos trabalhadores das indústrias extractivas por perfuração, a céu aberto ou subterrâneas. Sendo certo que a comunicação de acidentes de particular gravidade à ACT, a que a empresa arguida, aliás, procedeu, tem, justamente, por preocupação, a necessidade de evitar o desaparecimento de vestígios de condutas não conformes com a legislação em vigor, em relação a casos em que a segurança e a saúde dos trabalhadores este- jam em maior risco. 30.º Assim, em vez de recorrer à experiência comum ou a conhecimentos científicos e técnicos do ramo, ou à pon- deração dos riscos próprios da atividade da empresa arguida, como muito bem refere a magistrada recorrida, que, no caso sub judice , levou ao esmagamento de um trabalhador, a mesma magistrada, para decidir a questão que lhe foi colocada, preferiu a originalidade, legítima, aliás, de recusa de uma norma por inconstitucionalidade material, no seguimento da jurisprudência deste Tribunal Constitucional a propósito, porém, de norma bastante diferente, objeto do Acórdão 76/16, de 3 de fevereiro (Relator: Conselheiro Lino Ribeiro). O mesmo Acórdão concluiu, com efeito, pela inconstitucionalidade material da norma do artigo 257.º, n.º 1, da Lei n.º 35/2004, de 29 de julho, que aprovou a Regulamentação do Código do Trabalho e cuja redação era a seguinte: “1. Sem prejuízo de outras notificações previstas em legislação especial, o empregador deve comunicar à Inspeção-Geral do Trabalho os acidentes mortais ou que evidenciem uma situação particularmente grave, nas vinte e quatro horas seguintes à ocorrência.” Ora, é coisa substancialmente diferente a existência de uma tal norma num Regulamento do Código do Tra- balho, que é de âmbito genérico e se aplica, por esse motivo, a qualquer atividade profissional, e o Decreto-Lei 324/95, que se aplica exclusivamente às prescrições mínimas de segurança e saúde no trabalho a aplicar nas indús- trias extractivas por perfuração a céu aberto e subterrâneas, de âmbito muito mais restrito. Sublinhe-se, aliás, para melhor clarificação da posição defendida pelo signatário nos presentes autos, que no processo que levou à prolação do referido Acórdão 76/16, o Ministério Público se pronunciou também no sentido da não inconstitucionalidade da referida norma. 31.º Por seu lado, o Acórdão 825/17, de 12 de dezembro (Relatora: Conselheira Fátima Mata-Mouros), veio con- siderar, na esteira do Acórdão 76/16, inconstitucional a norma que estabelece que constitui contraordenação grave a violação do dever do empregador comunicar, à Autoridade para as Condições do Trabalho, os acidentes que “evidenciem uma situação particularmente grave, nas vinte e quatro horas a seguir à ocorrência”, decorrente da interpretação do artigo 111.º, n. os 1 e 3, da Lei n.º 102/2009, de 10 de setembro, na redação original. Ora, também nos referidos autos, o Ministério Público apresentou alegações em sentido diferente do então decidido pelo Tribunal Constitucional, tendo referido, nas respetivas conclusões (destaques do signatário):

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=