TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 109.º Volume \ 2020
454 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL ação judicial, mas também a garantia de que o processo, uma vez iniciado, deve seguir as regras de um processo equitativo, conforme impõe o n.º 4, do referido artigo 20.º da Constituição. A expressão constitucional um processo equitativo é premeditadamente aberta, estando dotada de uma força expansiva que lhe permite alcançar aqueles casos, como o presente, em que o incumprimento de um ónus imprevisível é sancionado com a perda definitiva de um importante direito processual, como é o direito ao recurso (vide, neste sentido, Lopes do Rego, na ob. cit. , pp. 846-849). Aliás o Tribunal Constitucional em situações semelhantes não tem deixado de intervir, recorrendo quer a este parâmetro constitucional quer ao princípio da proteção da confiança, imanente a um Estado de direito democrático (artigo 2.º da Constituição), como ocorreu nos Acórdãos n.º 431/02 e 213 /12 (acessíveis no site www.tribunalcons- titucional.pt ). Por estas razões deve o recurso ser julgado procedente. […]” (itálicos acrescentados). 2.4.1. O juízo de censura decorrente do Acórdão n.º 620/13 – posteriormente reafirmado, com idêntica fun- damentação, pelos Acórdãos n. os 325/14, 548/14, 588/14, 195/15 e 218/15 e pelas Decisões Sumárias n. os 564/13 e 747/13 e, ainda, em relação a ónus paralelo extraído dos artigos 687.º, n. os 1 e 4, e 754.º, n.º 2, do CPC, quanto ao agravo em segunda instância, pelo Acórdão n.º 506/14 – não pode, sem mais, ser transposto para a norma ques- tionada nos presentes autos, já que, lidos os fundamentos supratranscritos, resultam evidentes diferenças relevantes entre ambos os processos. A primeira prende-se com o ónus em causa: tratava-se, no caso do Acórdão n.º 620/13, de juntar certidão do acórdão-fundamento; trata-se, no caso presente, de juntar simples cópia dessa decisão. A segunda diz respeito à falta de previsão legal expressa do ónus com o sentido que lhe foi dado pelo tribunal recorrido – isto é, com o sentido de ser necessário juntar uma certidão e não apenas cópia do acórdão-fundamento. Não é essa a hipótese deste processo, em que a exigência do tribunal recorrido – junção de cópia – encontra cor- respondência no teor literal do preceito em causa. Unindo as duas hipóteses, para além da uma certa proximidade dos ónus a cargo do Recorrente, está a conse- quência do respetivo incumprimento: a imediata rejeição do recurso, ainda assim com uma diferença: tal conse- quência não se encontrava expressamente prevista no artigo 721.º-A do CPC, na redação emergente do Decreto- -Lei n.º 303/2007, de 24 de agosto, mas encontra-se expressamente prevista no artigo 637.º, n.º 2, do CPC atual, posto em crise nos presentes autos. Certo é que uma das razões principais em que se funda o juízo de inconstitucionalidade afirmado no Acórdão n.º 620/13 – referimo-nos à existência de “[…] um ónus imprevisto, perante a letra de lei, e por isso de difícil cumprimento pelas partes” – não tem cabimento face à norma contida nos artigos 14.º, n.º 1, do CIRE e 637.º, n.º 2, do CPC. Vejamos, pois, se essas diferenças conduzem a um juízo também ele diverso. 2.5. É abundante a jurisprudência constitucional relacionada com a imposição de ónus processuais às partes em processo civil. Como se assinala, designadamente, no Acórdão n.º 96/16 (na linha de muitos outros no mesmo sentido, nomeadamente, desde então, os Acórdãos n. os 277/16, 486/16, 527/16, 270/18, 604/18 e 440/19): “[…] A questão em causa nos autos enquadra-se num conjunto vasto de casos, que o Tribunal já foi chamado a apreciar, em que é imposto um ónus processual às partes (…) e em que a lei prevê uma determinada cominação ou consequência processual para o incumprimento de tal ónus (…). Ora, a respeito das exigências decorrentes da garantia constitucional de acesso ao direito e à justiça, quando estejam em causa normas que impõem ónus processuais, o Tribunal tem afirmado que tal garantia não afasta a liberdade de conformação do legislador na concreta estruturação do processo, não sendo incompatível com a imposição de ónus processuais às partes (cfr., neste sentido, entre outros, por exemplo, os Acórdãos n. os 122/02 e 46/05).
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