TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 109.º Volume \ 2020

393 acórdão n.º 638/20 fazendo equivaler a revogação a uma revogação ex tunc da componente do regime constante do art. 32.º do EBF que obrigava à desconsideração dos encargos financeiros, portanto reportada ao início de aplicação do mesmo regime. xliii. Ora, de acordo com o que supra se disse sobre o regime especial das SGPS constante do art. 32.º, n.º 2 do EBF, entende a AT, com o devido respeito, que mal andou o Tribunal quando assim decidiu, resultando totalmente infundamentada a decisão do Tribunal recorrido quando permitiu a dedução de uma só vez, no exercício de 2014, dos encargos financeiros acrescidos nos exercícios de 2003 a 2013. xliv. Com efeito, a não dedutibilidade dos encargos financeiros estava sempre associada à isenção das mais-valias que, por sua vez, se encontrava a sujeita a condicionalidades que, em última instância, redundavam no decurso de um período de tempo mínimo (1 ano ou 3 anos), ou seja, se as partes sociais fossem alienadas antes do cumprimento desse prazo, as mais-valias estariam sujeitas ao regime geral de tributação e os encargos financeiros seriam dedutíveis, desde que observadas as regras gerais de dedutibilidade dos gastos e perdas. xlv. E quanto à eventual incerteza sobre a realização de mais-valia e, consequentemente, da sua isenção, bem como sobre a dissociação temporal entre a não dedução (imediata) dos encargos financeiros e isenção (futura) de tributação de mais-valias, o Acórdão n.º 42/14 pronunciou-se no sentido de que este procedi- mento não constituía violação do princípio constante do n.º 2 do artigo 104.º da Constituição. xlvi. Assim, de igual modo que o regime especial, na parte em que desconsiderava os encargos financeiros, passou a aplicar-se aos gastos suportados em 2003 (1.º exercício de aplicação) mesmo que decorrentes de financiamentos contraídos em exercícios anteriores – sem que o TC, no acórdão n.º 42/2014, tivesse considerado existir qualquer tipo de retroatividade ou tivesse sido lesado o princípio da tutela da confiança legítima –, xlvii. também, simetricamente, só os gastos financeiros suportados em 2014 e exercícios seguintes, ainda que decorrentes de financiamentos contraídos em exercícios anteriores, por força dos critérios que regem a imputação temporal dos gastos (n.º 1 do art.º 18.º do Código do IRC) são abrangidos pelas regras gerais de dedutibilidade dos gastos previstas nos artigos 23.º e 67.º do mesmo CIRC. xlviii. O que equivale a dizer que tal seria apenas no momento da alienação das participações sociais e nunca em 2014. xlix. A interpretação, rectius , integração da lei fiscal, nos termos decididos pelo Tribunal arbitral, atenta, pois, contra os princípios da certeza e segurança jurídica e da igualdade entre todos os cidadãos, bem como contra o princípio da legalidade. l. A recorrente não pode ainda conformar-se com a decisão arbitral, por entender que a mesma assenta numa interpretação manifestamente contrária à CRP, sendo que a inconstitucionalidade de tal interpretação foi expressamente suscitada e defendida pela ora Recorrente, então Requerida, nos termos que culminam nos arts. 129.º a 131.º da Resposta apresentada aos autos de pronúncia arbitral, muito embora tal questão não tenha sido objeto de apreciação expressa pelo Tribunal Arbitral. li. De facto, conforme consta da Resposta apresentada no processo arbitral, reputa-se como materialmente inconstitucional a interpretação normativa proposta pela requerente, no sentido de ser permitida a dedução dos encargos financeiros incorridos entre 2003 e 2013 – portanto, na vigência do art. 32.º do EBF – ao lucro tributável de 2014, em face da absoluta inexistência de norma legal que o preveja, por violação do princípio da legalidade tributária. lii. Bem assim, reputa-se tal interpretação normativa de materialmente inconstitucional, também por violação do princípio da legalidade tributária, na vertente da generalidade e abstração da lei fiscal, decorrentes do princípio da legalidade e enquanto instrumentos da igualdade fiscal, e portanto, igualmente por violação do princípio da igualdade tributária, os quais decorrem, nomeadamente, do disposto no art. 13.º e no art. 103.º da CRP. liii. Por fim, reputa-se ainda tal interpretação normativa, qual seja, a de permitir a dedução dos encargos finan- ceiros incorridos entre 2003 e 2013, na vigência do art. 32.º do EBF, ao lucro tributável de 2014, e em

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