TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 109.º Volume \ 2020

336 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL é superada por uma presunção de sinal oposto prevalecente, não havendo lugar a uma situação de dúvida que deva ser resolvida a favor do Réu. Se, no caso concreto, houve lugar à utilização de presunções sem a necessária credibilidade ou consistência é uma questão que o Tribunal Constitucional não tem competência para avaliar. Mas, no entender do recorrente, a norma do artigo 127.º do Código de Processo Penal, na interpretação que lhe foi dada pela decisão recorrida, seria ainda inconstitucional, por violação “dos princípios do Estado de direito democrático, da vinculação à Lei e da fundamentação das decisões dos tribunais, consagrados respetiva- mente nos artigos 2.º, 203.º e 205.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa”. O que está em causa na questão de constitucionalidade suscitada no presente recurso é, essencialmente, a alegada violação da exigência constitucional de fundamentação das decisões judiciais, consagrada no art. 205.º, n.º 1, da Constituição, o qual determina que “as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei”. [Como anteriormente referido], constitucionalmente é exigível que na fundamentação seja visível uma racionalização dos motivos da decisão, revelando-se às partes e à comunidade o conhecimento das razões que subjazem ao concreto juízo decisório, devendo, para isso, a fundamentação revelar uma aptidão comunicativa na exteriorização das premissas que presidem à sua conclusão, assim como o respetivo juízo de valoração, de modo a transmitir, como condição de inteligibilidade, a intrínseca validade substancial do decidido. Ora, tendo em consideração as características acima apontadas à utilização de presunções judiciais, verifica- -se que a prova indireta ou por presunções assenta num processo lógico de inferência que não pode ser enten- dido como uma operação puramente subjetiva, emocional e imotivável, mas sim como uma valoração racional e crítica, de acordo com as regras comuns da lógica, da razão, das máximas da experiência e dos conhecimentos científicos, que permita ao julgador objetivar a apreciação dos factos e proceder a uma efetiva motivação da decisão. Daí que a utilização de presunções judiciais não seja incompatível com o dever de fundamentação das decisões judiciais, antes exigindo uma explicação mais rigorosa que seja claramente explicitadora do processo lógico que lhe é inerente. Se no caso concreto o rigor exigível foi ou não observado já é uma questão que excede as competências do Tribunal Constitucional. Por estas razões se conclui que a interpretação da norma constante do artigo 127.º do Código de Processo Penal, na interpretação de que a apreciação da prova segundo as regras da experiência e a livre convicção do julgador permite o recurso a presunções judiciais em processo penal não viola qualquer parâmetro constitu- cional.». Posteriormente, no Acórdão n.º 521/18, este Tribunal foi chamado a pronunciar-se sobre dimensão normativa semelhante, extraída do artigo 125.º do CPP, tendo concluído que tal preceito, na interpretação de que a prova indiciária e a prova por presunções judiciais são admissíveis em direito penal e em direito processual penal, não viola os princípios da presunção de inocência e da estrutura acusatória do processo penal, consagrados nos n. os 2 e 5 do artigo 32.º da Constituição. No que respeita à alegada violação do princípio da presunção de inocência, este aresto, depois de reiterar a argumentação do Acórdão n.º 391/15, acrescenta ainda o seguinte: «Ao contrário do que afirma o recorrente nas suas alegações, o juízo firmado no citado aresto, a propósito da admissibilidade constitucional do recurso a presunções judiciais em processo penal, não está delimitado às fases processuais do inquérito ou da instrução, valendo antes para todas as fases, nomeadamente para o julga- mento. Assim é porque, no plano probatório, o que distingue essas fases não é o universo dos meios de prova que podem ser considerados para a formação da convicção subjacente às decisões finais que os encerram. É o estalão probatório exigido em cada uma delas que é radicalmente diferente nas fases de inquérito e instrução, por um lado, e na fase de julgamento, por outro.

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