TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 109.º Volume \ 2020
236 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 13. Quanto às questões identificadas em i) e ii) , considera o reclamante que o fundamento invocado na decisão reclamada não é de fácil compreensão. Por outras palavras, entende o reclamante que, ao concluir pela inutilidade do julgamento do recurso com base no facto de o tribunal a quo, na medida em que excluiu do thema decidendum todas as questões prévias suscitadas pelos recorrentes, não ter chegado sequer a pronun- ciar-se sobre a aplicabilidade «em audiência de reformulação do cúmulo do artigo 420.º, n.º 2, do CVM, na redação dada pela Lei n.º 28/2017, de 30 de maio», e/ou a tomar posição sobre a eventual superveniência de decisão «condenatória num processo penal cujas penas» já tivessem sido ou estivessem «a ser executadas», a relatora desconsiderou a circunstância de a primeira questão se referir justamente à «inconstitucionalidade da recusa de aplicação retroativa de lei mais favorável – artigo 420.º, n.º 2, do CVM, na redação dada pela Lei 28/2017, de 30 de maio» e, a segunda, à «inconstitucionalidade da recusa de conhecimento da inconsti- tucionalidade do artigo 420.º, n.º 1 e 2, a contrario , do CVM, redação em vigor no momento da prática do facto, dada pelo DL n.º 52/2006, de 15 de março». O argumento invocado pelo reclamante não é fácil de acompanhar. Se, conforme se lê no acórdão recorrido, todas as «questões relativas à imputação, pressupostos, respon- sabilidade e sanção primária» se encontravam abrangidas pelo caso julgado formado por anterior decisão, sendo por isso insuscetíveis de nova apreciação, não se vê como possa o reclamante imputar ao tribunal a quo a aplicação de qualquer norma, extraível do «artigo 3.º, n.º 2, do RGCO, e 2.º, n.º 2, e 4, do CP, ex vi artigo 32.º RGCO, ex vi artigo 407.º do CVM, e do artigo 371.º-A, do CPP, ex vi artigo 41.º RGCO, ex vi artigo 407.º do CVM», cujo significado consista na recusa de aplicação às contraordenações e coimas em concurso da lei de conteúdo mais favorável alegadamente constituída pelo «artigo 420.º, n.º 2, do CVM»; assim como se não vê como possa identificar-se no acórdão recorrido a aplicação de qualquer norma cuja inconstitucio- nalidade derive da «recusa de conhecimento da inconstitucionalidade do artigo 420.º, n.º 1 e 2, a contrario , do CVM», especialmente se essa norma, pretensamente inconstitucional, dever ser extraída, como pretende o reclamante, «dos artigos 420.º, n.º 1 e 2, a contrario , do CVM, na redação dada pela Lei n.º 52/2006 de 15 de março; conjugado com os artigos 20.º, 79.º, n.º 1 e 2, 80.º n.º 1, 2 e 3, 81.º, 82.º e 90.º, n.º 3, do RGCO, ex vi artigo 407.º do CVM, e 449.º do CPP, ex vi 41.º do RGCO, ex vi artigo 407.º do CVM; e singularmente consideradas ou em conjunto entre si ou com quaisquer outras normas». 14. De acordo com o reclamante, o fundamento invocado para demonstrar a inutilidade da aprecia- ção do recurso relativamente à questão identificada em iv) é igualmente difícil de aceitar. E isto na medida em que, ao sublinhar a compatibilidade com o Direito da União da solução que resulta do n.º 3 do artigo 420.º do CVM em matéria desconto, o tribunal recorrido não pode ter deixado de aplicar implicitamente «a norma extraída do artigo 7.º do CPP, aplicável ex vi artigo 32.º do RGCO, ex vi artigo 407.º do CVM, no sentido de não ser obrigatório o reenvio de questão de direito da União aplicável em processo contraordena- cional que corra termos perante tribunal de última instância em Portugal, sempre que a questão seja decisiva, a sua solução não decorra claramente das normas de direito da União em causa, não tenha sido objeto de decisão pelo TJUE, ou a solução para a questão não decorra claramente dessa jurisprudência, constituindo consequentemente a decisão do tribunal de última instância em Portugal um desenvolvimento do direito da União à margem da jurisdição atribuída pelo TJUE pelo artigo 267.º, do TFUE». Uma vez mais, o argumento não é fácil de acompanhar. Se o tribunal recorrido afirmou que a solução sufragada em matéria de desconto era compatível com o Direito da União, como se vê como possa ter considerado, implicitamente e em simultâneo, que tal solução não decorria claramente das normas de direito da União, conforme pressuposto pela norma cuja aplicação lhe imputa o reclamante. Tal norma reflete, na verdade, as premissas em que se alicerça a tese defendida pelo reclamante e não aquelas que o tribunal recorrido assumiu ou sufragou no acórdão recorrido.
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