TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 109.º Volume \ 2020

414 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL recurso, não apenas diverge do enunciado que consta do requerimento de interposição do recurso (cfr. supra o n.º 4), como não coincide rigorosamente com a interpretação normativa adotada, como ratio decidendi , pelo tribunal a quo, já que este recusou, como se referiu já, reconhecer a existência de qualquer presunção subjacente aos preceitos legais interpretados. Resta, em face do exposto, concluir que, também quanto às questões colocadas a respeito dos n. os 3 a 6 do artigo 88.º do CIRC, não pode ser conhecido o objeto do recurso interposto pela AT. B. Do mérito do recurso 21. Em face do exposto, cumpre apenas apreciar o objeto do recurso interposto pelo Ministério Público, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, tal como delimitado supra – o qual, relembre-se, é constituído pelo artigo 210.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro, quando interpretado no sentido de não admitir, em consequência da revogação do artigo 32.º, n.º 2, do Estatuto dos Benefícios Fiscais, a dedução dos encargos financeiros suportados pelas SGPS com a aquisição de partes de capital ao abrigo desse regime, de que ainda fossem titulares em 31 de dezembro de 2013. Tal como resulta da decisão recorrida, entendeu o tribunal a quo que a revogação do regime anterior- mente em vigor foi repentina e imprevisível e, não tendo sido acompanhada da adoção de qualquer regime transitório, ofendeu as expetativas legítimas das SGPS, «na medida em que essa revogação suporta (…) a impossibilidade de consideração fiscal de gastos financeiros cuja não-dedução atempada teve por base a exis- tência no futuro da mencionada isenção» (cfr. o n.º 25 da parte III.C.2.7). Além disso, entendeu o tribunal recorrido que a norma em causa contende com os princípios da igual- dade e da capacidade contributiva, bem como com o princípio constitucional da tributação das empresas pelo rendimento real, consagrado no artigo 104.º, n.º 2, da Constituição. Vejamos. 22. O artigo 32.º, n.º 2, do EBF – que correspondia ao artigo 31.º, na redação anterior à republicação pelo Decreto-Lei n.º 108/2008, de 26 de junho –, dispunha, na redação vigente à data em que foi revogado (dada pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro), o seguinte: Artigo 32.º Sociedades gestoras de participações sociais (SGPS) (…) 2 – As mais-valias e as menos-valias realizadas pelas SGPS de partes de capital de que sejam titulares, desde que detidas por período não inferior a um ano, e, bem assim, os encargos financeiros suportados com a sua aquisição não concorrem para a formação do lucro tributável destas sociedades. (…)» O artigo 210.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro, revogou este preceito sem mais, com efeitos a 1 de janeiro de 2014 (artigo 260.º da Lei n.º 83-C/2013), não sendo possível encontrar no Relatório que acompanha a proposta de Orçamento do Estado para 2014 qualquer menção específica a esta alteração. Todavia, nesse documento encontra-se já referência à iminente reforma do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442-B/88, de 30 de novembro, adiante designado «CIRC»), esclarecendo-se que a captação de investimento estrangeiro, tida como essencial para potenciar o crescimento económico do país, seria uma prioridade. Afirma-se a tal propósito nesse Relatório: «Os fatores fiscais não são os únicos a determinar a decisão de investimento. Contudo, uma reforma pro- funda e abrangente do IRC (a par das outras reformas estruturais aprovadas por este Governo) desempenha um papel decisivo no aumento da competitividade da economia portuguesa e na afirmação de Portugal

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