TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 109.º Volume \ 2020
456 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Entende a recorrente que o STJ se encontrava vinculado pela Constituição a dirigir-lhe um convite ao aperfei- çoamento das alegações de recurso, no sentido da junção da cópia do acórdão-fundamento. Sobre a existência e o sentido de tal vinculação, pode ler-se o seguinte no Acórdão n.º 642/16: “[…] O Tribunal Constitucional tem reiteradamente afirmado na sua jurisprudência que o direito ao processo, conjugado com o direito à tutela jurisdicional efetiva, impõe que se atribua prevalência à justiça material sobre a justiça formal, evitando-se soluções que, devido à exigência de cumprimento de «requisitos processuais», conduzam a uma decisão que, bem vistas as coisas, se poderá traduzir numa verdadeira denegação de justiça. Concretamente, no que respeita a esta matéria, o Tribunal tem entendido que não existe um genérico direito à obtenção de um despacho de aperfeiçoamento (cfr., neste sentido o Acórdão n.º 259/02) e que o convite ao aperfei- çoamento de peças processuais deficientes não significa que beneficie de tutela constitucional um genérico, irrestrito e ilimitado “direito” das partes à obtenção de um sistemático convite ao aperfeiçoamento de todas e quaisquer deficiên- cias dos atos por elas praticados em juízo. Acresce que, como decorre também da jurisprudência do Tribunal (concretamente, dos Acórdãos n. os 259/02 e 374/00), o convite ao aperfeiçoamento tem sentido e justificação quando as deficiências em causa forem de natureza estritamente formal ou secundária , dizendo respeito à “apresentação” ou “formulação”, mas não ao conteúdo, concludência ou inteligibilidade da própria alegação ou motivação produzida. Assim, o convite ao aperfeiçoamento de deficiências formais não pode ser instrumentalizado pelo respetivo destinatário, de forma a per- mitir-lhe, de modo enviesado, obter um novo prazo para, reformulando substancialmente a pretensão ou impugnação que optou por deduzir, obter um prazo processual adicional para alterar o objeto do pedido ou impugnação deduzida, só então cumprindo os ónus que a lei de processo justificadamente coloca a seu cargo. Por outro lado, o Tribunal também já entendeu que o convite ao aperfeiçoamento não será constitucio- nalmente exigível nos casos em que a deficiência formal se deva a um “erro manifestamente indesculpável do recorrente” (cfr. Acórdão n.º 184/04). Relativamente ao regime processual dos recursos, o Tribunal Constitucional tem entendido que o legisla- dor tem uma ampla liberdade de conformação no que respeita ao estabelecimento, em cada ramo processual, das respetivas regras, desde que tais regras não signifiquem a imposição de ónus de tal forma injustificados ou desproporcionados que acabem por importar lesão da garantia de acesso à justiça e aos tribunais (cfr., entre outros, o Acórdão n.º 299/93). […] [A] esse respeito, o Tribunal tem reiteradamente afirmado que da sua jurisprudência não pode retirar-se «uma exigência constitucional geral de convite para aperfeiçoamento, sempre que o recorrente não tenha, por exemplo, apresentado motivação, ou todos ou parte dos fundamentos possíveis da motivação (e que, portanto, o vício seja substancial, e não apenas formal). E ainda, por outro lado, que o legislador processual pode definir os requisitos adjetivos para o exercício do direito ao recurso, incluindo o cumprimento de certos ónus ou for- malidades que não sejam desproporcionados e visem uma finalidade processualmente adequada, sem que tal definição viole o direito ao recurso constitucionalmente consagrado» (cfr., Acórdão n.º 140/04). Daí que, mesmo no domínio processual penal e contraordenacional, o Tribunal Constitucional distinga dois tipos de situações. Nos casos em que as omissões, insuficiências ou deficiências em causa ocorrem não apenas nas conclusões do requerimento recurso, mas também na respetiva motivação, o Tribunal Constitucional tem formulado juízos negativos de inconstitucionalidade em relação a interpretações normativas no sentido de que, em tais circunstâncias, não deverá ser conhecida a matéria em questão, improcedendo o recurso, sem que ao recorrente seja dada a oportunidade de suprir tais deficiências. É o caso, por exemplo, dos Acórdãos n. os 259/02, 140/04 e 660/14, em que o Tribunal não julgou inconstitucional a norma constante do artigo 412.º, n. os 3 e 4, do CPP, quando interpretada no sentido de que a falta de indicação, na motivação e nas conclusões de recurso em que se impugne matéria de facto, das menções aí exigidas, tem como efeito o não conhecimento dessa
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