TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 109.º Volume \ 2020
344 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL não pode ser penalmente condenado com base em abstrações e generalidades» (cfr. conclusão kk) do recurso inter- posto para aquele tribunal). E acrescenta que, «[a]tendendo aos atos materiais que, para esse efeito relevam, temos que não há relato nos factos provados de a Ofendida ter manifestado, por gestos ou palavras, qualquer recusa, inexistindo factualidade capaz de permitir a conclusão de o Arguido ter logrado concretizar o coito – seja oral, seja anal – por recurso à violência, em termos de atingir o objetivo de superar a resistência da vítima e para a tornar indefesa, inexistindo aliás relato de resistência» [cfr. conclusão ll), ibidem ]. Mais uma vez, o recorrente pretende que este Tribunal esclareça e determine se as circunstâncias concretas em causa (isto é, os factos dados provados nos autos) são subsumíveis a tal previsão legal, designadamente se se confirma a sua perspetiva sobre os factos provados, no sentido de não ter existido a violência exigida pelo tipo legal em causa (é, de novo, a questão de saber se tais factos preenchem o conceito de constrangimento previsto no tipo objetivo). Daí a conclusão pela inidoneidade do objeto do recurso quanto a esta questão. Refira-se ainda, por fim, que mesmo que a presente questão tivesse por base um critério normativo de decisão, sempre seria de concluir que o mesmo não foi adotado pelo tribunal a quo, enquanto ratio decidendi , o que, tam- bém por esta razão, levaria a que o recurso não pudesse ser conhecido nesta parte. Com efeito, em momento algum o tribunal a quo entendeu que, no caso, «a falta de vontade da ofendida» (depreende-se que o recorrente se refira à ausência de qualquer manifestação da ofendida no sentido de opor à atuação do arguido, ora recorrente), baste para o preenchimento do tipo legal de crime em causa. Aquele tribunal apreciou o conjunto dos factos provados e considerou que houve uma conduta de imposição do arguido, que con- substanciou violência adequada a impedir a resistência da ofendida (cfr. pp. 53 a 55 do acórdão de 12 de junho de 2019, a fls. 403-404), tendo sido no contexto de toda a factualidade provada que foi analisada a ausência de resis- tência física da vítima e que se concluiu que tal não poderia ser entendido como consentimento por parte desta. Assim, também por esta razão – a inutilidade do recurso – sempre seria de não conhecer do respetivo mérito quanto a esta questão.». 3. O reclamante não se conforma com o assim decidido, procurando na presente reclamação refutar as razões em que se fundou a decisão reclamada, quer no que respeita às questões em que tomou conhecimento do mérito do recurso, quer em relação a algumas das questões que concluiu pela não verificação dos pressu- postos de conhecimento do recurso de constitucionalidade (cfr. fls. 665). O Ministério Público, ora reclamado, pronunciou-se no sentido do indeferimento da reclamação (cfr. fls. 712-721). Cumpre apreciar e decidir. II – Fundamentação 4. A decisão reclamada, no que respeita ao primeiro recurso de constitucionalidade – interposto do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 12 de junho de 2019 –, quanto à primeira e à terceira ques- tões de constitucionalidade negou provimento ao recurso, no termos do artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC, por as questões em causa se apresentarem como simples, face à existência de jurisprudência anterior do Tribunal Constitucional, que se considerou ser transponível para o caso dos autos. Relativamente à segunda e quarta questões de constitucionalidade, a decisão reclamada não tomou conhecimento do recurso, atenta a inido- neidade do seu objeto. Quanto ao segundo recurso de constitucionalidade – interposto na sequência da notificação ao recor- rente do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 30 de outubro de 2019 –, a decisão reclamada enten- deu que, caso o seu objeto formal seja este acórdão, o recurso de constitucionalidade é inútil, relativamente às sete questões que integram o seu objeto, uma vez que o tribunal a quo, em tal decisão, não aplicou, enquanto ratio decidendi da sua pronúncia, qualquer dos preceitos a que se reportam tais questões.
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