TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 109.º Volume \ 2020
394 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL face da absoluta inexistência de norma legal que o preveja, de materialmente inconstitucional, por violação do princípio do Estado de Direito democrático, da reserva da lei fiscal, e da separação de poderes, com a consequente subordinação dos tribunais à lei, os quais decorrem, nomeadamente, do disposto nos arts. 2.º, 103.º, 165.º e 202.º da CRP. liv. Com efeito, o Tribunal arbitral adotou uma interpretação normativa que atinge de forma flagrante os princípios da legalidade e da tipicidade tributárias, em clara violação do art. 103.º, n.º 2 da CRP. lv. Do princípio da igualdade decorre, quanto à matéria tributária, o princípio da distribuição igualitária dos encargos tributários, segundo a capacidade contributiva demonstrada. lvi. Quanto à questão das tributações autónomas, o Tribunal Arbitral concluiu, em suma, que a prova da afetação exclusivamente empresarial da utilização das viaturas afasta a tributação autónoma prevista no art. 88.º do CIRC, mesmo em situações diversas das aí expressamente excluídas da incidência da tributação autónoma; lvii. Considerando que tal interpretação é a única compatível com a legalidade e não inconstitucionalidade das tributações autónomas – cfr., maxime , alíneas 7) e 34) do ponto III.C.3 do acórdão, assim desaplicando a interpretação normativa literal, qual seja, de que só estão fora da incidência de tributação autónoma as situações expressamente excluídas pelo legislador, com fundamento em inconstitucionalidade. lviii. Por outro lado, aplicou o Tribunal uma interpretação normativa da norma atualmente constante do art. 88.º do CIRC como permitindo o afastamento da incidência de tributações autónomas quando se considere haver o sujeito passivo logrado a prova da sua afetação integralmente empresarial. lix. Conforme se sustentou na resposta ao pedido de pronúncia arbitral, as normas que estabelecem tributações autónomas, sendo indubitavelmente normas de incidência tributária, não consagram uma presunção cuja prova em contrário deva ser admitida. lx. De facto, a motivação que está na origem das tributações autónomas sobre as viaturas e as despesas de representação não tem subjacente uma presunção de não empresarialidade integral dos gastos, porquanto, se a realização dos gastos não se inscrevesse no interesse geral da empresa, não seria sequer aceite a sua dedutibilidade, por falta de preenchimento do requisito da indispensabilidade plasmado no n.º 1 do art.º 23.º do Código do IRC. lxi. A norma em causa, o artigo 88.º, n.º 3 a 6 do CIRC, não tratou de presumir um determinado montante a ser tributado a título de encargos com viaturas ligeiras de passageiros ou mistas, nem tratou de presumir a respetiva base tributável do facto tributário, tendo antes se limitado a elencar realidades a que resolveu dar relevância sob o ponto de vista da tributação, evidenciados em certas despesas eleitas pelo legislador e incorridas pelas pessoas coletivas, alvo de incidência das tributações autónomas. lxii. O artigo 88.º, n.º 3 a 6 do CIRC, não contém nenhuma presunção de empresarialidade parcial, não aludindo, em lado algum da redação da norma, que a tributação autónoma apenas incida sobre os gastos aí elencados quando os mesmos sejam incorridos em fins alheios aos que prosseguem o respetivo escopo social. lxiii. Assim, mal andou o Tribunal Arbitral ao concluir que a prova da afetação exclusivamente empresarial da utilização das viaturas afasta a tributação autónoma prevista no art. 88.º do CIRC, mesmo em situações diversas das aí expressamente excluídas da incidência da tributação autónoma, lxiv. Designadamente porque a lei prevê a tributação autónoma de determinadas atuações empresariais, tendo «ínsita a ideia de desmotivar uma prática que, para além de afetar a igualdade na repartição de encargos públicos, poderá envolver situações de menor transparência fiscal, e é explicada por uma intenção legisla- tiva de estimular as empresas a reduzirem tanto quanto possível as despesas que afetem negativamente a receita fiscal» – cfr. Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 197/2016, de 13 de abril. lxv. Ademais, como se expende no Acórdão n.º 139/16, desse Tribunal Constitucional, de 8.03.2016, tirado no proc. 927/15: «o legislador tributário goza, em princípio, de discricionariedade normativo-constitutiva quanto à eleição dos factos reveladores de capacidade contributiva que podem ser elevados à categoria de factos tributários, bem como à definição dos elementos que concorrem para se definir a matéria coletável”,
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