TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 109.º Volume \ 2020

283 acórdão n.º 595/20 Não obstante a limitação das questões a discutir, corretamente assinalada pelo Ministério Público, o certo é que, na hipótese de o recurso ser julgado procedente, o tribunal recorrido ficaria vinculado a afastar a norma com o sentido de que a notificação não tem de ser realizada na pessoa do arguido, prefigurando-se, então, a possibilidade de ser determinada a notificação do arguido, na sua pessoa (ainda que na morada do TIR), para realizar o depósito que determinaria a extinção do arresto. A esta luz, há que afirmar que a utilidade do recurso se revela de forma suficientemente consistente na possibilidade de, em rigor, ver aberta no processo uma nova oportunidade para adotar um comportamento apto a evitar a perda dos bens. 2.2. Quanto ao objeto do recurso, cumpre notar que ele não visa, propriamente, uma questão normativa que passe pela necessidade ou não de realizar a notificação prevista no artigo 12.º, n.º 3, da Lei n.º 5/2002, de 11 de janeiro. Tendo essa notificação sido efetivamente realizada, os termos do recurso interposto para o Tribunal da Relação do Porto pelo arguido, que conduziu à decisão recorrida, centraram o problema na forma a adotar nessa notificação. A decisão recorrida, embora tenha usado como argumento prévio a desne- cessidade da notificação, foi ciente de que esse ponto estava ultrapassado, pelo circunstancialismo criado pela notificação – “indulgente” (cfr. item 1.1,5., supra ) – e, assim, deu resposta ao objeto do recurso, negando a pretendida invalidade, ao afirmar que “[…] a referida notificação não poderia, em caso algum, integrar o elenco de natureza taxativa das notificações que obrigatoriamente devem ser efetuadas ao arguido e descritas no artigo 113.º, n.º 10, do Código de Processo Penal. Neste sentido não se verifica, rigorosamente, qualquer nulidade processual, nomeadamente aquela prevista no artigo 119.º, alínea c) , do Código de Processo Penal”. Resulta, assim, afirmado o sentido normativo segundo o qual, uma vez realizada a notificação para o pagamento, independentemente de ser devida essa notificação e mesmo depois de esgotado o prazo previsto no artigo 12.º, n.º 3, da referida lei, tal notificação não tem de ser realizada na pessoa do arguido, bastando que o seja na pessoa do advogado que o representa. 2.3. O preceito do qual emerge a norma questionada nos presentes autos – que integra a Lei n.º 5/2002, de 11 de janeiro, que estabelece medidas de combate à criminalidade organizada e económico-financeira – tem, atualmente, a seguinte redação (decorrente de alterações introduzidas pela Lei n.º 30/2017, de 30 de maio): Artigo 12.º Declaração de perda 1 – Na sentença condenatória, o tribunal declara o valor que deve ser perdido a favor do Estado, nos termos do artigo 7.º 2 – Se este valor for inferior ao dos bens arrestados ou à caução prestada, são um ou outro reduzidos até esse montante. 3 – Se não tiver sido prestada caução económica ou esta não for suficiente, o arguido pode pagar voluntariamente o montante referido no número anterior, ou o valor remanescente, nos 10 dias subsequentes ao trânsito em julgado da sentença, extinguindo-se o arresto com esse pagamento. 4 – Não se verificando o pagamento, são perdidos a favor do Estado os bens arrestados. 5 – Não havendo bens arrestados ou não sendo suficiente o seu valor para liquidar esse montante, havendo outros bens disponíveis, o Ministério Público instaura execução. (ênfase acrescentado). A decisão recorrida (cfr. fls. 224) parece, todavia, referir-se à redação original do preceito, anterior à referida alteração, que não continha o n.º 5 e cujo n.º 3 tinha o seguinte teor:

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