TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 109.º Volume \ 2020

369 acórdão n.º 606/20 152.º A questão foi pois colocada de forma a sustentar a “inidoneidade” do recurso constitucional, quando na reali- dade, do que se trata, é de controlar a forma como os preceitos ordinários foram aplicados e se o respetivo critério de aplicação se compagina, ou não, com o princípio da presunção de inocência. 153.º É que, bem vistas as coisas, a impossibilidade de invocação da questão com referência ao caso concreto, não inculca numa imputação de inconstitucionalidade direta por violação daquele princípio, mas sim, sempre, na abs- trata interpretação da norma ordinária que deu lugar “àquela” decisão concreta. Por outro lado, 154.º O Tribunal Constitucional, para (poder) exercer um efetivo juízo de constitucionalidade que lhe permita veri- ficar o cumprimento dos princípios estruturantes do processo penal que a Constituição impõe, tem de (poder) ir mais longe. 155.º Se o Tribunal Constitucional está impedido de censurar a decisão, com vista ao juízo de constitucionalidade sobre o respeito pelo princípio da ampla defesa, quando a convicção do Tribunal se funde em prova indireta ou em juízo de livre apreciação, sempre que o Tribunal a quo fundamente – ainda que por uma aparência de funda- mentação – tal decisão, sem poder controlar a efetiva subsunção desse iter motivatório, então a função de controlo é apenas aparente. 156.º E isso nada tem a ver com o facto de o Tribunal Constitucional não controlar o mérito da decisão; Tem sim a ver com o facto de só cumprir a sua função quando possa verificar se tal mérito respeita pressupostos mínimos de índole constitucional. 157.º A motivação de uma convicção estribada no referido processo lógico presuntivo, impõe, pois, a conjugação de todos os indícios factuais constitutivos do tipo de crime, no sentido da sua conformidade com as regras da lógica, os conhecimentos científicos e as máximas da experiência crítica: a prova indiciária é uma prova de probabilidades e é a soma das probabilidades que se verifica em relação a cada facto indiciado que determinará a certeza. 158.º Todavia, a transposição da soma de probabilidades que dá a convergência dos factos indiciados para a certeza sobre o facto, ou factos probandos, que consubstanciam a responsabilidade criminal do agente é uma operação em que a lógica se interliga com o domínio da livre convicção do juiz. 159.º A força da prova indiciária prende-se com a certeza do indício, a força do raciocínio inferencial, o grau de probabilidade da inferência efetuada e a gravidade da presunção resultante. 160.º Para que seja possível a condenação é imprescindível que, por procedimentos legítimos, se alcance a certeza jurídica, que não é desde logo a certeza absoluta, mas que, sendo uma convicção com génese em material proba- tório, é suficiente para, numa perspetiva processual penal e constitucional, legitimar uma sentença condenatória.

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