TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 109.º Volume \ 2020

296 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL que estivessem presentes na audiência de leitura de sentença (a mais de na de discussão e julgamento) estariam na mesma posição de “desigualdade” em relação aos faltosos. Ora, a aceitar-se existir um benefício para os ausentes, como se invocou, haveria um ainda maior “prejuízo” para os arguidos inteiramente cumpridores (porque sempre presentes em tribunal). O que chama a atenção para o fundamento da diferença de regime, que é materialmente justificada: estando presentes na altura da leitura da sentença o arguido ou o seu representante, é logo possível perspetivar a conduta a adotar quanto à decisão de que se inteiraram. Estando ambos ausentes não o é, e daí o dife- rimento temporal até à efetiva notificação. Resulta da Lei n.º 59/98 que, para tal determinação da conduta processual subsequente, basta que esteja presente um defensor do arguido, seja este constituído por ele ou nomeado para a sua defesa ou para o ato. E resulta do Acórdão n.º 59/99 que só é assim desde que esteja presente o seu representante primitivo, seja ele nomeado ou constituído. Não se pode considerar, pois, que, em matéria de recurso, haja uma desigualdade que não decorra da própria diferença de situações e não seja materialmente justificada por esta. 7. Considerou-se, depois, que o arguido não presente na audiência de leitura da sentença vê “correr contra si o prazo de recurso de cujo início não teve qualquer conhecimento”. Porém, mesmo que se admita que os tribunais podem vir a adotar essa interpretação – o que, em todo o caso, não compete ao Tribunal Constitucional antecipar –, a implicação que se pretende extrair não se afigura correta, na medida em que, estando o arguido devidamente representado na audiência, o início do prazo se pode presumir do seu conhecimento, a coberto dos deveres de representação, e na medida em que, em todo o caso, ao ser, como foi, notificado da data da leitura da sentença, logo se haveria de ter por ciente do momento do seu início, mesmo sem a adequada representação no ato. O que é dizer que também se não corrobora o diagnóstico quanto às limitações do direito de recurso – independentemente de saber se, no caso concreto, face aos factos confessados e à pena aplicada, este poderia trazer alterações substanciais. 8. Por fim, o argumento de que “o arguido não toma conhecimento pessoal em momento algum da censura penal resultante da condenação e, designadamente, dos termos condicionais em que lhe é concedido o perdão” só poderia valer se se desconsiderassem os deveres funcionais e deontológicos que impendem sobre o defensor do arguido, como, corretamente, se sublinhou nos citados Acórdãos n. os 59/99 e 109/99. E isto, acrescente-se agora, apenas se se considerasse que o arguido, ciente que estava de ter praticado um facto punível – de resto, no caso concreto, confessado –, e de que a sentença seria proferida em data determinada, revelava em relação a esta indiferença. Porém, mesmo somadas estas duas condições, ainda daí não resultaria uma violação das garantias de defesa consti- tucionalmente consagradas, porque delas não resulta que a inércia e a indiferença perante as decisões judiciais possam ser transformadas em vantagens. Como escreveu o Ministério Público neste Tribunal: «É evidente que, no caso ora em apreciação, o arguido sabia perfeitamente em que data exata iria ocorrer a leitura da sentença, já que, no termo da audiência de julgamento em que esteve presente, foi notificado da data em que viria [a] ocorrer a leitura da sentença – ao contrário do que ocorre com a leitura do acórdão no Tribunal Superior, em que (...) o arguido não tem (sem a efetiva colaboração do defensor) conhecimento da data em que tal decisão é publicitada. Ora, neste circunstancialismo, discorda-se inteiramente da argumentação expendida na decisão recorrida, já que o arguido dispôs de plena oportunidade para ter acesso à decisão condenatória contra si proferida, bas- tando que diligenciasse contactar, logo de seguida à data em que bem sabia que tal decisão iria ser proferida, quer o seu defensor (que bem conhecia) quer a própria secretaria judicial. O hipotético e eventual desconhecimento do exato teor da sentença só poderá radicar, neste circunstancialismo, numa grosseira negligência do próprio arguido, que bem sabendo que, em certa data, ia ser publicitada (e lhe era plenamente acessível) o teor de tal sentença, se desinteressou totalmente (e injustificadamente) do sentido e conteúdo da mesma.» Ora esta eventual negligência e desinteresse não merece, certamente, tutela ao abrigo das garantias de defesa reconhecidas ao arguido. […]” (itálicos acrescentados).

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=