TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 109.º Volume \ 2020

419 acórdão n.º 638/20 De acordo com essa jurisprudência, para que haja lugar à tutela jurídico-constitucional da confiança é necessário: em primeiro lugar, que as expectativas de estabilidade do regime jurídico em causa tenham sido induzidas por com- portamentos dos poderes públicos; que elas sejam legítimas, ou seja, fundadas em boas razões, a avaliar no quadro axiológico jurídico-constitucional; por fim, o cidadão deve ter orientado a sua vida e feito opções, precisamente, com base em expectativas de manutenção do quadro jurídico. Dados por verificados esses requisitos cumulativos, há que proceder a um balanceamento ou ponderação entre os interesses particulares desfavoravelmente afetados pela alteração do quadro normativo que os regula e o interesse público que justifica essa alteração. Com efeito, para que a situação de confiança seja constitucionalmente protegida, é ainda necessário que não ocorram razões de interesse público que justifiquem, em ponderação, a não continuidade do comportamento que gerou a situação de expectativa (Acórdãos n. os 287/90, 128/09, 399/10, 396/11, 353/12, 187/13, 474/13, 602/13, 794/13 e 862/13).» Os princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança são, de resto, conforme relembra a decisão recorrida plenamente assumidos também pelo direito da União Europeia, enquanto limite à atua- ção dos poderes públicos. Na verdade, «[q]uanto ao princípio da proteção da confiança legítima, resulta de jurisprudência constante do Tribunal de Justiça que a possibilidade de invocar este último é reconhecida a qualquer operador económico em relação ao qual a autoridade nacional tenha feito surgir esperanças funda- das. Todavia, quando um operador económico prudente e avisado esteja em condições de prever a adoção de uma medida suscetível de afetar os seus interesses, não poderá invocar o benefício de tal princípio, quando essa medida for adotada. Além disso, os operadores económicos não têm fundamento para depositar a sua confiança legítima na manutenção de uma situação existente que pode ser alterada no quadro do poder de apreciação das autoridades nacionais.» (vide o acórdão de 11 de julho de 2019, Agrenergy Srl , processos C-180/18, C-286/18 e C-287/18, n.º 31, e em termos idênticos o acórdão de 10 de setembro de 2009, Plantanol , C-201/08, n.º 53). Mas a este respeito, tem o Tribunal de Justiça da União Europeia reconhecido também que «os princí- pios gerais da segurança jurídica e da proteção da confiança legítima não se opõem, em princípio, a que um Estado-Membro (…) suprima, antes da data de extinção prevista inicialmente pela regulamentação nacional, o regime de isenção fiscal que era aplicável (…).» (cfr. o citado acórdão de 10 de setembro de 2009, Planta- nol , n.º 68). A jurisprudência dos tribunais da União Europeia admite, pois, que sejam devidamente sopesadas todas as circunstâncias e comportamentos aptos a consolidar, ou pelo contrário a debilitar, as expetativas dos ope- radores económicos prudentes e avisados atingidos por alterações legislativas, tais como a circunstância de os benefícios fiscais deterem caráter temporário – caso em que, tal como vem reconhecendo este Tribunal, é particularmente justificada a expetativa de que o regime jurídico que o consagra vigore até ao termo do prazo previsto (neste sentido, vide, entre outros, os Acórdãos deste Tribunal n. os  410/95 e 309/18); mas também a mutabilidade inerente aos regimes que concretizam opções políticas em certos domínios estratégicos. Assim, por exemplo, estando em causa uma situação de confiança depositada na atuação das instituições da própria União, admitiu o Tribunal Geral que «os operadores económicos não têm fundamento para depositar a sua confiança legítima na manutenção de uma situação existente que pode ser alterada no quadro do poder de apreciação das instituições da União, em especial num domínio como o da política monetária, cujo objetivo implica uma constante adaptação em função das variações da situação económica (…).» (cfr. o n.º 76 do acórdão de 7 de outubro de 2015, Alessandro Accorinti e o. , processo T-19/2013). 25. Segundo a jurisprudência estável deste Tribunal, a imposição constitucional de proteger a con- fiança legitimamente depositada na estabilidade de um determinado regime jurídico é aferível em concreto mediante a realização dos seguintes testes: em primeiro lugar, é necessário que o Estado (mormente o legis- lador) tenha encetado comportamentos capazes de gerar nos privados «expetativas» de continuidade; depois, importa essas expetativas sejam legítimas e fundadas em razões atendíveis à luz do ordenamento jurídico- -constitucional; em terceiro lugar, devem os privados ter feito planos de vida tendo em conta a perspetiva

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