TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 109.º Volume \ 2020

260 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL de aplicar uma sanção disciplinar sem que esta seja precedida da faculdade de exercício do direito de audiência pelo arguido, extraível do artigo 214.º do RD-LPF; a norma a sindicar é a consagração, no procedimento disciplinar sumário, da presunção inilidível da veracidade dos factos constantes dos relató- rios dos árbitros e do delegado da Liga, que resulta da interpretação conjugada do artigo 13.º, alínea  f ) , com o artigo 214.º, ambos do RD-LPF, pelo que o resultado da apreciação da conformidade constitu- cional da segunda norma estará necessariamente dependente da apreciação da primeira questão. III – Como se reconhece no artigo 32.º, n.º 10, da Constituição, os direitos de audiência – de ser efeti- vamente ouvido antes do decretamento da sanção –, e defesa – de apresentar a sua versão dos factos, juntar meios de prova e requerer a realização de diligências – constituem uma dimensão essencial tanto do processo criminal como dos processos de contraordenação como, finalmente, também de todos os processos sancionatórios; exigindo o n.º 10 do artigo 32.º da Constituição que o arguido nos processos sancionatórios não-penais ali referidos seja previamente ouvido e possa defender-se das imputações que lhe sejam feitas, apresentando meios de prova, requerendo a realização de diligências com vista ao apuramento da verdade dos factos e alegando as suas razões, imperioso será concluir que uma norma que permita a aplicação de qualquer tipo de sanção disciplinar sem que o arguido seja previamente ouvido e possa defender-se das imputações que lhe são feitas se apresenta necessariamen- te como violadora da Constituição. IV – O processo sumário regulado no RD-LPF é um processo disciplinar; visa punir o ilícito disciplinar com uma sanção disciplinar, tendo natureza sancionatória, encontrando-se abrangido, nessa medida, pelo âmbito de aplicação do n.º 10 do artigo 32.º da Constituição; assim, a norma do referido Regu- lamento, que suprime o direito de audiência no âmbito do processo disciplinar sumário, contraria flagrantemente o disposto no artigo 32.º, n.º 10, da Constituição, concluindo-se pela inconstitucio- nalidade material da norma que estabelece a possibilidade de aplicar uma sanção disciplinar no âmbito do processo sumário sem que esta seja precedida da faculdade de exercício do direito de audiência pelo arguido, extraível do artigo 214.º do RD-LPF. V – Uma apreciação positiva de inconstitucionalidade da primeira norma torna a segunda norma insub- sistente, conduzindo à inutilidade da apreciação da sua conformidade constitucional; com efeito, o artigo 13.º, alínea  f ) , do RD-LPF ao definir a força probatória dos relatórios dos árbitros e dos delega- dos da Liga, não determina, por si só, que dos factos contidos nesses documentos se extraiam, por via de presunções inilidíveis, factos desconhecidos cuja veracidade se revele incontestável; o arguido terá, regra geral, a possibilidade de ilidir a presunção, designadamente por prova em contrário, através do exercício dos seus direitos de audiência e de defesa. VI – No entanto, o artigo 214.º do RD-LPF vem admitir a aplicação de uma sanção disciplinar sem que esta seja precedida da faculdade de exercício do direito de audiência pelo arguido – o que torna vir- tualmente impossível o afastamento da presunção; por conseguinte, a incontestabilidade dos factos constantes dos relatórios dos árbitros e dos delegados da Liga, a verificar-se, apenas pode ser imputada à não admissão da audiência do arguido em momento anterior ao da edição do respetivo ato punitivo; a natureza inilidível da presunção assenta na impossibilidade de os factos serem contraditados antes da produção do ato punitivo porque o arguido não podia ser previamente ouvido sobre os factos imputa- dos; nesse âmbito, a norma do artigo 13.º, alínea  f ) , apenas suscita problemas de conformidade com a Constituição quando aplicada no contexto do procedimento disciplinar sumário, por virtude da exceção ressalvada na primeira parte da norma contida no artigo 214.º do RD-LPF.

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