TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 109.º Volume \ 2020

233 acórdão n.º 587/20 o Tribunal da Relação de Lisboa decidiu excluir dele as questões atinentes à violação do princípio ne bis in idem por considerá-las abrangidas pelo âmbito do julgado formado pelo aresto datado de 6 de março de 2014. E se é evidente que tal exclusão pressupõe necessariamente a aplicação, ainda que implícita, de deter- minada norma, igualmente evidente é também que esta, só podendo relevar do regime que rege a formação do caso julgado, respetivo âmbito e efeitos, não encontra qualquer tipo de correspondência no conjunto daquelas que integram o objeto do recurso, tal como definido pelo agora reclamante. Em segundo lugar, saber se a matéria a que respeitam «as questões de constitucionalidade suscitadas no recurso do Recorrente» foi ou não já anteriormente decidida por acórdão transitado em julgado é questão que não cumpre a este Tribunal resolver. Trata-se de um juízo privativo das instâncias, às quais o Tribunal Constitucional não pode substituir-se na interpretação e aplicação do direito infraconstitucional ao caso concreto. Finalmente, em segmento algum do acórdão recorrido o Tribunal da Relação de Lisboa classificou como «decisão que procede à imputação de factos e de infrações aos arguidos, mas que relega para decisão ulterior a aplicação de uma sanção definitiva e concreta aos mesmos», o acórdão datado de 6 de março de 2014. Tudo o que o tribunal recorrido fez foi considerar que as questões prévias suscitadas pelo recorrente haviam sido já apreciadas e decididas naquele acórdão, transitado em julgado, sendo essa a razão – a única razão – pela qual não poderiam ser reapreciadas no âmbito do recurso. A reclamação deverá ser, assim, integralmente desatendida. B. Reclamação apresentada pelo recorrente B. 9. Na reclamação apresentada, o recorrente começa por requerer a retificação da menção constante do ponto 7. do relatório que acompanhou a decisão ora reclamada, alegando que, contrariamente ao que aí é referido, o acórdão proferido em 4 de março de 2020 incidiu, não sobre o incidente pós-decisório que dedu- ziu em 24 de janeiro de 2020, mas sobre o pedido de retificação de lapsos de escrita que formulou em 20 de fevereiro do mesmo ano. Embora assistia, de facto, razão ao reclamante na descrição que faz da exata cronologia dos vários inci- dentes pós-decisórios deduzidos nos autos, a verdade é que a imprecisão apontada a tal relatório em nada contende com fundamentos em que se baseou a conclusão sobre a inadmissibilidade do recurso, sendo, por isso, totalmente irrelevante para o julgamento da presente reclamação. 10. No requerimento de interposição do recurso, o reclamante afirmou pretender ver apreciada a consti- tucionalidade: (i) da «norma resultante da conjugação dos artigos 58.º, n.º 2, alínea a) , 79.º, n.º 1, 89.º n.º 2 do Regime Geral das Contraordenações (“RGCO”) e 468.º, alínea a) do Código de Processo Penal (“CPP”), todos aplicáveis ex vi artigo 407.º do Código dos Valores Mobiliários (“CVM”), se interpretada no sentido de que o procedimento contraordenacional encerra com o trânsito em julgado de uma decisão condenatória não definitiva e não exequível»; e (ii) da «norma resultante do artigo 82.º n.º 2 do RGCO (aplicável ex vi artigo 407.º do CVM) interpretada no sentido segundo o qual o Tribunal, no momento da determinação da sanção única aplicável às infrações em concurso, não pode conhecer da caducidade da decisão da autori- dade administrativa, quando exista um caso julgado absolutório prévio à confirmação judicial da decisão da autoridade administrativa». Na decisão ora reclamada, considerou-se que nenhuma das duas interpretações impugnadas fora apli- cada, como ratio decidendi , no acórdão recorrido. O reclamante contesta tal conclusão sob o argumento de que ambas as interpretações enunciadas, apesar de não expressamente aplicadas no acórdão recorrido, constituem fundamento jurídico implícito da decisão que levou o Tribunal da Relação de Lisboa a excluir do thema decidendum do julgamento do recurso todas as questões suscitadas pelos recorrentes que fossem estranhas à reformulação do cúmulo jurídico. A falta de razão do recorrente é manifesta.

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