TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 109.º Volume \ 2020

284 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 3 – Se não tiver sido prestada caução económica, o arguido pode pagar voluntariamente o montante referido no número anterior nos 10 dias subsequentes ao trânsito em julgado da sentença, extinguindo-se o arresto com esse paga- mento. A alteração introduzida em 2017 é irrelevante para a particular questão normativa em discussão, dei- xando-se, todavia, consignado que se trata, in casu , da redação original da Lei n.º 5/2002, de 11 de janeiro. 2.3.1. Ao regime da Lei n.º 5/2002, de 11 de janeiro, tem sido dedicada crescente atenção, seja pelos desafios de análise e classificação doutrinárias que suscita, seja pelo cruzamento com regras e objetivos de âmbito europeu (cfr., entre outros, João Conde Correia, Da proibição do confisco à perda alargada, Lisboa, 2012, Pedro Caeiro, “O confisco numa perspetiva de política criminal europeia”, in O novo regime de recu- peração de ativos à luz da diretiva 2014/42/EU e da lei que a transpôs, Lisboa, 2018, pp. 21 e seguintes, José Manuel Damião da Cunha, Medidas de Combate à Criminalidade Organizada e Económico-Financeira / A Lei n.º 5/2002, de 11 de janeiro de 2002 , Lisboa, 2017, Maria do Carmo Saraiva de Menezes da Silva Dias, “«Perda alargada» prevista na Diretiva 2014/42/UE (artigo 5.º) e «perda do valor de vantagem de atividade criminosa» prevista na Lei n.º 5/2002 (artigos 7.º a 12.º)”, in O novo regime de recuperação de ativos à luz da diretiva 2014/42/EU e da lei que a transpô s, cit., pp. 85 e seguintes, Duarte Alberto Rodrigues Nunes, “Reflexões acerca da transposição da Diretiva 2014/42/UE em matéria de confisco «alargado» de vantagens provenientes da prática de crimes”, in O novo regime de recuperação de ativos à luz da diretiva 2014/42/EU e da lei que a transpôs , cit., pp. 119 e seguintes). O referido regime foi objeto de extensa análise no Acórdão n.º 392/15, no qual se decidiu não julgar inconstitucionais as normas constantes dos artigos 7.º e 9.º, n. os 1, 2 e 3, daquele diploma. Da fundamen- tação da decisão destacamos, com utilidade para o caso presente, e desde logo, sobre o enquadramento geral do identificado regime, as seguintes passagens: “[…] Este regime legal enquadra-se na problemática mais geral da perda de coisas e direitos relacionados com a prática de um ilícito criminal, previsto, em termos gerais, no Capítulo IX do Código Penal, intitulado «Perda de instrumentos, produtos e vantagens», onde se encontra regulada a «Perda de instrumentos ou produtos» (artigos 109.º e 110.º) bem como a «Perda de vantagens» (artigo 111.º). Neste regime normativo de âmbito geral prevê-se que os objetos que tenham servido ou que se destinassem a servir para a prática de factos ilícitos (instrumentos do crime), bem como os que forem produzidos em resultado de tais factos (produtos do crime), sejam declarados perdidos a favor do Estado, uma vez verificados determinados pressupostos (cfr. artigos 109.º e 110.º). Este tipo de medidas tem como fundamento razões de índole preventiva, visando impedir que tais instrumentos ou produtos possam ser utilizados para a prática de novos ilícitos ou que, atenta a sua perigosidade, possam colocar em causa a segurança das pessoas ou da ordem pública. Prevê-se ainda a perda das vantagens decorrentes da prática de factos ilícitos (cfr. artigo 111.º do Código Penal), medida esta que tem como finalidade subtrair ao arguido (ou a terceiros) os proventos obtidos em resulta da prática de factos ilícitos típicos. A doutrina tem apontado, como fundamento político-criminal deste regime de perda de vantagens, finalidades preventivas (quer de prevenção geral, quer de prevenção especial) considerando que, ao procurar colocar o arguido na situação patrimonial em que estaria se não tivesse praticado determinado ilícito, subtraindo as vantagens resul- tantes do mesmo, se visa demonstrar que «o crime não compensa», ideia que é reafirmada «tanto sobre o concreto agente do ilícito-típico (prevenção especial ou individual), como nos seus reflexos sobre a sociedade no seu todo (prevenção geral), mas sem que neste último aspeto deixe de caber o reflexo da providência ao nível do reforço da vigência da norma (prevenção geral positiva ou de prevenção)» (Cfr., Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal Português – As consequências jurídicas do crime, Aequitas – Editorial Notícias, 1993, p. 632). No entanto, além destas finalidades preventivas, a este regime também está subjacente uma necessidade de restauração da ordem

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