TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 109.º Volume \ 2020
263 acórdão n.º 594/20 pré-constituído a interpretação do direito infraconstitucional alcançada pelo douto tribunal a quo , considerá-la desconforme com a Constituição da República Portuguesa. 52. Na verdade, ao considerarmos que, conforme decorre da interpretação normativa desaplicada nos presentes autos, se admite que, no âmbito de um processo sancionatório, o arguido possa ser condenado sem que, previa- mente, lhe seja reconhecido o direito de ser ouvido e de se pronunciar sobre as imputações que lhe são dirigidas, defrontamo-nos, necessariamente, com uma flagrante violação do disposto no n.º 10, do artigo 32.º, da Consti- tuição da República Portuguesa. 53. Ou seja, ainda que se possa discutir se outros direitos que são assegurados pela Constituição aos arguidos em processo criminal são, igualmente, reconhecidos aos arguidos noutros processos sancionatórios, parece-nos indubitável que, ao menos no que concerne aos direitos de audiência e defesa, estes lhes são expressamente assegu- rados, por força do consagrado no artigo 32.º, n.º 10, da Constituição da República Portuguesa. 54. Consequentemente, por força do exposto, se atentarmos no teor da interpretação normativa do direito infraconstitucional desaplicada pelo tribunal a quo , no sentido de que o disposto no artigo 214.º do Regulamento Disciplinar da Liga Portuguesa de Futebol Profissional, não admite a audiência do arguido em momento anterior ao da edição do respetivo ato punitivo, só poderemos concluir que a mesma se revela violadora do princípio cons- titucional plasmado no n.º 10, do artigo 32.º, da Constituição da República Portuguesa, a saber, o do direito de audiência e defesa em quaisquer processos sancionatórios. 55. Distintamente do que acabamos de sustentar, a norma contida no artigo 13.º, alínea f ) , do Regulamento Disciplinar da Liga Portuguesa de Futebol Profissional, interpretada no sentido de conter uma presunção inilidível da veracidade dos factos constantes dos relatórios dos árbitros e do delegado da Liga, não se nos afigura que viole qualquer princípio ou regra constitucional. 56. Na verdade, a norma contida no mencionado artigo 13.º, alínea f ) , do Regulamento Disciplinar da Liga Portuguesa de Futebol Profissional, que define a força probatória dos relatórios dos árbitros e dos delegados da Liga, não determina, só por si, que dos factos contidos nesses documentos se extraiam, por via de quaisquer pre- sunções inilidíveis, factos desconhecidos cuja veracidade se revele incontestável. 57. Tal suposta incontestabilidade factual, a reconhecer-se, apenas poderá ser imputada à, anteriormente apre- ciada, violação do direito de audiência e defesa plasmado no n.º 10, do artigo 32.º, da Constituição da República Portuguesa, cuja inconstitucionalidade radica na interpretação normativa do artigo 214.º do Regulamento Disci- plinar da Liga Portuguesa de Futebol Profissional, também efetuada pelo douto tribunal a quo , no sentido da não admissão da audiência do arguido em momento anterior ao da edição do respetivo ato punitivo. 58. Isto é, a norma ínsita no artigo 13.º, alínea f ) , do Regulamento Disciplinar da Liga Portuguesa de Futebol Profissional, não apresenta, por si, qualquer dimensão de desconformidade constitucional, muito embora possa conduzir (assim como numerosas outras normas infraconstitucionais) quando aplicável no mesmo contexto pro- cessual da norma contida no artigo 214.º do Regulamento Disciplinar das Competições Organizadas pela Liga de Portugal, a resultados lesantes da Constituição. 59. Por força do exposto, e nesta parte, concluímos que, no que concerne à interpretação normativa do pres- crito no artigo 13.º, alínea f ) , do Regulamento Disciplinar das Competições Organizadas pela Liga de Portugal, da Liga Portuguesa de Futebol Profissional, não se nos afigura que a mesma se revele violadora de quaisquer princípios ou regras constitucionais, nomeadamente dos contidos nos artigos 32.º, n. os 2 e 10; e 20.º, n. os 1 e 4, da Consti- tuição da República Portuguesa. 60. Dito isto, atento tudo o que ficou explanado, entende o recorrente que, em primeira linha, não deverá o Tribunal Constitucional tomar conhecimento do objeto do presente recurso ou, caso assim se não venha a enten- der, o que se admite sem conceder, deverá este mesmo Tribunal julgar materialmente inconstitucional a norma ínsita no “artigo 214.º do Regulamento Disciplinar das Competições Organizadas pela Liga de Portugal, da Liga Portuguesa de Futebol Profissional, na parte em que suprime a audiência do arguido em momento anterior ao da edição do respetivo ato punitivo”, não julgando, por outro lado, inconstitucional a “norma plasmada no artigo 13.º, alínea f ) , do citado Regulamento Disciplinar das Competições Organizadas pela Liga de Portugal na medida
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