TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 109.º Volume \ 2020

309 acórdão n.º 603/20 T) Ora, in casu , o Tribunal Arbitral recorrido interpretou a al. b) do n.º 1 do art. 91.º do CIRC, num sentido incompatível com os próprios critérios interpretativos, dado que estes, pela sua letra, mas sobretudo pelo seu espírito, reclamam o resultado inverso. A dimensão normativa encontrada pelo Tribunal Arbitral viola, pois, o princípio da tipicidade tributária. U) Efetivamente, a solução legislativa consagrada pelo legislador do Código do IRC, está balizada pelo respeito da autonomia financeira dos municípios e pelas regras de cálculo da derrama municipal constantes do artigo 18.º da Lei n.º 73/2013, tendo sido salvaguardado, quer no n.º 2 do artigo 90.º, quer no n.º 1 do artigo 910 do mesmo Código que a receita do IRC apenas pode ser amputada por deduções concedidas, seja a título de eliminação da tributação jurídica internacional, seja de benefícios fiscais ou deduções de outra natureza. V) Assim, ao estabelecer um sentido normativo que não tem acolhimento na norma legislativa que pretensamen- te é interpretada, está-se, a final, a derrogá-la e a criar norma jurídica inovatória inválida. W) Admitir-se, como o faz o Acórdão arbitral recorrido, que a derrama municipal entre para o cômputo da fração do IRC, com base na fórmula apresentada na alínea b) do n.º 1 do artigo 91.º do Código do IRC, quando inexiste uma convenção para evitar a dupla tributação celebrada entre Portugal e o Estado da fonte dos rendimentos, não tem suporte na lei nem se coaduna com o regime de autonomia financeira das autarquias consagrado no art. 238.º da CRP. X) Mais, além de constituir uma violação do estatuído naqueles normativos legais, teria como consequência que, não prevendo a Lei de Finanças Locais uma redução, a este título, da receita da derrama, a parte da dedução do imposto pago no estrangeiro correspondentente à derrama municipal teria forçosamente de ser imputada à receita do IRC, efeito que o legislador não desejou e nem resulta da lei. Por outro lado, ainda, Y) A interpretação feita pelo tribunal recorrido é também violadora do princípio da legalidade, cfr. artigos 3.º, n.º 2, 202.º e 203.º da CRP e ainda o artigo 266.º, n.º 2, da CRP, designadamente, no seu corolário do princípio da indisponibilidade dos créditos tributários ínsito no artigo 30.º, n.º 2 da LGT . Z) A indisponibilidade dos créditos tributários impõe-se à própria AT e a todos os particulares e não pode ser afastada por vontade das partes ou de terceiros, sendo decorrência directa dos fundamentais princípios da legalidade e igualdade tributárias, os quais encontram guarida nos artigos 266.º, 13.º, 103.º e 104.º, todos da CRP, sendo assim aplicáveis ao processo sub judice . AA) Por conseguinte, face a uma interpretação da expressão “fração do IRC” constante da alínea b) do n.º 1 do artigo 91.º do Código do IRC, que nela inclua a derrama municipal, estar-se-á a violar também o princípio da indisponibilidade do crédito tributário, e consequentemente, os princípios da legalidade e da igualdade tributária.» 2.2. A recorrida contra-alegou, concluindo do seguinte modo: « i. As questões decidendas a. A redação da alínea b) do n.º 1 do artigo 91.º do Código do IRC é inconstitucional na interpretação segundo a qual a derrama municipal integra o cálculo da “fração do IRC”, para efeitos de eliminar ou atenuar a dupla tributação jurídica internacional, independentemente de os rendimentos serem obtidos em países com os quais Portugal não celebrou uma CDT, porquanto viola o princípio da igualdade (artigo 13.º da CRP)? b. A redação da alínea b) do n.º 1 do artigo 91.º do Código do IRC é inconstitucional na interpretação segundo a qual a derrama municipal integra o cálculo da “fração do IRC”, para efeitos de eliminar ou atenuar a dupla tributação jurídica internacional, independentemente de os rendimentos serem obtidos em países com os quais Portugal não celebrou uma CDT, porquanto viola o princípio da legalidade fiscal (artigo 103, n.º 2, da CRP) e viola o princípio da legalidade administrativa, no seu corolário do princípio da indisponibilidade dos créditos (artigo 266.º, n.º 2, da CRP)?

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