TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 109.º Volume \ 2020
352 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 56.º O artigo 271.º do Código de Processo Penal viu o seu âmbito alargado pelas revisões operadas pelas Leis n. os 59/98, de 25 de agosto, e 48/2007, de 29 de agosto. 57.º A primeira, precisamente, passou a permitir a prestação de declarações para memória futura às vítimas de cri- mes sexuais, mesmo que não existisse motivo que levasse a temer que elas não pudessem ser ouvidas em julgamento. 58.º A Lei n.º 48/2007, de 29/08, aditou aos crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual, designação que passou a adaptar, o crime de tráfico de pessoas, tendo tornado obrigatória, quanto aos primeiros, a tomada de declarações para memória futura desde que a vítima ainda fosse menor. […] 60.º O princípio consagrado no n.º 1 do artigo 355.º do Código de Processo Penal […] continua vigente no nosso sistema processual penal, não obstante o alargamento das permissões de leitura operado pelas sucessivas leis que procederam à revisão daquele diploma. 61.º Aí se consagra com largueza o respeito pelos princípios da imediação, da oralidade, do contraditório e, indire- tamente, da publicidade. 62.º Acrescentou-se mesmo a exigência que da ata constasse «a indicação de todas as provas produzidas ou exami- nadas em audiência» – artigo 362.º, n.º 1, alínea d) –, exigência que passou a acrescer à que já constava do agora no n.º 9 do artigo 356.º e no n.º 3 do artigo 357.º, de que «[a] permissão de uma leitura e a sua justificação legal fica[ssem] a constar da ata, sob pena de nulidade». 63.º Será, portanto, todo este quadro normativo que deve ser convocado para a resolução da questão. […] 65.º Para que um procedimento de estrutura acusatória seja leal e justo torna-se necessário, para além do mais, que a delimitação das provas que irão ser valoradas pelo tribunal no momento em que deliberar sobre a matéria de facto seja perfeitamente clara para os sujeitos processuais envolvidos. 66.º Ora, dispondo o n.º 9 do artigo 356.º do Código que a permissão de leitura e a sua justificação legal deve ficar a constar da ata, sob pena de nulidade, estando a valoração das declarações para memória futura dependente do juízo que o tribunal vier a fazer sobre a necessidade dessa prova (juízo que tem necessariamente em consideração a restante prova produzida) e não se encontrando sequer expressamente prevista a existência de qualquer despacho sobre a admissibilidade da prova indicada pelo Ministério Público na acusação (nem a prática consagrando um tal despacho), não se pode deixar de concluir que, para poderem ser valoradas em julgamento, as declarações para memória futura devem ser indicadas como prova na acusação (e no despacho de pronúncia, se existir), devendo o tribunal, em audiência, pronunciar-se sobre a necessidade da sua valoração e determinando, consequentemente, a sua leitura, ficando tudo isto a constar da ata.
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